Dois paradoxos arrastam o Brasil para o ridículo

Para os de fora que observam tal circo de horrores vai se tornando cada vez mais verdadeira a frase que é atribuída, embora não se tenha certeza, ao ex presidente francês Charles de Gaulle "O Brasil não é um país sério"

Brasilia, DF, Brasil, 19/04/2017: o presidente Michel Temer e o Juiz federal Sergio Moro se cumprimentam durante solenidade comemorativa ao dia do exercito. Foto: Pedro Ladeira/Folhapress
Brasilia, DF, Brasil, 19/04/2017: o presidente Michel Temer e o Juiz federal Sergio Moro se cumprimentam durante solenidade comemorativa ao dia do exercito. Foto: Pedro Ladeira/Folhapress (Foto: Décio Lima)


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Paradoxo é uma ideia, ou afirmação, que contraria o pensamento médio e aquilo que comumente é aceito como válido. O paradoxo é marcado, de forma geral, por incoerências internas profundas que costumam colocar em conflito suas premissas e suas conclusões. Por violar preceitos consagrados da lógica o paradoxo é fortemente marcado pela contradição. O Brasil é, neste momento, vitimado, de forma impiedosa, por dois grandes paradoxos, que expõe de forma clara os processos políticos em curso no País.

O primeiro é resultado do desprezível libelo condenatório trazido a vida jurídica nacional pelo juizeco de Curitiba como ato final de sua cruzada imoral e vergonhosa contra a maior liderança popular da história do Brasil. Em uma peça condenatória de mais de 200 páginas, uma aberração diante da sobriedade e tranquilidade comuns ao direito penal, ficam claros tanto o desprezo do juiz pela tradição jurídica nacional quanto sua ignorância dos elementos mais fundamentais do direito pátrio. Gastando sessenta páginas para falar de si mesmo, num arroubo narcísico que o mergulha definitivamente no ridículo, e ignorando completamente as provas postas no processo o que resulta é a manifestação do ódio mais irracional, que, para satisfazer seus apetites, nega ao réu os direitos consagrados da tradição jurídica de nossa civilização.

O direito penal deve ser, e é, cuidadoso quando constrói sentenças por conta de sua possibilidade de cometer erros irreparáveis. Lembro, a título de exemplo , o caso de Lena Backer, a afro-americana que na década de 1940 foi condenada a morte por assassinato e para a família de quem recentemente Barak Obama pediu perdão, ao ficar comprovado que ela agiu em legítima defesa e que sua condenação foi resultado de sentimentos racistas do juiz e do júri. Para que fatos como esse não se repitam o direito penal se orienta, enfaticamente, por regras sem as quais a justiça é impraticável, como a presunção da inocência, a dúvida em favor do réu e a imperatividade de provas materiais para se afirmar a culpa. Todas estas regras foram desrespeitadas por Moro para poder condenar Lula. Das evidências, presentes no processo, a única conclusão séria é a de que Lula é inocente, as provas apontam isto de forma inexorável. Entre as provas e a sentença se explicita a contradição própria do paradoxo, sua incoerência diante das premissas, e também o verdadeiro motivador da sentença, o ódio. Ódio, contra os pobres, e narcisismo, próprio da pouca inteligência de certos setores da elite, os mesmos que estão causando a ruína de nosso país, são as substâncias que o juiz usou para tecer sua sentença, e para dar lugar a eles precisou subtrair a lei, a ética, a razão e qualquer intenção de justiça.

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O segundo paradoxo que flagela a nação é o resultante da condição singular do presidente golpista. Pela primeira vez na história a cadeira da Presidência da República é ocupada por alguém que é sabidamente culpado da prática de crimes comuns no exercício do cargo. Vejamos que não se trata de crime de responsabilidade, como as fantasiosas pedaladas fiscais usadas somente contra Dilma e depois tornadas legais, e sim das práticas mais pérfidas de um criminoso que rouba, coage, ameaça e suborna sem o menor escrúpulo. Não só isso, existe materialidade a mais abundante, que comprova, de forma incontestável, a prática criminosa. A confissão do crime, pela voz do criminoso, o dinheiro rastreado, as transações gravadas em vídeo, constituem prova mais que suficiente, mesmo para o direito penal mais cauteloso, para afirmar, sem sombra de dúvidas, a culpa de Temer. Apesar de tudo isso, e novamente explicitando a brutal contradição do paradoxo, ele permanece, pela força das almas que podem ser compradas com o dinheiro público, presidente do Brasil.

São talvez incontáveis os prejuízos sofridos por todos nós, brasileiros, para que os paradoxos de que aqui trato continuem operativos. Eles dividem o Brasil em dois países diferentes, o dos que estão acima da lei, como Temer, e que por isso não precisam se preocupar com as consequências de seus atos e a quem está franqueado cometer quaisquer crimes que desejarem para seu lucro, e dos que estão abaixo da lei, aqueles que, como Lula, e todos nós, não estão protegidos pela legalidade e contra os quais é permitido cometer qualquer violência, inclusive com o amparo e conivência dos poderes constituídos. A tragédia e o ridículo se somam pela força de dois paradoxos que, entre outras coisas, tornam o Brasil de nação poderosa em motivo de escárnio internacional. Para os de fora que observam tal circo de horrores vai se tornando cada vez mais verdadeira a frase que é atribuída, embora não se tenha certeza, ao ex presidente francês Charles de Gaulle "O Brasil não é um país sério."

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