De quanta epifania necessita um homem?

Certa vez, o cartunista Jaguar afirmou que Ulysses, de James Joyce, é um livro possível de ler apenas quando se está preso. Pois, quando ele foi em cana com o pessoal do “O Pasquim”, nos anos 1970, levou o livro para o xilindró



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Certa vez, o cartunista Jaguar afirmou que Ulysses, de James Joyce, é um livro possível de ler apenas quando se está preso. Pois, quando ele foi em cana com o pessoal do “O Pasquim”, nos anos 1970, levou o livro para o xilindró. E, mesmo tendo todo o tempo do mundo na cela, não conseguiu explorar a contento a insondável obra do irlandês.

Tenho uma história parecida com a dele em relação ao livro. Desde os 17 anos tento lê-lo por inteiro e não consigo. O máximo que deu foram as 50 páginas dos pensamentos de Molly Bloom e olhe lá.

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Tenho todas as traduções possíveis em português e, nas vezes em que estive em Londres, comprei todos os manuais de leitura de Ulysses que encontrei em sebos e livrarias.

Possuo desde o “Easy Ulysses” até resumos de capítulos comentados para discussão em sala de aula — salas de aula do Reino Unido, obviamente.

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Mas a coisa não anda, nem desanda. Quando estou conseguindo evoluir entro num capítulo que parece não fazer sentido com o que li até o momento? E, passando de fase, no seguinte há uma sucessão de neologismos misturando grego, abissínio do Sul e inglês provençal que jogam areia em meus olhos.

Se tem alguém que amo e odeio esse alguém é Jim Joyce. O pior é que, no fundo, eu sei que ele está querendo fazer uma refinada piada, mas nunca consigo apreendê-la e rir no final.

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O ódio me leva a abandoná-lo por uns tempos e a me aliar ao pensamento de, por exemplo, um Hemingway que dizia, referindo-se a Joyce, que não respeitava autores que escreviam paródias.

Contudo, o que mais me parece adequado para entender Joyce é o conto “De quanta terra necessita um homem?”, de Tolstói.

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O russo recria a história de um homem obcecado pelo desejo de obter mais terras. Depois de conseguir ampliar sua propriedade, mas ainda não satisfeito, o camponês resolve adquirir terras no longínquo território dos bashquires. Lá é desafiado pelo chefe da aldeia: por um valor simbólico, Pakhóm terá toda a terra que conseguir percorrer a pé durante um dia, desde que, antes de o sol se pôr, retorne ao ponto de partida. Caso contrário, perderá tudo.

Quando o sol se põe, estafado e com sangue correndo da boca, Pakhóm obtém sucesso na empreitada, mas morre. Um criado pega pá, faz uma cova do tamanho dele e o mete lá dentro: “sete palmos de terra: não precisava mais”.

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A questão que fica é: quanta ambição é preciso para se escrever uma história memorável?

 

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