Com açúcar e com afeto

"Depois de dizer que não canta mais a música "Com Açúcar, com Afeto", Chico Buarque afirmou que "Pelas Tabelas" também ficou datada"

Chico Buarque
Chico Buarque (Foto: Divulgação)


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Rio - Tá todo mundo falando - ou escrevendo - sobre o cancelamento da música "Com Açúcar, Com Afeto'', de Chico Buarque.

Todo mundo. Até o Juca Kfouri deixou o futebol de lado para comentar sobre a polêmica em sua coluna, no UOL:

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“Ninguém tem o direito de censurar ‘Com açúcar, com afeto’. Ninguém tem o direito de pôr no índex uma letra dessas, nem quem a pariu e embalou com tanta beleza desde 1966” - disse.

Concordo com o Juca.

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Chico Buarque acha que nem mesmo Nara Leão cantaria nos dias de hoje, porque é machista. Não concordo com o Chico: Nara provavelmente enfrentaria o anacronismo e cantaria a linda composição com o vigor que cantava "Carcará" ou "Opinião".

Depois de dizer que não canta mais a música "Com Açúcar, com Afeto" em seus shows, Chico Buarque afirmou que "Pelas Tabelas", outra de suas composições, também "ficou datada".

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O artista falou sobre o assunto em entrevista ao portal Brasil 247.

“Tem um samba que gosto muito e é uma pena não poder cantar que é o ‘Pelas Tabelas', ele disse. "Não canto mais porque fala ‘quando vi todo mundo na rua de blusa amarela/ eu achei que era ela puxando o cordão’ ou ‘quando ouvi a cidade de noite batendo as panelas/ eu pensei que era ela voltando’. Não dá mais. Era situada na época das Diretas Já. Ou seja, todo mundo batendo panela de camisa amarela, se eu cantar hoje… [risos] Ficou datada, não é? Não quer dizer que eu renegue a música. Só não canto mais.”

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Sem comentar o enfoque político de “Pelas Tabelas”, vou me ater a fala feminista de “Com Açucar e com Afeto”, como todo mundo.

Após receber criticas do movimento feminista, Chico Buarque decidiu não cantar mais a canção “Com açúcar, com afeto”. A faixa foi composta no ano de 1967 sob encomenda da cantora Nara Leão.

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Na época em que Chico escreveu a canção, não existia o patrulhamento de hoje. Não existia a cultura do cancelamento nem o boicote coletivo cujo objetivo é decretar o ostracismo social e cultural por meio da inserção em listas negras.

Não considero a música machista. Então vamos cancelar “Amélia”, de Mário Lago e Ataulfo Alves; ‘Atrás da Porta’, de Walter Hime e Chico Buarque; ‘Até Segunda-feira’, de Chico Buarque; ‘Sem Compromisso’, de Geraldo Pereira e Nelson Trigueiro; ‘Esse Cara’, de Caetano Veloso; ‘Ronda’, de Paulo Vanzolini, e tantas outras canções que fazem parte do nosso imaginário poético?

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Livros, filmes, peças, poemas, canções, enfim, todas as obras podem incluir personagens machistas, racistas, homofóbicos… Seria estranho se não incluíssem, já que o mundo está cheio de gente assim. Criar um personagem preconceituoso, no entanto, não faz com que a obra ou o autor seja automaticamente preconceituoso. Longe disso.

Por isso, o veto a uma obra literária será sempre - para usar novamente a palavra da moda - o cancelamento não só da obra mas também do autor.

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Os canceladores decretam a sentença e conclamam seus grupos radicais a comportar-se simultaneamente como júri, juízes e justiceiros —sem direito a defesa.

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