Dois Papas
Sobre o último longa do diretor Fernando Meirelles, "Dois Papas", Arnóbio Rocha diz que o filme "traz um diálogo filosófico de uma profundidade ímpar, ainda que ficcional, ele tem como base as posições assumidas por ambos, em situações bem marcantes, então essa construção tem lastro nas verdades pronunciadas por esses grandes homens", escreve
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Dois Papas, não se trata de um filme, mas de um acontecimento. É um embate de duas potências de duas ideologias dentro de uma mesma fé e igreja milenar. A Igreja Secular, perene e seus dogmas que a mantiveram por dois milênios, em face de uma corrente na Igreja que entende a realidade e as transformações do mundo, não um modismo, mas uma mudança real e inexorável.
A Igreja Católica Apostólica Romana (ICAR) tinha iniciado uma grande revisão de costumes, com o Concílio Vaticano II, convocado pelo Papa João XXIII, um grande reformador, que a exemplo do Papa Francisco, era tido como “Papa tampão”, pela idade avançada, iria apenas fazer uma transição, depois de longos papados, conservadores, Pio XII e João Paulo II/Bento XVI (dois papas, a mesma cabeça, Ratzinger).
Mexer com uma entidade milenar, não é para muitos, a certeza de que sua história é a garantia de que está certa, naturalmente inibe a ação dos reformadores, a burocracia, o vício, são vistos como hábito imutável, para que se “adaptar ao mundo mundano, se nossa fé é perene?”.
O filme traz um diálogo filosófico de uma profundidade ímpar, ainda que ficcional, ele tem como base as posições assumidas por ambos, em situações bem marcantes, então essa construção tem lastro nas verdades pronunciadas por esses grandes homens.
O Cardeal Ratzinger, goste-se ou não, é um dos maiores intelectuais cristão de todos os tempos, de origem na Teologia da Libertação, nos anos de 1960, entusiasta do Vaticano II, passa a ser o conselheiro e guia intelectual do Papa João Paulo II. O Cardeal alemão não era apenas o chefe da Doutrina da Fé, ele era a cabeça pensante do conservadorismo imposto à Igreja, por um Papa popular, mas retrógrado ao extremo.
As posições políticas dos dois papados, tiveram em Ratzinger, a pena e a execução de uma lógica, por 35 anos, sua ruína, foi a intransigência, a recusa a ver que o mundo mudou com extrema rapidez, não que os dogmas precisem dessa velocidade, mas a visão benevolente sobre a tragédia humana, precisa e muito, fechar os olhos à pedofilia, à corrupção do banco do Vaticano, estão entres os graves problemas não enfrentados pelos dois.
O Papa Francisco, a quem critiquei duramente quando eleito, fiz minha autocrítica depois, é um sopro de esperança, para humanidade, sua imensa generosidade, capacidade de ouvir, de falar contra os males que atinge o mundo, como a fome, a miséria, o desemprego, os refugiados e degradados, as questões sensíveis de gênero, sexualidade, casamentos, aborto, de alguma forma, há um olhar diferente, mais acolhedor e humano.
O filme trata com honestidade as contradições entre os dois papas, vivos, com idades avançadas, representando escolas e verdades, que devemos saber debater e compreender, como correntes filosóficas e de comportamento que move uma religião milenar e tão complexa.
As atuações de Anthony Hopkins e Jonathan Pryce, são de tirar o fôlego, geniais, humanizam e dão uma dimensão ao embate para além do cinema e da performance. O roteiro é espetacular, de Anthony McCarten, de grandes filmes, e a direção brilhante de Fernando Meirelles, com imagens fantásticas formam um todo de um grandioso filme, um dos melhores desse ano. A música é o “plus” a mais.
Imperdível!!!
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