Bolsonaro entrou no radar do impeachment?

Colunista Aldo Fornazieri avalia que Jair Bolsonaro "deu alguns passos em direção ao impedimento de seu mandato". "O baixo crescimento do PIB de 2019 provocou frustrações até mesmo em setores das elites que o apoiam", afirma. "Bolsonaro não se vê e não age como presidente do Brasil. Ele se vê e age como chefe de bando, de milícia", acrescenta

(Foto: Alan Santos - PR)


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Bolsonaro entrou no radar do impeachment? Esta pergunta não pode ser ainda respondida categoricamente. Mas, por algumas razões, o que se pode dizer é que ele deu alguns passos em direção ao impedimento de seu mandato. O baixo crescimento do PIB de 2019 provocou frustrações até mesmo em setores das elites que o apoiam. A perspectiva da economia para 2020 não é ruim apenas por conta do coronavírus. Cada vez mais setores da sociedade percebem que a equipe de Guedes não tem um plano para estimular a economia. Reformas e privatizações só surtem efeitos no médio prazo. Os brasileiros precisam de respostas e ações urgentes no presente. Mas o que se percebe no presente é o desgoverno.

O desgoverno se evidencia em várias frentes, destacando-se as seguintes: o governo não tem um plano para ativar a economia; as áreas sociais, ambientais, culturais, educacionais e científicas sofrem um explícito processo de destruição; na área política, o governo Bolsonaro perde cada vez mais apoio popular e apoio no Congresso; na área militar crescem as desconfianças sobre a viabilidade do governo. O agravamento desses fatores pode colocar Bolsonaro na beira do abismo do impeachment.

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Mas um impeachment não depende apenas da vontade do Congresso e de agentes políticos e econômicos. Ele depende, fundamentalmente, das ruas. Collor e Dilma sofreram processos de impedimento após grandes mobilizações de rua. Não seria diferente com Bolsonaro. Para ocorrer impeachment o apoio a Bolsonaro teria que se desidratar abaixo dos 15%. Este jogo vai ser decidido antes nas ruas e depois no Congresso.

Bolsonaro percebeu que o jogo será decidido nas ruas. Por isso tomou a dianteira ao convocar os atos do dia 15. Com o coranavírus circulando, não será possível medir o termômetro das ruas no curto prazo: os atos bolsonaristas foram desidratados, em alguma medida, pelo temor da epidemia e o calendário de atos dos movimentos sociais e da oposição será afetado e adiado pela mesma razão. Assim, a medição de forças das ruas terá que ser adiada. Mas, o que se pode indicar pela lógica dos acontecimentos de 2019 e pelas primeiras escaramuças de 2020 é que, nem o bolsonarismo, nem as oposições de esquerda têm grande capacidade convocatória neste momento, a ponto de tornar as ruas decisivas para um lado ou para outro. O principal palco de oposição do PT, por exemplo, parece ser os recintos do STF. A direção do PT parece acreditar mais nos senhores togados do que no povo.

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Nas últimas semanas ficou evidente que Bolsonaro mudou de foco quanto a seus alvos de ataque. O foco principal não é mais a esquerda, mas o centrão, nas figuras de Rodrigo Maia, Alcolumbre, Dória e o presidente do STF. Não são apenas as figuras políticas, mas também as instituições como o Congresso e o STF. As manifestações do dia 15 tiveram um conteúdo predominantemente golpista. Bolsonaro percebeu que a força que pode proporcionar o impeachment no Congresso é o centrão, não a oposição. Nisto, talvez, ele queira extrair lições dos erros do PT. A estratégia petista contra o impeachment de Dilma foi a de composição com o centrão até o fim. Dois dias antes da votação na Câmara alguns ministros retomaram seus mandatos parlamentares para votar contra Dilma. Bolsonaro parece acreditar que a fórmula para deter o centrão é o confronto. Não há garantias que dará certo e o momento político, econômico e social não favorece a estratégia bolsonarista.

Os analistas da grande mídia e da esquerda cobram de Bolsonaro aquilo que ele não pode entregar: responsabilidade, decoro, respeito, racionalidade, bom senso, civilidade e comando do país. Bolsonaro é o oposto de tudo isso, seja pela sua personalidade demente e desequilibrada, seja pelo seu cálculo político.

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Os líderes totalitários se movem claramente por uma propensão criminosa. O seu modo de ser é a mentira. Acreditam nas suas próprias mentiras e, com simplismo grosseiro, conseguem fazer com que seus adeptos também acreditem nas mentiras.  Acreditam que o mal e o ódio que propalam sejam o bem. Esses diferentes tipos de líderes acreditam que obedecem um mandato superior: leis da história, leis da natureza ou Deus. No caso de Bolsonaro e de seus seguidores, trata-se de agir para realizar a vontade divina. Existem vários estudos que explicam essas tipologias psíquicas e comportamentais.

O que não se consegue explicar é a conduta omissa e covarde daqueles que deviam deter essa marcha da insanidade dos atormentados que, se não forem detidos, terminarão triunfando e mergulhando a sociedade na violência desenfreada. Bolsonaro faz e desfaz. Não respeita ninguém. Não respeita as instituições, nem o seu ministério, como não respeitou o partido que o elegeu. Ele não está apto e nem quer comandar o país para enfrentar o coronavírus e a crise econômica.

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Cobrar de Bolsonaro respeito a alguém ou às instituições é semear palavras ao vento. Cobrar dele decoro porque ele chutou o boneco de Lula, porque Lula foi recebido pelo papa e outros líderes mundiais, é uma lamúria que não faz sentido. Não se deve cobrar nada de Bolsonaro. A única atitude que se deve ter em relação a ele é detê-lo. Esta tarefa deve ser levada a efeito dentro das instituições, na sociedade civil, mas, principalmente, nas ruas. Chega a ser espantoso, para não dizer deprimente, que, há poucos dias, um parlamentar bolsonarista, numa altercação com um petista, tenha desafiado o PT a chamar o povo às ruas. 

Bolsonaro não se vê e não age como presidente do Brasil. Ele se vê e age como chefe de bando, de milícia. A sua estratégia consiste em manter o apoio de cerca de 1/3 do eleitorado, visando as eleições de 2022. A par disso ele vai organizando e mobilizando seus camisas negras, as suas futuras tropas de assalto. Ele acredita que enfrentará o PT no segundo turno e que vencerá. Seu inimigo imediato, que pode tirar-lhe votos, é o centrão. Ao contrário do que pensa a esquerda apavorada, Bolsonaro não quer e nem tem força para dar um golpe agora. A sua estratégia é o tensionamento das instituições democráticas e a formação de sua força de combate. A estratégia de Bolsonaro no poder é oposta à do PT. O PT domesticou e docilizou a militância. Bolsonaro a exaspera e a incita à violência. 

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Bolsonaro não tem um projeto de governo e nem de país. Ele quer o poder. O poder pelo poder. O poder para extravasar os seus instintos primitivos, para extravasar o ódio que nutre por tudo o que é diferente, o ódio que nasce de suas frustrações inconfessáveis. Ele nutre um desprezo profundo pelo povo Ele é um líder simplório, grotesco, histriônico, sem dotes de inteligência e de oratória. Ele cativa porque se comunica por fórmulas simples e vazias e pela crença resoluta que expressa nas mentiras que ele profere e na falsificação da realidade que constrói. 

As pessoas descrentes das instituições, dos partidos e da política querem se convencer de algo verdadeiro. A mentira é a fantasia simples que Bolsonaro consegue oferecer-lhes como verdade. A resolução dos problemas do país não está nas leis, nas instituições e na boa governança, mas na aplicação pura da força. Daí nasce a devoção dos fanáticos que, se não detidos, eles arrastarão tudo o que tem pela frente porque não encontram resistências. Encontram apenas a criminosa omissão de instituições, líderes, partidos e movimentos que deveriam ter o dever de detê-los.

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