Qual o caminho do PSOL?
Guardadas as diferenças, o PSOL pode adotar a experiência e os caminhos da nova esquerda chilena como referencial de aprendizado e exemplo, diz Aldo Fornazieri
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No último artigo (Lula, Alckmin e o cenário de 2022), procurou-se argumentar acerca da legitimidade da formação da chapa entre o ex-presidente e o ex-governador. Legitimidade assentada nas determinações da conjuntura que definem a necessidade imperiosa de derrotar tanto Bolsonaro, quanto Moro; na constituição de um bloco de força capaz de garantir o provável governo Lula; na constatação de que não existe um impeditivo de ordem política ou moral para a formação da aliança e no fato de que os interesses que o PT representa são condizentes com uma coalizão com setores de centro.
O PSOL, contudo, não é uma corrente do PT. Tem uma visão programática e estratégica deferente do partido de Lula. Pode-se dizer que integram o mesmo campo, mas o PT numa posição de centro-esquerda e o PSOL numa posição de esquerda, embora não de extrema-esquerda.
O PSOL vem adotando, até agora, um caminho próprio de construção e afirmação, consoante com seu programa e com sua estratégia. A atual conjuntura, no entanto, coloca uma grande dificuldade para o partido definir, sem embaraços, o seu caminho. É como se a conjuntura política constrangesse a tomada de decisões dos pessolistas.
As principais dificuldades são de duas ordens: 1) como se disse, existe uma necessidade imperiosa de derrotar Bolsonaro e, num segundo plano, Sério Moro, por tudo o que eles representam; 2) em decorrência do ponto um e da forma singular pela qual Lula está entrando nesta disputa (pós prisão e pós anulação dos processos) faz com que ele ocupe de forma avassaladora quase todo o campo eleitoral da esquerda.
O ponto um coloca o peso da responsabilidade e da necessidade de o PSOL engajar-se positivamente num processo político-eleitoral para derrotar as expressões de extrema-direita e fascistas que vêm causando um grande mal ao país e ao povo. Embora o ufanismo já tome conta dos petistas, a prudência recomenda mais cautela, pois as eleições serão difíceis. Assim, se o PSOL se colocar à margem de um movimento efetivamente capaz de derrotar a extrema-direita poderá pagar um preço alto do isolamento e a pecha de não participar de forma efetiva na luta pela derrota da extrema-direita.
Quanto ao ponto dois, o fato de Lula ocupar o espaço político-eleitora da esquerda e para além dela, dificulta e tira oxigênio de uma candidatura do PSOL à presidência da República. Correria o risco de cair na insignificância.
Diante dessas dificuldades, qual o caminho mais razoável para o PSOL? Em primeiro lugar, a história, a visão programática e a concepção estratégica do partido não permitem que integre uma coalizão da centro-esquerda com o centro. Considerando as questões apresentadas acima, a saída mais sensata que se apresenta para o partido consiste em apoiar Lula de forma independente, sem integrar formalmente a coalizão, nem da campanha e nem do governo.
Se adotar esse caminho, o PSOL resolve vários problemas: participa de forma efetiva do esforço de derrotar e extrema-direita, mantém sua autonomia programática e não perde sua independência decisória. Um partido que queira percorrer um caminho próprio de disputa de poder deve manter sempre sua autonomia decisória e sua autonomia para organizar e constituir força política ativa. Tal partido não pode colocar-se em posições subalternas.
Cabe ao PSOL, se quiser manter esta perspectiva própria, não integrar com cargos um provável governo Lula. Poderá apoiar, com independência, todas as medidas do governo que signifiquem mais democracia, mais igualdade, mais justiça, mais liberdade, mais direitos e mais responsabilidade com o meio ambiente e com a salvação das condições de vida no planeta.
Num governo Lula, o PSOL pode e deve coordenar, no Congresso e fora dele, um bloco de proposição e de pressão por políticas progressistas, democratizadoras e transformadoras e por reformas progressivas que removam os mecanismos que impedem a igualdade e a justiça. Mas para que possa exercer com força e eficiência essa função, o partido precisa de uma estratégia eleitoral que fortaleça suas bancadas na Câmara e no Senado. Deve refletir, por exemplo, se terá mais ganhos lançando Guilherme Boulos ao governo do Estado ou à Câmara dos Deputados.
Mais do que as ações no Congresso, as lutas por direitos e por democracia poderão avançar e alcançar conquistas se elas forem fruto da organização e da mobilização dos movimentos sociais e populares. Este capítulo precisa ser escrito de forma diversa daquele capítulo que foi escrito durante os governos anteriores do PT. O saldo organizativo e mobilizador dos movimentos populares naquele período não foi condizente com as necessidades de avanços nas lutas por conquistas de direitos.
A vitória de Gabriel Boric nas eleições presidenciais do Chile, a sua história e os caminhos que ele percorreu na construção da Frente Ampla, certamente, devem inspirar o PSOL. Mas é preciso notar que na base da vitória de Boric estão poderosas e, pode-se dizer, vitoriosas mobilizações populares. As primeiras dessas mobilizações foram as grandes manifestações estudantis de 2011 e 2012. Aquelas manifestações, ao contrário do que ocorreu em 2013 no Brasil, foram vitoriosas.
A candidatura e a vitória de Boric também é fruto das mobilizações e manifestações de 2019 que levaram à Constituinte e ao fim da Constituição autoritária da ditadura Pinochet. No Brasil não tivemos processos similares. Aqui, houve derrotas. Lideranças do PSOL não projetaram reputação e força suficientes para protagonizarem uma candidatura presidencial respaldada em lutas vitoriosas. Mas, guardadas as diferenças, o PSOL pode adotar a experiência e os caminhos da nova esquerda chilena como referencial de aprendizado e exemplo.
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