Bretas faz de Cabral uma vítima

Bretas quis ser diferente ao despachar Cabral para um presídio federal de segurança máxima, em Mato Grosso, citando a Bíblia, mais precisamente o versículo em que Pedro pergunta ao Messias: "Mestre, quantas vezes devo perdoar o irmão que pecar contra mim? Até sete vezes?" E Jesus respondeu: "Não digo até sete vezes, mas até setenta vezes sete". Ele quis dizer com essa citação que estava perdoando o ex-governador carioca, mas do quê?

Rio de Janeiro - Juiz Marcelo Bretas (ao centro) recebe apoio de artistas, juízes federais, políticos e procuradores da força tarefa da Operação Lava-Jato (Fernando Frazão/Agência Brasil)
Rio de Janeiro - Juiz Marcelo Bretas (ao centro) recebe apoio de artistas, juízes federais, políticos e procuradores da força tarefa da Operação Lava-Jato (Fernando Frazão/Agência Brasil) (Foto: Ribamar Fonseca)


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O juiz Sergio Moro fez escola: já existem vários outros magistrados correndo atrás da fama. Com o sucesso de Moro, que foi transformado em celebridade pela mídia, se desloca como um pop-star cercado por vários seguranças e faz palestra em toda parte, outros juízes resolveram trilhar o mesmo caminho, conquistando também o seu espaço no noticiário. É o caso, por exemplo, do juiz Marcello Bretas, do Rio de Janeiro, que parecia ter um comportamento discreto e de repente passou a dividir o estrelato com o juiz de Curitiba, sobretudo depois do interrogatório do ex-governador Sergio Cabral. Bretas quis ser diferente ao despachar Cabral para um presidio federal de segurança máxima, em Mato Grosso, citando a Bíblia, mais precisamente o versículo em que Pedro pergunta ao Messias: "Mestre, quantas vezes devo perdoar o irmão que pecar contra mim? Até sete vezes?" E Jesus respondeu: "Não digo até sete vezes, mas até setenta vezes sete". Ele quis dizer com essa citação que estava perdoando o ex-governador carioca, mas do quê? Qual foi a ofensa de Cabral? O fato de ter dito que a sua família mexia com bijouterias?

Na verdade, o versículo mais adequado à situação seria aquele em que Jesus disse: "Bem aventurados os que são perseguidos pela Justiça, pois é deles o reino dos céus". O ex-governador Sergio Cabral, obviamente, está pagando por seus crimes, mas já não bastam os 74 anos de reclusão a que foi condenado, na prática uma prisão perpétua? Tem-se a impressão de que se dependesse do Ministério Público, sempre insatisfeito com as penalidades aplicadas pelos juízes, e houvesse pena de morte no Brasil Cabral já teria sido condenado à pena capital. Afinal, qual a justificativa para transferi-lo para um presidio federal de segurança máxima em outro Estado? Uma vingancinha do magistrado irritado? Impedi-lo de ter mais contato com a família? Ninguém que comete crimes deve ficar impune, embora exista muita gente no governo e no ninho tucano que nunca foi sequer incomodada, mas não se deve exorbitar na punição aos culpados, porque isso soa como abuso, às vezes até como crueldade.

Pelo menos dois ministros do Supremo Tribunal Federal, Ricardo Lewandowski e Alexandre de Moraes, já condenaram publicamente o estrelismo de magistrados, mas até hoje não houve nenhuma providência concreta para conter a atração deles por holofotes. O ministro Alexandre disse que "qualquer juiz que vota pensando em popularidade é um perigo. Não tem que fazer populismo". E acrescentou: "Se quer fazer, não seja juiz, procurador, promotor: seja político". Foi um recado direto para, entre outros, o juiz Sergio Moro e o procurador Deltan Dallagnol, que usam a Lava-Jato como trampolim para a realização de palestras e até já se insinuam como candidatos a cargos eletivos no próximo pleito. Além disso, é preciso lembrar a alguns magistrados que eles fizeram concurso foi para juiz, não para Deus. Alguns se comportam como semi-deuses, talvez pelo poder que passaram a enfeixar para decidir sobre o destino das pessoas. A sua tarefa, sem dúvida, é muito difícil, obrigados às vezes a tirar a liberdade das pessoas, mas isso pode ser feito sem prepotência, sem humilhar o réu e sem agravar a sua punição.

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A Justiça algumas vezes se mostra muito rigorosa com determinadas pessoas e condescendente com outras. Algumas decisões contrariam totalmente o bom senso, como a que condenou a ex-ministra Menicuci por ter criticado o ator pornô Alexandre Frota, por fazer apologia do estupro. E o mais surpreendente, a condenação foi dada por uma juíza e confirmada por outra. E quando finalmente outro magistrado deu ganho de causa à ex-ministra, anulando a sua condenação, Frota deu uma declaração afirmando que o juiz "julgou com a bunda". Por mais estranho que possa parecer, passada mais de uma semana, até agora não se tem conhecimento de nenhuma iniciativa do Judiciário para punir tamanho desrespeito e afronta. Nem mesmo as associações de classe dos juizes, que se mostraram muito diligentes para denunciar ao CNJ quatro colegas do Rio de Janeiro por participarem de uma manifestação a favor de Dilma, disseram algo. Nem o corporativismo, que se manifesta todas as vezes em que o juiz Moro é criticado, deu sinais de vida, o que pode significar que o ator pornô tem muitos admiradores no Judiciário. Sem dúvida é um silêncio muito estranho.

O fato é que, por mais pecados que ele possa ter cometido, não há nenhuma justificativa para a transferência de Cabral para um presidio de segurança máxima, onde se encontram recolhidos delinquentes efetivamente perigosos para a sociedade. Qual o perigo que o ex-governador pode representar para a sociedade? O ressentimento e o ódio são maus conselheiros para decisões judiciais. E muito menos para aprovar medidas descabidas, que em nada honram a Justiça. Já não basta o que a Lava-Jato e a mídia fazem com Lula, caçado como se fosse um criminoso mesmo sem provas de nada? Espera-se que o Supremo, que tem se mostrado cego, surdo e mudo no caso do ex-presidente operário – embora alguns ministros reconheçam o abuso – pelo menos uma vez restaure a Justiça e impeça a transferência de Cabral que, por um ato impulsivo de Bretas, acabou sendo transformado em vítima. O homem, afinal, já está preso e humilhado. Querem o quê? Sangue?

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