Cinco religiões em harmonia na China

As duas primeiras, o taoísmo e o confucionismo, fazem parte do arcabouço da China milenar, junto com outras tradições como o Kung-fu, o Tai Chi Chuan, o Feng Shui e outras que remontam aos primórdios da cultura han, fundada por Huang-Qi, o Imperador Amarelo



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Desde o século XIX a China convive com cinco grandes religiões, duas endógenas e três que, em diferentes períodos da história, amalgamaram-se à cultura nacional e integraram-se ao país. As duas primeiras, o taoísmo e o confucionismo, fazem parte do arcabouço da China milenar, junto com outras tradições como o Kung-fu, o Tai Chi Chuan, o Feng Shui e outras que remontam aos primórdios da cultura han, fundada por Huang-Qi, o Imperador Amarelo. Ambas as crenças, taoísmo e confucionismo, fundam-se mais sobre valores e pensamentos que sobre ritos e estruturas hierárquicas, sendo por isso consideradas pelos chineses como tradições filosóficas, embora o Ocidente as qualifique como religiões.

Às duas acrescentou-se o budismo, que ainda na nossa antiguidade chegou à China vindo da Índia, de onde se alastrou pelo planalto tibetano e atingiu as áreas mais remotas do Oriente, como a China e o Japão, amoldando-se às culturas locais e estabelecendo diferentes tradições budistas, variando em relação ao original encontrado no norte da Índia e no Nepal. A tradição mais presente na China é o budismo tibetano, uma das mais importantes crenças do país, que hoje é a escolha de cerca de 15% da população. O budismo tibetano é, tal como as demais religiões, 100% integrado ao país e muito importante na cultura nacional. O Templo Lama de Yong He Gong, em Pequim, atrai milhões de devotos e turistas ao ano e é exemplo da harmonia entre o budismo do oeste chinês e a cultura han das regiões mais povoadas.

Por fim, há ainda o islamismo, presente mais enfaticamente no noroeste do país, onde está a província de Xinjiang, e o cristianismo, difundido de forma esparça por todo o território. Juntas, as duas tradições não chegam a 5%, mas trazem consigo a força cultural dos povos imigrantes e nômades, no caso dos muçulmanos, e daqueles que estiveram na China por muitos anos, caso dos Europeus cristãos.

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Desde os períodos imperiais, as religiões são toleradas na China, ainda que determinados aspectos de suas ideias se confrontem umas com as outras. Isto porque a laicidade do Estado é, no país, um princípio bem mais antigo que no Ocidente, tendo se estabelecido há mais de mil anos, quando o taoísmo deixou de ser a religião oficial do Império. Por isso, budismo, islamismo e cristianismo puderam se estabelecer no país mais facilmente, por exemplo, que na Índia e no Japão, onde os cristãos sofreram perseguição e os muçulmanos, caso da Índia, foram pivô da cisão com os hinduístas que dividiu o território indiano original entre Índia e Paquistão.

Como um país que preza a liberdade religiosa, no entanto, a China estabelece para as entidades organizadas no país o princípio básico da boa convivência, atuando o Estado como regulador quando determinadas autoridades ou organizaçõs religiosas excedem-se no direito à livre-manifestação e passam ao proselitismo que foge à harmonia, valor milenar e básico da organização social chinesa. Exemplo: os cristãos podem atuar no país, podem pregar a palavra de Cristo, podem ensinar o Evangelho, mas não podem convencer o indivíduo taoísta de que sua crença está errada, ou ameaçar um budisda com o inferno. Esse tipo de pregação pela negação à fé ou às convicções alheias é priobido na China, e por isso cria impasses entre chineses e cristãos, sobretudo católicos, visto que a autoridade do Vaticano (historicamente proselitista e conservadora) é vista como ingerência de outro Estado sobre assuntos chineses.

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Buscando soluções para adaptar a liberdade religiosa e o bom convívio entre as cinco grandes religiões ao modo chinês de viver e pensar, o Estado atua como organizador das entidades religiosas. A Igreja, por exemplo, está orientada pela Associação Patriótica Católica Chinesa, que dialoga com o Governo chinês e atua junto ao Vaticano como um órgão diplomático do país junto ao Microestado europeu. Aos muçulmanos, são ofertadas estruturas de Estado para construção de mesquitas, leis especiais para chinês em período de ramadã e financiamentos a entidades e pessoas físicas para ajudar na realizaçao do hajj, a peregrinação a Mecca, que o muçulmano deve realizar ao menos uma vez na vida. Com suporte constante aos fiés do Islã, a China tenta coibir a principal chaga hoje vivida por essa denominação, que é o fundamentalismo.
O budismo, por sua vez, embora seja fundamento do pensamento chinês e a maior entre as religiões oficiamente organizadas, já foi instrumentalizado por países vizinhos e potências ocidentais para desestabilizar a China, através da controversa figura do 14o Dalai Lama e sua pretenção de estabelecer uma teocracia autoritária no planalto tibetano. O que é uma reivindicação elitista, vinda de fora para dentro, já causou problemas como na escolha do 11o Pachen Lama, em 1995, quando de fora o Dalai Lama tentou interferir no processo espiritual de sucessão do menino que ocuparia o segundo posto hierárquico do budismo tibetano, contra os trâmites já estabelecidos pelos chineses tibetanos em parceria com o Governo central. Entretanto, hoje a região encontra-se em paz com o restante do país, e a comunidade religiosa espera que as futuras gerações de lamas estreitem sua harmonia com as demais entidades organizadas chinesas.

Por fim, taoísmo e confucionismo são a base do ensino, do pensamento, do Governo e da diversidade cultural chinesa. A partir da ideia de complementaridade do yin e do yang, por exemplo, funda-se o conceito de harmonia, que é o escopo da sociedade chinesa como um todo. A busca por formas equilibradas de coexistir, ainda que para tal seja necessária a transformação, marca desde a antiguidade a trajetória social e política da China, chegando até a Revolução Popular de 1949 e a Reforma Econômica de 1978, até o projeto de futuro compartilhado da Nova Rota da Seda, promovida pelo presidente Xi Jinping.
De Confúcio, o lema constante de preparo para a sabedoria, como uma joia lapidada ao longo de uma vida, longamente versado nos Analetos, é a base para a preparação dos líderes espirituais e governamentais chineses, além de profissionais e cidadãos. Desta forma, esta tradição se faz presente desde as escolas, marcando toda a cultura nacional.

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Pelos seus valores fundamentais a China prega o bom conviver entre as religiões e faz do acompanhamento regular das atividades religiosas não uma forma de cerceamento à liberdade, como muitos no Ocidente gostam de dizer, mas como uma maneira de garantir a liberdade, isto é, de assegurar aos chineses que nenhuma orientação religiosa, por mais adeptos que possa ter, por mais que tenha apoio de forças estrangeiras poderosas, possa impedir ao outro cidadão o direito de seguir suas convicções. Isto vale para as cinco grandes religiões, mas também para crenças minoritárias dispersas pelo imenso território chinês.

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