Brasil a caminho dos Jardins Suspensos da Babilônia
"Com a liquidação das grandes empresas, desocupamos profissionais em todos os níveis. Como será agora com a onda de desempregos no setor automobilístico e automotivo, desencadeada com o fechamento da Ford. E esta não é a única das montadoras que fecha suas portas no Brasil. Virão outras", escreve a colunista Hildegard Angel
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Hildegard Angel, do Jornalistas pela Democracia
Caso a grande mídia brasileira tivesse demonstrado, diante da extinção dos 799 mil* empregos advindos da indústria da construção em geral, devido às artimanhas do ex-juiz Sergio Moro e do MPF, que levaram à destruição daquela indústria no país, certamente não estaríamos vendo hoje a mesma grande mídia se lamentar compungida devido à perda de cinco mil empregos com o fechamento da fábrica da Ford, que profundamente todos lamentamos.
A quase extinção de nossas maiores empreiteiras, tais como Odebrecht, Andrade Gutierrez, OAS, Queiróz Galvão, dentre outras, não envolveu apenas seus empregos diretos, refletiu-se também sobre uma extensa cadeia de produção e comercialização paralela, bem como ao comércio e aos serviços envolvendo a construção, a subcontratação das pequenas e médias empreiteiras e a imensa mão de obra não especializada, que significa o grosso dos empregos em qualquer país, e representa a população com menos recursos. Retirou-se o pão das bocas dos operários para satisfazer às bocas gulosas do empresariado estrangeiro concorrente das nossas grandes. Em briga de cachorro grande, sofrem os pequenos.
Nossa construção pesada não atende apenas às necessidades do pequeno servente, a quem ela dá a básica formação nos canteiros de obras, desde a alfabetização à graduação profissional, transformando-o em um técnico especialista. As empreiteiras empregam também os grandes nomes da engenharia, em seus vários segmentos. Com a liquidação das grandes empresas, desocupamos profissionais em todos os níveis. Como será agora com a onda de desempregos no setor automobilístico e automotivo, desencadeada com o fechamento da Ford. E esta não é a única das montadoras que fecha suas portas no Brasil. Virão outras.
Quando o grande industrial detecta o desprezo conferido por um governo a quem gera empregos e estimula a economia, não lhe faltam motivos para se transferir para cenários mais acolhedores, visando os interesses de sua entidade.
Não foi uma surpresa para o ministro Paulo Guedes, nem para Bolsonaro, muito menos para o setor, a debandada da Ford.
No dia 1º de dezembro de 2020, o presidente argentino Alberto Fernández, anunciou no Twitter que teria uma reunião com o presidente da Ford argentina, acenando para isso com expressivos investimentos de US$ 580 milhões (R$ 3,2 bilhões) para a produção lá da nova Ranger. A empresa anunciou que a iniciativa era parte de uma “reestruturação global”. Eram favas já contadas. Tudo isso, esse chororô de Bolsonaro, Guedes e mesmo da mídia são jogo de cena de quem não se interessou pela defesa da nossa economia, e não tem como justificar esse desastre anunciado. O setor de comunicação, que agora choras pitangas da perda do grande fabricante em seu cardápio de anunciantes, terá que agora lamber os beiços apenas com a publicidade proporcionada pelos revendedores da marca multinacional.
Talvez não valesse apena, à época da bem articulada campanha demolidora contra as empreiteiras, expor a catástrofe que seria sua destruição daquelas, que apenas contemplavam jornais e TVs eventualmente com campanhas institucionais. Muito eventuais. Tais veículos de comunicação foram mãe, pai, madrinha, padrinho, padre e bispo do projeto de colapso de nossa indústria de construção pesada. Não esqueço o artigo de um famoso formador de opinião, deleitando-se com a possibilidade da extinção de nossas empreiteiras, chamando as estrangeiras para ocuparem o mercado. Mas nessa campanha erraram na dose do veneno. Não só abalaram as nacionais, como afugentaram as estrangeiras, no cenário instável, indecifrável e lamentável que se sucedeu.
Louvável ver como os comentaristas de economia tentam justificar esse desastre com pandemia, auxílio emergencial, ausência das reformas necessárias, exigências trabalhistas, falta de incentivos, carga tributária etc. Porém, nossa indústria sempre prosperou, mesmo nas fases mais adversas. Fato é que somos hoje como um caminhão de brita desgovernado, descendo a ladeira sem freios, conduzido por alguém sem carteira de habilitação para exercer qualquer função pública mais elementar. Que dirá a de presidente do país. Lógico que isso gera insegurança e, mesmo que revoguemos a Lei Áurea, não há o que atraia investidores e neutralize esse descompasso gerencial.
O máximo que podemos atualmente almejar é plantar repolhos nos Jardins Suspensos da Babilônia, pois até a soja já carimba o passaporte para a Europa, conforme deseja o presidente da França, Emmanuel Macron.
*Dados do Sinicon - https://www.sinicon.org.br/files/SINICON_Emprego_2017.03.24_-v2-.pdf
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