Delegados federais recuam e não entregarão cargos
"A suspensão do protesto que levaria os delegados a entregarem seus cargos de chefia e cargos comissionados, embora seja nitidamente um recuo – para alguns, sinal de que nem todos querem perder o status atual – não significa a pacificação dentro da categoria", escreve Marcelo Auler
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Por 14 votos a 10 (ou seja, sem a representação total dos estados), o Conselho da Associação dos Delegados de Polícia Federal (ADPF) decidiu, na quinta-feira (18/03), recuar do protesto programando para 28 de março, data em que o Departamento de Polícia Federal (DPF) completará 77 anos. Contrariados com as decisões do governo de Jair Bolsonaro, os delegados articulavam a entrega dos cargos de chefia, tal como noticiamos em 'Em protesto, delegados federais prometem renunciar a cargos'. O protesto, porém, foi suspenso e todos permanecerão com o status que desfrutam. Um dos argumentos usados para esse recuo foi o medo de que o protesto levasse Bolsonaro a indicar um militar para a direção-geral da Polícia Federal.
Com o recuo, a ADPF puxou o tapete do delegado Marcelo de Souza Daemon Guimarães, chefe da Delegacia de Segurança Privada (DELESP) da Superintendência do Departamento de Polícia Federal do Rio de Janeiro (SR/DPF/RJ). Ele, incentivado pelas conversas que delegados de todo o país vinham mantendo, na quarta-feira redigiu o texto que deveria ser um abaixo-assinado da categoria que seria entregue ao diretor-geral da instituição, delegado Rolando Alexandre de Souza, tal como noticiamos no BLOG.
A representação dos delegados do Rio de Janeiro no Conselho da ADPF foi uma das dez que se posicionou a favor da manifestação. Foi voto vencido em um placar apertado, no qual o número de votos (24) não contabiliza todas as representações estaduais (27).
Recuam do protesto, mas entram na carreata
Foi a partir da reportagem publicada no BLOG que a ADPF tratou de realizar a reunião que resultou na derrubada do protesto. Segundo a decisão, foram suspensas as assembleias através das quais os cargos de chefia seriam entregues. O comunicado da ADPF fala ainda que “a medida [protesto] poderá ser utilizada no momento mais adequado, com o uso progressivo das providências aprovadas.”
O recuo foi provocado pelo teor do documento – Ofício Nº 19/2921 da Delegacia de Segurança Privada (DELESP) da Superintendência da Polícia Federal do Rio de Janeiro (OFÍCIO Nº 19/2021/DELESP/DREX/SR/PF/RJ) – elaborado pelo delegado Daemon e colocado nas redes internas para que fosse endossado pelos demais delegados. Consideraram muito ríspido. Houve ainda uma tentativa de refazer o documento, com um texto menos duro. Mas 14 representantes dos estados votaram contra.
Na mesma tarde em que o Conselho da ADPF recuou do protesto pelo qual os delegados prometiam entregar seus cargos de chefia, o presidente da entidade, delegado Edvandir Felix de Paiva, participou, em Brasília, da carreata de protesto organizada pela União dos Policiais do Brasil (UFB).
Em cima do caminhão de som, ele ainda pousou para fotos. “Houve reuniões com o presidente da República sobre as reformas que ocorreram e ele fez promessas que não foram cumpridas. Na reforma da previdência, por exemplo, os militares foram protegidos e os civis foram abandonados”, afirmou, segundo se verifica no site da entidade de onde extraímos a foto ao lado.
O protesto dos delegados federais, segundo o BLOG levantou, pode ter sido suspenso pelos conselheiros da ADPF, mas a insatisfação dos delegados continua a mesma. Pode até crescer. Na realidade, a movimentação, que não envolve os agentes, peritos e outras categorias da Polícia Federal, surgiu na chamada “base”. Ou seja, de baixo para cima.
O epicentro dessa movimentação teria sido o Rio de Janeiro. As conversas ganharam corpo e extrapolaram a superintendência do Rio. Surgiram apoios em muitos estados com a promessa de endossarem o documento. “Não foi movimento organizado. Foi da base para cima. Ou seja, é mais legítimo”, explicou um delegado ao BLOG.
A insatisfação entre os delegados federais cresceu com o tratamento diferenciado que o governo Bolsonaro está destinando aos militares de uma maneira em geral, privilegiando-os perante os servidores civis. Foi e continua sendo o motivo maior da insatisfação dentro da Polícia Federal como, de resto, entre os servidores públicos em geral.
Benefícios aos militares geram queixas:
Entre os delegados federais os questionamentos em torno dos benefícios destinados pelo governo Bolsonaro aos quadros das Forças Armadas são muitos. Tal como relacionou outro delegado para o BLOG. São dele as perguntas abaixo, reproduzidas da forma como nos chegaram:
- Por que o militar manteve a pensão vitalícia em 100% e a do Servidor Público Civil, incluindo os PFs 54% temporária (mulher, sem filhos);
- Por que o militar recebe gratificação de 20% a 73%, por cada curso que faz durante a carreira, incluindo academias, mesmo na reserva, e o Servidor Público Civil, incluindo os PFs zero?
- Por que o militar recebe até 43% de gratificação por disponibilidade (dedicação exclusiva), mesmo na reserva, e os Servidores Civis, incluindo os PFs zero?
- Por que o militar paga 9,5% de previdência, e Servidos Civil, incluindo os PFs até 22%?
- Por que o militar recebe até 35 vezes o último vencimento ao passar para a reserva, e o Servidor Público Civil, incluindo os PFs zero?
- Por que o militar manteve a integralidade e a paridade, e o Servidor Público Civil, incluindo os PFs não?
- Por que o militar tem um pedágio de apenas 1,7 sobre o tempo restante para a aposentadoria, sem idade mínima, e o Servidor Público Civil, incluindo os PFs tem um pedágio de até mais de uma década, e idade mínima de 65?
- Lembrando que o Servidor Civil, via de regra, como os PFs não têm FGTS, adicional noturno, horas extras etc.
Isso apenas demonstra que a suspensão do protesto que levaria os delegados a entregarem seus cargos de chefia e cargos comissionados, embora seja nitidamente um recuo – para alguns, sinal de que nem todos querem perder o status atual – não significa a pacificação dentro da categoria. A insatisfação, pelo que se percebe, é grande e aumenta a cada dia. Mas, por enquanto, faltou fôlego (coragem?) para os delegados demonstrarem isso publicamente. Não quiseram abrir mão dos cargos (status) que ocupam.
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