Carta ao ministro Luiz Edson Fachin e outras providências

Confesso que ao enxergar a postura da Corte, acomodada à conveniência dos ventos populares e políticos de um desgaste que se deu à Presidente Dilma, fator que facilita uma execração pública com pouca comoção social, e ao perceber sua aceitação deste motim reacionário sem nada avocar, restou-me uma desesperança com o Poder Judiciário brasileiro

Brasília - Ministro Edson Fachin, durante sessão do Supremo Tribunal Federal para julgar como deve ser o rito de tramitação do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff no Congresso (José Cruz/Agência Brasil)
Brasília - Ministro Edson Fachin, durante sessão do Supremo Tribunal Federal para julgar como deve ser o rito de tramitação do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff no Congresso (José Cruz/Agência Brasil) (Foto: Marconi Moura de Lima Burum)


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Prezado Ministro Fachin, com a devida vênia, tratá-lo-ei nesta carta por "você", certo da liberdade que aos humanos é dada primeiramente às relações institucionais.

Fachin, de todos os 11 (onze) togados, a postura de silêncio histórico que mais me constrange é a sua.

Quis o meu entusiasmo e curiosidade com o mundo jurisdicional ir visitar o Senado da República quando de sua sabatina, a exato um ano atrás. A meu ver, um momento humilhante para alguém com a sua envergadura moral, teórica e histórico-pessoal. Um Senado indigno – como aquele/esse – não poderia, por reserva política, se dar ao luxo de ser tão calhorda contigo. Foram 12 horas de perguntas e encostadas no muro.

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Ficaram expostas as pessoalidades suas e da Presidente Dilma, que o honrou com a Nomeação.

Superastes tudo aquilo com maestria – que, óbvio, era esperada. Havia talento em suas articulações discursivas. Havia segurança nas palavras. Havia hombridade. Conteúdo, isso é inquestionável (mesmo por aqueles déspotas do Senado). Todavia, o que vejo neste instante é mais um magistrado acuado, encostado na parede da história, com medo de resolver o justo.

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É importante que eu desloque uma nota de rodapé. Um Presidente não faz um favor à Nação quando envia ao Senado um nome – notável – para nos representar na Suprema Corte. E, fazendo-o, não é necessário que se devolva o favor à Chefe de Governo dando-lhe o direito sagrado ao devido processo legal, consequentemente, ao contraditório, à ampla defesa, destarte, ao justo julgamento. É o mínimo lógico que se pede ao STF brasileiro e a você, Fachin.

Confesso que ao enxergar a postura da Corte, acomodada à conveniência dos ventos populares e políticos de um desgaste que se deu à Presidente Dilma, fator que facilita uma execração pública com pouca comoção social, e ao perceber sua aceitação deste motim reacionário sem nada avocar, restou-me uma desesperança com o Poder Judiciário brasileiro.

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À exceção da ousadia do Marco Aurélio e do temperamento mediador ponderado do Ricardo Lewandowski, assusta-nos a orientação do Supremo perante a crise política, econômica e judiciária – se pensado o risco ao Estado Positivado. (Nota: Gilmar Mendes eu não considero juiz. É um fanfarrão de extrema direita manchando a Toga. Leia-se que o julgado do Direito não é disputa de taxa extra no rincão de um condomínio.Nesse caso, ele possui os microfones da Grande Mídia para defender sua ideologia.)

Ora, Dilma tem de ser condenada politicamente, ao crivo das intervenções populares. Todavia, vocês, ministros, até o alto de seus 75 anos de idade (vide PEC da "Bengala") são livres para impor tinta sobre o papel e fazer aplicar o justo Direito, tendo como grilhões somente a consciência e, sobretudo, a técnica Jurídica. Não há o que temer. A menos que também vocês tenham decidido pelo caminho mais fácil à conveniência do momento político, o que pretendo duvidar até a morte.

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Parece tolice empírica esse falar. Pior, improvisação de ativista secundário, todavia, existe um poder implícito adicional em vocês para resolver contendas que, a partir do ordenamento jurídico, são pressupostos de conteúdo sociológico e histórico. Podemos ler o que nos diz outro grande jurista, ex-colega de vocês, Eros Grau.

O eminente Ministro citado, ao nos apontar que a letra da norma é o ordenamento em potência que, data vênia e cuidado peculiar ao juízo, torna-se sentido completo no ordenamento jurídico a partir do intérprete, ou seja, o texto é matéria-prima "bruta" que, ao magistrado em seu acúmulo é dado proferir "uma decisão, considerando não somente os elementos que se desprendem do texto, mas também baseado em elementos da realidade; na verdade, o juiz constitui o direito" (ANDRADE; RAMOS, 2016), vemos quão generosa é a competência daquele que nos traduz a Constituição Federal a corrigir disparates políticos, cujas consequências ferem de morte o Direito para os frutos intergeracionais de nosso País.

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Guardadas as devidas proporções, nós que estamos "aqui fora", somos seres comuns da sociedade, remimos esperança naqueles que nos representam quaisquer que sejam as instituições que demos poder à existência. Você, Fachin, e o Ministro Roberto Barroso, este último – com liberdade para menção – sem dúvidas o maior Constitucionalista que eu creio ter lido, e um dos maiores elaboradores que aquela Corte poderia possuir, vocês renovaram, em sentido lato, o STF. Reoxigenaram a Toga Maior. Trouxeram novos ares ao Judiciário. De repente, a tradição desse Poder intransponível invade seus gabinetes para decisões a rigor da manutenção do status quo, ou o "mais do mesmo" para "lugar algum". O perigo da sucumbência democrática por evasividade atitudinal prescrita no lado "A" do Estado Normatizado.

Imagino que não se impressione com o que digo, Fachin, entretanto, a História é o maior dos juízes. Reserva o justo lugar aos grandes; àqueles que não se acomodam na conveniência e na conivência. Peço-te, contudo, que dês à criminosa Dilma o justo julgamento.

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Fachin, não permita que sua biografia seja maculada pela narrativa da dúvida exponencial de um impeachment à revelia do crime.

Ministro, com a dignidade, sabedoria e grandeza com que enfrentou os canibais do Congresso Nacional, sejais grande também nesse que, provavelmente, é o pior teste de nossa Democracia precoce, cuja escrita final, antes do fechamento do fascículo, se dará no gabinete de Vossa Excelência e de seus notáveis vizinhos.

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Sigo acreditando no Estado de Direito pronto. Sigo confiando em você.

 

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