Campanhas dos pisos estaduais: lições das peleias
O que certamente atrapalha as empresas catarinenses é a política entreguista e antipopular de Bolsonaro/Guedes, a serviço do sistema financeiro internacional. Mas não um aumento de 10% ou 15% nos salários para comprar feijão, arroz, batata e leite
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Um processo de campanha salarial, especialmente quando amplo e abrangente, é sempre um aprendizado coletivo, da parte dos trabalhadores. Quando as centrais sindicais e o DIEESE, em 2006, resolveram travar a luta pelos pisos estaduais em Santa Catarina, os empresários afirmavam que o estado não podia ter piso porque sua existência iria causar inflação e desemprego. Os representantes dos empresários bradavam para “provar” a relação inevitável entre aumento de salários e inflação e desemprego. Os grandes meios de comunicação repercutiam amplamente a visão dos empresários e quase não nos davam voz.
Uma das lições essenciais daquela campanha foi a importância dos trabalhadores aprenderem a pensar e formular estratégias através das próprias ferramentas de reflexão. Ou seja, é fundamental termos pensamento político e econômico independentes. Se os trabalhadores catarinenses não tivessem os seus próprios formuladores de hipóteses e teorias, e dependessem das formulações dos empresários, jamais empreenderiam uma luta fundamental como a dos pisos. Os trabalhadores iriam acreditar que aumento salarial é inflacionário, que os pisos iriam gerar desemprego, e assim por diante. Assim como no caso do Salário Mínimo Nacional, precisou ter, entre 2010 a 2020, correção regular dos pisos para o pessoal se convencer que não havia uma relação direta e necessária entre aumento de salários e elevação da inflação.
Os que eram contra a adoção dos pisos no estado diziam, durante toda a campanha, que a sua implantação iria levar a demissões, o que faria a taxa de desemprego escalar. Como a história é uma professora irônica, a implantação dos pisos coincidiu com um período no qual o Brasil atingiu a menor taxa de desemprego já observada: em dezembro de 2014, quatro anos após a implantação dos pisos, o Brasil chegou a uma taxa de desemprego de 4,3%, a menor da história. Santa Catarina, por sua vez, em dezembro de 2014 tinha taxa de desemprego de 2,8%, o que pode ser considerado “pleno emprego”. Com uma taxa dessas, todos que quisessem trabalhar encontravam colocação no mercado de trabalho.
A suposta relação necessária entre aumento salarial e inflação, também alegada pelo empresariado para não implantar os pisos, é desmentida pelo próprio quadro atual. Estamos tendo agora um empobrecimento dramático da população com o achatamento dos salários, não negociação da inflação nas datas base, desemprego em massa, etc. No entanto, a inflação vem aumentando nos últimos meses, especialmente a inflação de alimentos, que é uma inflação do assalariado, e o desemprego bateu todos os recordes. Ora, se aumento de salários provoca inflação, a sua redução deveria ser um fator importante de contenção dos preços. Inflação é fenômeno com muitas causas. Eventualmente até pode ser causada pelo excesso de poder aquisitivo da população. Mas o Brasil está longe disso.
O que certamente atrapalha as empresas catarinenses é a política entreguista e antipopular de Bolsonaro/Guedes, a serviço do sistema financeiro internacional. Mas não um aumento de 10% ou 15% nos salários para comprar feijão, arroz, batata e leite. Até porque na indústria, segundo a Pesquisa Industrial Anual do IBGE, o peso dos gastos de pessoal no custo total industrial está em torno dos 13%, incluindo salários e encargos sociais. É o custo do trabalho. Os problemas das indústrias, assim como das empresas em geral, estão muito mais localizados nos demais custos, como matéria-prima, câmbio, taxa de juros, política industrial, etc.
Toda a política antinacional e de entrega do patrimônio, praticada por Bolsonaro, abertamente contra os interesses do Brasil, é muito mais prejudicial ao empresariado catarinense e brasileiro em geral, do que qualquer aumento moderado de salários, que só iria beneficiar o mercado consumidor interno. A campanha dos pisos salariais de 2020/2021 está buscando aumentar o custo da força de trabalho (no custo total industrial) em 1,3% ou 2%, exatamente na parte do custo empresarial que produz valor novo. Máquinas e equipamentos não produzem valor, apenas o transferem. Estamos querendo proporcionar cerca de R$ 100 ou R$ 120,00 mensais, para quem produz toda a riqueza do País e do estado.
Os trabalhadores são fundamentais tanto na produção quanto no consumo dos bens produzidos. Quem vive do seu trabalho alcança a cifra no Brasil, por baixo, de 95% da população. Por que o País está há seis anos ou em recessão ou estagnado? Porque, dentre outras coisas, o mercado consumidor está sendo destruído pelo golpe de Estado de 2016. Destruição de direitos e de salários nunca levou a crescimento econômico em país nenhum. Pelo contrário. Se o mercado consumidor interno é destruído, aumenta a dependência do país de mercados externos. Que neste momento de crise mundial estão sendo disputados à bala no mundo todo.
Como observado, a inflação de alimentos está em um patamar muito superior à média inflacionária. Inflação é um mecanismo de transferência rápida de renda dos mais pobres para os mais ricos, que assim enriquecem ainda mais com a fome e a piora de vida da população mais pobre. Especialmente quando se trata de inflação de alimentos. É um mecanismo extraordinário (no sentido de adicional) de exploração dos trabalhadores, que, em condições normais, mesmo que a inflação seja zero, já são explorados. Essa é uma razão a mais para haver o reajuste dos pisos salariais na atual campanha.
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