Carnaval de Bolsonaro

Esse tempo volta, triste e mais uma vez cruel, neste carnaval de Bolsonaro



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Neste carnaval, as ruas de Olinda e do Recife estão desertas. Desertas de  tudo, porque não mais esperamos os clarins anunciando o reinado da alegria, da libertação nas ruas. Em torno de nós há só o silêncio, como uma paz de cemitério. 

Onde buscar o nosso carnaval? Nós nem podemos repetir o compositor Edu Lobo, que No Cordão da Saideira dizia ter composto a música “no frio, no inverno brabo de Paris em 1966. No Cordão foi uma música de flashes e saudade das coisas do Recife”. 

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https://www.youtube.com/watch?v=DgocluZUAqY

 

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Mas sem o lirismo evocativo da canção de Edu Lobo, perguntamos: 

Onde as multidões com o suor bom que colava confetes? Em que lugar podemos encontrar as peles abrasadas, os sovacos mal raspados que eram em si mesmos fetiches de bocetas nuas, comprimidas, esbarrando-se num fogo que desejava a tudo queimar, arder até a alma pobre da gente? Onde a explosão de braços e pernas na dança, a multidão revolta, a humanidade negra, mulata, branca, revoltada? 

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Não faz muito, havia seis, oito, dez mil pessoas apertadas em um espaço estreito da rua. De repente, todo mundo enlouquecia, e desejava correr, mas não saía do lugar, porque estava cercado por todos os lados. Cada homem, cada mulher, cada menino, todos queriam ainda assim abrir espaço à sua volta, e todos queriam isso a um só tempo. Onde estão? Aquela gente estimulada, embriagada de álcool e alegria, excitada por uma música que não se ouve só com os ouvidos, porque ela se ouve com os braços, as mãos, a boca, os pés, a massa em alegria e liberta ao som do frevo, onde está?  

Com que sentimento estamos agora? Antes, estávamos com “Vem, vem fazer parte este cordão. O Recife tem um lugar pra você dentro do coração” 

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https://www.youtube.com/watch?v=FXMClvMXJno

Agora, em vez do micróbio do frevo, temos o incontrolável, desgoverno do vírus da covid-19. O carnaval do tempo de Bolsonaro. Mas onde está a relação entre este carnaval sem gente nas praças, nos largos, nas avenidas, e a maldição bolsonara? Como se ligam este  Saara  e o fascismo no alto do Planalto?   

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Bem podemos dizer que as imensas tragédias na pandemia do coronavírus  poderiam ter sido evitadas, se as ações de Bolsonaro não tivessem reforçado as desigualdades do Brasil e nem tivessem sido infernais para a saúde brasileira, como o horror de mortes por fata de oxigênio. Um crime odioso e sem perdão. 

 

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Para os especialistas, a maldição bolsonara trouxe desgraças nunca vistas para o Brasil e toda a terra. Sem dúvida, foi sistemático o desgoverno que alegou ser o coronavírus uma farsa ou uma gripezinha. E no seu descaso – “e daí? O que eu tenho a ver com a morte? Todos morrem” -, ele incentivou com o seu exemplo as aglomerações e a ausência de máscara. Além da ordem para a produção de 4 milhões de comprimidos de cloroquina, como remédio para o coronavírus.

 

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O resultado é este: mais que a paz dos cemitérios, a multiplicação de covas no cemitérios brasileiros. Portanto, não perguntem jamais por quem choram em silêncio os clarins. Os clarins se tornam mudos para o carnaval de Bolsonaro. Para estas ruas sem povo, sem frevo, sem maracatu, sem samba, sem alegria. Aquilo que estava no livro “Soledad no Recife”, agora retorna com uma outra angústia: 

 

“Mas sabemos todos, que vemos o Cabo Anselmo em 1972 por trás com os nossos olhos de hoje, que a sua cara oculta um ser trágico. Aquele que nos vê é um instrumento de morte para pessoas, para corações desarmados que pedem a mudança do mundo pelas armas. E por isso, é claro, ele não dançará o frevo. Essa música flamejante, aberta, contente, generosa, que se pula ao som de metais nas ladeiras e largos, a ele não cabe. Do boneco de Olinda, do homem da meia-noite, ele só guarda o engodo”. 

 

Esse tempo volta, triste e mais uma vez cruel, neste carnaval de Bolsonaro.  

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