Bolsonaro pode aprender com os coletes amarelos
Primeiro porque podemos, e é bastante possível que isso aconteça, viver uma onda de protestos nos próximos meses no Brasil. Segundo porque, como presidente, deverá atender e administrar os anseios de uma população composta por pessoas que votaram e não votaram nele
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O presidente eleito Jair Bolsonaro fará um favor a si mesmo se prestar atenção e tirar lições das manifestações dos chamados “coletes amarelos” que ocorrem em Paris.
Primeiro porque podemos, e é bastante possível que isso aconteça, viver uma onda de protestos nos próximos meses no Brasil.
Segundo porque, como presidente, ele deverá atender e administrar os anseios de uma população que é composta por pessoas que votaram nele, que não votaram nele, que o admiram, que são indiferentes e também por aqueles que o rejeitam. Ele será o presidente de todos, enfim, e orquestrar interesses, demandas e vontades de diversas ordens e procedências está longe de ser um passeio.
Terceiro, e principalmente, porque, com o enfraquecimento dos movimentos sociais que ele prega, e, sobretudo, com a crise no movimento sindical, promovida pela famigerada reforma trabalhista, as manifestações sociais de grupos descontentes com a política, que inevitavelmente surgirão, tenderão a ter comandos difusos, indefinidos, ou a simplesmente não ter comando. Hoje a França vive a maior onda de protestos desde 1968. Entre os manifestantes encontram-se pessoas comuns, não militantes, que, como informou a CBN são contagiadas pelo clima se instaurou, militantes de esquerda e de direita.
Manifestação sem comando emperra a possibilidade de diálogo o que dificulta a tomada de uma solução. É o que acontece na França. Uma manifestação que encurralou Emanoel Macron, o presidente reformista que pretendia ter um diálogo sem intermediários com a população.
Parece até bonito pensar que um presidente vai dialogar diretamente com a população, mas isso é inviável. Ele não vai conversar com mil, cem mil, ou um milhão de pessoas para resolver um problema econômico ou social.
No Brasil tivemos exemplos recentes como a greve dos caminhoneiros de maio de 2018, que causou o maior desgaste vivido pelo presidente Temer, mesmo se comparado às acusações de seu envolvimento com a JBS. Outro exemplo foram as manifestações de junho de 2013, mais parecidas com a dos coletes amarelos. A então presidente Dilma Rousseff enfrentou grandes dificuldades para lidar com a situação, demorou para responder, mesmo com megamanifestações ocorrendo diariamente por todo o país, e quando fez um pronunciamento oficial, somente dia 21 de junho, mostrou que não sabia quais eram as reivindicações e nem a quem se dirigir. Deu no que deu. Podemos ainda citar a longínqua greve dos tecelões, em 1917, considerada a primeira greve geral no Brasil, que abalou o país, acuou os patrões e o governo e só terminou quando um comitê de imprensa, formado por jornalistas dos nove maiores jornais de São Paulo, se propôs a intermediar.
Bolsonaro não poderá abrir mão do diálogo com entidades representativas, como são os sindicatos, para governar. O presidente eleito vive sua lua de mel com o eleitorado, mas a realidade há de se impor.
É muito positivo e democrático que a população se manifeste, tome as ruas, solte a voz, se faça ouvir. Mas é preciso estar atento ao fato de que lidar com eventos de grande envergadura, que mobiliza grandes contingentes, requer experiência, jogo de cintura, capacidade de diálogo.
Os trabalhadores organizados, quando se mobilizam, o fazem com finalidades específicas e tem interesse em chegar à solução sem violência e desgastes desnecessários. Jair Bolsonaro, por outro lado, ainda não assumiu uma postura pacificadora, demonstrando, ao contrário, um grande potencial de causar descontentamentos em setores importantes da sociedade. Se ele acha que vai impingir seu ideário sem conversar com a sociedade, sem ouvir as instituições e respondendo com repressão e violência aos seus opositores, seu destino pode ser como o constrangimento de Macron ou como a melancolia de Dilma Rousseff.
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