Curitiba ficou pior
Agora acabou. Lula está voando, a vigília foi desmobilizada, não há mais razão para que esses maravilhosos seres humanos tenham vontade de tão cedo voltar para cá. Curitiba ficou pior
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Lula foi solto. Voará pelo Brasil e pelo mundo. Nós, curitibanos, ficamos presos a esta cidade que se tornou horrorosa.
A Curitiba onde eu nasci não existe mais. Conseguiu piorar. Aqui, na adolescência, me divertia com a frequente pergunta “de que família você é”. Cidade provinciana nos anos setenta, havia uma burguesia que se sentia aristocrata, onde os sobrenomes abriam portas e, no máximo, sorrisos condescendentes ante apelidos desconhecidos. Em algumas dessas inúmeras oportunidades respondia, empáfia ensaiada, sou Ramos. Desconcertados ainda tentavam, às vezes, encontrar motivos para não me desprezar, emendando “dos Ramos de Santa Catarina?”. Debochado, fiel à realidade, concedia. Não, dos Ramos de Santa Quitéria, minutos antes de me tornar irrelevante.
Era uma cidade arredia aos forasteiros, aos que chegavam do êxodo rural promovido pela ditadura concentradora de renda. E também aos curitibanos enxeridos que invadiam salões e bailes de debutante apesar de não terem certificados pedigrees.
As famílias curitibanas não eram formadas por gente ruim. Pessoas de bem, só relutavam para aceitar em seu meio gente - como eu, como milhares - que por estudarem acabavam se misturando com os filhos da burguesia. Ou com suas filhas, sem respeitar seus devidos lugares.
Desde então Curitiba foi piorando. O hábito do de que família é remanesce. Os sobrenomes é que são diversos. A chegada dos agrobóis mudou o perfil da burguesia curitibana. Camionetes, hábito de ouvir música sertaneja, espalhafatosos, ocuparam os espaços “da sociedade”, como aqui se referem aos que frequentam e são frequentados. Gente de sociedade.
Essa gente, de elitista, nos últimos 20 anos foi se tornando particularmente desprezível. Pessoa-de-bem virou significante dessa gente ruim, que abusa das interjeições com referência a deus, várias vezes por dia. Tínhamos uma burguesia que se achava aristocrata. Agora temos uma classe média que se sente burguesa.
Por conta das arbitrariedades da Lava-Jato, de modo inesperado, Curitiba se viu invadida de pessoas com sensibilidade, com valores de solidariedade, com princípios éticos humanistas. A vigília LulaLivre se tornou a síntese deste fenômeno. Por 580 longos dias seres humanos, profundamente humanos, bradaram reconfortantes bom-dias, boa-tardes e boa-noites, compartilharam angústias e esperanças, ouviram, falaram, dialogaram. E Curitiba ficou melhor.
Impossível seria nominar todas as centenas de homens e mulheres que se envolveram no dia-a-dia. Os riscos de cometer injustiças seria enorme. De minha parte registro que ficarei com saudades dos que integrando a equipe de assessoria do Presidente Lula (Marcola Marco Aurélio, Nicole Briones, Ricardo Stuckert, Crispiniano, Morais, Moura, Elias, Mizael, entre tantos outros) se mudaram para Curitiba. Nos tornamos amigos de infância.
Tive a oportunidade de conhecer pessoalmente vários ex-chefes de Estado, artistas, intelectuais e, ao mesmo tempo, reencontrar antigos companheiros que vinham visitar a vigília, conhecer pessoas novas, aprender com elas. Essa gente esquisita, forasteira de outra maneira, tornou Curitiba uma cidade melhor.
Agora acabou. Lula está voando, a vigília foi desmobilizada, não há mais razão para que esses maravilhosos seres humanos tenham vontade de tão cedo voltar para cá. Curitiba ficou pior.
PS. A foto da vigília desmobilizada contém o sinal indicativo da direção que devemos tomar.
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