Conjuntural ou estrutural?

O País não precisa da fracassada estratégia liberal na economia e uma virada neoliberal ameaça frontalmente as conquistas sociais recentes e o necessário processo de distribuição de renda

O País não precisa da fracassada estratégia liberal na economia e uma virada neoliberal ameaça frontalmente as conquistas sociais recentes e o necessário processo de distribuição de renda
O País não precisa da fracassada estratégia liberal na economia e uma virada neoliberal ameaça frontalmente as conquistas sociais recentes e o necessário processo de distribuição de renda (Foto: Pedro Maciel)


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Tem muita gente falando e escrevendo muita bobagem sobre a tal crise econômica pela qual estaria passando o país. 

Também vou escrever as minhas, mas antes de escrever sobre a natureza da tal crise penso ser necessário lembrar que Dilma venceu tudo e todos apresentando um projeto social-desenvolvimentista e que sua derrota significaria a volta do Estado Mínimo (apenas um dos retrocessos visíveis no projeto neoliberal e anti-desenvolvimentista de Aécio Neves e sua trupe).

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Não havia nada mais velho e antissocial do que o enganoso “culto da austeridade”, remédio clássico seguido no Brasil dos anos de 1990 e aplicado na Europa desde 2008 com resultados catastróficos. Não se pode perder de vista que Política econômica e Política Social são faces da mesma moeda, e que não há como conciliar política econômica que concentre a renda e política social que promova a inclusão social. A vitória de Dilma foi a vitória do povo brasileiro e do projeto social-desenvolvimentista. 

Posto isso vamos analisar o início do governo Dilma. 

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Mas, para surpresa e indignação de seus eleitores Dilma estaria a trair o social-desenvolvimentismo, pois na retórica e na prática, os primeiros movimentos do novo governo Dilma apontariam para austeridade na condução da política macroeconômica, com reformas liberais, ajuste fiscal e aperto monetário, um desespero... Dilma estaria a trazer de volta o fantasma do neoliberalismo que assombrou o país na década de 1990? Será que é isso mesmo?

Penso que temos de fazer uma análise um pouco mais séria sobre tudo que está acontecendo.  A crise econômica brasileira atual é um fato, mas não é um caos, nem é catastrófica, como querem fazer crer os especialistas globais que conhecemos de há muito.

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A crise seria conjuntural e derivaria, fundamentalmente, de fatores externos? Essa é a afirmação da equipe econômica do governo federal e da própria presidente Dilma. Ou, como afirmam alguns economistas, trata-se na verdade de uma crise estrutural e decorreria de erros do governo na condução da economia nos últimos 12 anos.

Conceituando. Questões estruturais de uma economia referem-se às mudanças fundamentais e de longo prazo na sua estrutura, ao contrário de medidas pontuais ou de curto prazo, que tipicamente visam melhorias conjunturais na produção ou no emprego. Por exemplo, a transformação de uma economia de subsistência numa economia industrializada, ou de uma economia mista regulada numa economia liberalizada. 

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Mas afinal de contas, o cenário atual é fruto mais de uma questão conjuntural estrutural ou conjuntural?  Tendo a concordar com a análise da Presidente, porque a estratégia de buscar o desenvolvimento do capitalismo brasileiro, no modelo introduzido em 2003, foi de se apoiar-se no mercado externo, o que justificava afinal, até 2007 ou 2008, o mundo viveu um grande momento, estimulado em especial pela China.

Nesse contexto o Brasil foi capaz de formar uma proteção em relação ao caráter especulativo do capitalismo internacional por meio da criação das reservas, aproveitando o saldo comercial para liquidar o problema da dívida externa, algo que nos aprisionava. Foram praticamente duas décadas transferindo entre 5% e 6% do PIB para pagamento desta dívida.  

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E, ao mesmo tempo em que a estratégia se apoiava no mercado externo, buscou-se uma expansão do mercado interno sustentada na distribuição de renda e da ampliação do acesso ao crédito, um fato inédito no capitalismo brasileiro nos últimos 50 anos, já que nunca ocorrera a combinação (i) democracia, (ii) crescimento econômico e (iii) distribuição de renda

UM POUCO DE HISTÓRIA.

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Não se pode esquecer que nos anos 1960 o crescimento econômico foi enorme, mas dado o autoritarismo vigente não se distribuiu renda. No início dos anos 1980 o Brasil era a oitava economia, mas como o terceiro país mais desigual do mundo. 

Nos anos 1980 e 1990, retomou-se a democracia, mas não o crescimento, então não havia o que distribuir. Foram décadas perdidas pois houve uma regressão econômica e social, o país caiu para 13ª economia mundial no ano 2000. 

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Com a estratégia econômica adotada pelos governos a partir de 2003 seria de longo prazo, pretendeu-se de longo prazo, o PAC, nesse contexto, introduzido em 2006, buscava instaurar um ciclo de expansão por meio de investimento, mas tudo isto foi interrompido por conta da crise de 2008.

Hoje sabemos que não é uma crise, como alguns diziam ser, em “V” (com uma queda na atividade que depois volta a se recuperar), é uma crise de dimensão global iniciada em 2008 estabeleceu um novo regime possível de expansão das economias capitalistas, que é um regime de expansão muito menor do que o verificado antes daquele ano. Ou seja, hoje crescer menos é o novo padrão do capitalismo global desde 2008.  

Os Estados Unidos, por exemplo, estão crescendo 30% do que cresciam antes de 2008, a Europa praticamente não está crescendo, está estagnada, o Brasil cresce 45% do que crescia antes; a China, 75%, o melhor desempenho vem sendo da Índia, com 83%, 84%. A crise de dimensão global estabeleceu um novo regime de expansão possível que é de baixíssimo crescimento. A crise é global. 

E o Brasil que antes da crise constituiu o PAC como a possibilidade de se fazer a ampliação de investimentos, teve que utilizá-lo não mais com essa finalidade mas sim no âmbito das políticas anticíclicas, usando-se o fundo público com o objetivo de evitar que os efeitos dessa crise e, depois de 2011/2012, que os efeitos do baixo dinamismo econômico viessem a ser transferidos para os mais pobres. 

O governo brasileiro, na expectativa de que a crise estabelecesse uma possibilidade de voltar a crescer como anteriormente, adotou políticas anticíclicas evitando que os efeitos recaíssem sobre os mais pobres. Mesmo tendo crescido menos, que é o caso do período de 2011 pra cá, os pobres praticamente não foram atingidos (e isso é um mérito do Governo Dilma) continuou caindo a taxa de pobreza, os salários subiram acima da inflação e não houve aumento do desemprego.

Mas a presidente Dilma se deu conta de que não seria mais suficiente manter essas políticas de caráter anticíclico por mais tempo porque a crise não vai viabilizar no curto prazo a retomada do crescimento, e ela tem de trabalhar com esse dado de realidade.  Por isso me agrada a análise do Professor de Instituto de Economia da UNICAMP no sentido de que “o debate sobre a economia política brasileira está mal posto”, pois, os analistas estão pressionados e seriam prisioneiros de uma perspectiva de curto-prazo. Por que?  Porque o que se analisa são os dados de um mês para o outro, por exemplo, se a inflação desse mês é maior ou menor que a do mês passado ou do mesmo mês do ano anterior, e o mesmo estaria se passando com a análise da questão dos empregos, dos salários, etc. O curto-prazo é a análise típica do mercado financeiro, que tem que tomar decisões de curtíssimo prazo, mas, do ponto de vista do interesse público, dos projetos nacionais a análise não pode ser essa, tem de considerar aspectos de maior amplitude. 

Posta a questão nesses termos é possível compreender a crise como conjuntural e os movimentos da atual equipe econômica como táticos, mas sempre com desconfiança, pois o país não precisa da fracassada estratégia liberal na economia e uma virada neoliberal ameaça frontalmente as conquistas sociais recentes e o necessário processo de distribuição de renda e a ampliação dos direitos sociais. Sabemos que sempre que o tal mercado comemora, o peso da austeridade recai sobre os salários, o emprego, os benefícios sociais e os serviços públicos.

 

PEDRO BENEDITO MACIEL NETO, 51. Advogado, sócio da MACIEL NETO ADVOCACIA, autor de “Reflexões sobre o estudo do Direito”, ed. Komedi, 2007.

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