Dilma ouviu “Fora, Levy” e pôs a “esquerda” no comando da economia
Barbosa, o novo ministro da Fazenda, é bem menos neoliberal que Levy. É visto pelo mercado como “desenvolvimentista”, uma vez que, ao longo do ano, conseguiu convencer Dilma a adotar medidas menos dolorosas, suavizando o ajuste fiscal
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Nos atos públicos de esquerda do último dia 16 de dezembro foram ouvidas, a rigor, três frases que sintetizaram o espírito dos manifestantes. Por ordem de importância, essas frases de ordem foram:
1 – Não vai ter golpe
2 – Fora Cunha
3 – Fora Levy
Das três reivindicações daqueles atos públicos, ao menos uma já foi atendida. Os golpistas continuam assanhados, ainda que menos confiantes e o Congresso e o STF ainda não deram resposta ao “fora, Cunha”, mas Dilma Rousseff atendeu ao reclamo da esquerda e defenestrou o odiado ex-ministro da Fazenda.
A decisão da presidente faz todo sentido. Levy só estava no cargo, apesar de ser tão odiado pela base ideológica que ajudou a elegê-la, porque, como um dos “Chicago Boys” (formados pelo pensamento ultraliberal da Universidade de Chicago), supunha-se que, por supostamente ter boa interlocução com as agências de classificação de risco, conseguiria postergar o rebaixamento da nota de crédito do Brasil.
Quando, em setembro, a agência Standard & Poor’s nos tirou o grau de investimento (selo de bom pagador), Levy já balançara no cargo. Pouco depois, a agência Moody’s avisou que nos tirará o GI em breve e, no dia em que os movimentos sociais foram à rua bradar contra o golpe, contra Cunha e contra Levy, a agência Fitch seguiu a S&P e nos classificou como possíveis caloteiros.
Levy não entregou o que prometeu. E, apesar de ser apenas um técnico que estava submetido às decisões de Dilma, não tendo, portanto, autonomia para fazer nada que ela não aprovasse, representava um fator de desgaste junto ao sustentáculo político-ideológico da presidente.
CUT, MST, MTST e alas do PT acreditavam que o ajuste fiscal estava sendo levado a cabo justamente por conta de Levy e não porque a presidente se convenceu de que não dá para o país gastar mais do que arrecada, de modo que o tornaram alvo.
Contudo, embate recente entre o então ministro da Fazenda Joaquim Levy e o novo titular da pasta, Nelson Barbosa, ficou claro que quem manda é Dilma. O ex-ministro queria superávit primário de 0,7% do PIB e o novo ministro, então no Planejamento, queria 0,5%. Prevaleceu a vontade de Barbosa de reduzir o ímpeto do ajuste fiscal.
Mas como a permanência no cargo inseria críticas ao governo nos mesmos atos públicos de esquerda que rechaçavam o golpe, ao tirar Levy a presidente gerou sensação de vitória entre os movimentos sociais que podem, agora, apoiá-la mais decididamente.
Barbosa, o novo ministro da Fazenda, é bem menos neoliberal que Levy. É visto pelo mercado como “desenvolvimentista”, uma vez que, ao longo do ano, conseguiu convencer Dilma a adotar medidas menos dolorosas, suavizando o ajuste fiscal.
É, também, um dos pais dos cerca de 400 bilhões de reais de “desonerações fiscais” (redução de impostos) para empresas, para que não demitissem e mantivessem investimentos. É, também, o pai das reduções dos juros adotadas por Dilma entre 2012 e 2013.
Prova de seu viés bem mais heterodoxo (simpático a medidas econômicas identificadas com a esquerda) é que propôs ao governo controle do câmbio.
Claro que não será de agrado da esquerda mais radical, que propõe estatização do sistema bancário, interrupção do pagamento da dívida externa e que rejeita qualquer ajuste fiscal por acreditar que o país pode conviver com gastos públicos maiores do que a arrecadação.
Mas, certamente, Barbosa é muito mais parecido com Guido Mantega, quem pilotou os bons momentos da economia após a saída de Antonio Palocci, ainda no governo Lula.
A troca de Levy por Barbosa, porém, é muito mais um ato político do que prático. Não poderá deixar de levar adiante o ajuste fiscal, mas dará discurso às lideranças dos movimentos sociais, que vinham confidenciando a Lula e a Dilma que não tinham como deixar de bradar contra a política econômica por conta de que Levy se tornara intragável para suas bases.
Portanto, mesmo que não sobrevenha nenhuma mudança significativa na política econômica, Barbosa é muito mais palatável às esquerdas e, assim, parcela importante dos 65% de reprovação à presidente poderá parar de dizer aos Datafolhas da vida que o governo Dilma é ruim ou péssimo, já que boa parte desse percentual de rejeição à presidente vem da esquerda frustrada com a presença de Levy no comando da economia.
E como o mercado já praticamente nos tirou o que nos poderia tirar (o grau de investimento), agora Dilma terá opção de implantar políticas fiscal e monetária menos restritivas.
Do ponto de vista do mercado, não será bom. Em um primeiro momento a nomeação de Barbosa irá aumentar a desconfiança dos investidores e, assim, a retomada do crescimento fica mais distante. Porém, o apoio político que irá gerar a Dilma dará a esses mesmos investidores mais segurança de que Dilma terá condições de governar.
Apesar de o primeiro trimestre de 2016 prometer ser um período muito mais duro para a economia, com aumento do desemprego e da inflação, Dilma poderá brandir para a esquerda a tese de que com uma política econômica mais heterodoxa o crescimento irá voltar.
Quando as pessoas estiverem mais indispostas com o governo no início do ano por conta da perda do emprego e preços mais altos, Dilma terá o que dizer : “Mudei o ministro da Fazenda como vocês queriam, e, mais adiante, a situação irá melhorar”.
E, de fato, se a base eleitoral que a elegeu parar de dar respostas tão ruins aos institutos de pesquisa e sentir-se mais confiante, melhorando a aprovação a ela, esse apoio político influirá no Congresso, que irá se tornar muito mais colaborativo com o governo.
Dilma fez um lance ousado na política. A possível desconfiança do mercado com Barbosa pode ser desastrosa, e se a esquerda não responder de forma positiva o país afunda de vez. Mas, se a estratégia der certo, em 2016 ela finalmente terá como governar.
Quem quer o bem do país só tem uma alternativa, neste momento. Quem é de esquerda e estava indisposto com Dilma por conta da formação político-ideológica e técnica de Levy, se der apoio à presidente ajudará a levar a governança do país para onde quer.
Que a esquerda tenha inteligência para entender o movimento que a presidente fez no tabuleiro político e juízo para responder com apoio. Se começar um “fora Barbosa”, jogará o país no colo da direita.
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