Bolsonaro e a censura sem fronteiras
Jornalista Eric Nepomuceno, do Jornalistas pela Democracia, critica a persegujição de Jair Bolsonaro contra filmes sobre Chico Buarque e Marighella ou que abordem temática LGBT. "O critério que determina o que é e o que não é pornografía depende exclusivamente do senhor presidente. Ou do que determinem seus alucinados filhos"
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Por Eric Nepomuceno, para o Jornalistas pela Democracia
Diz a Constituição que não há censura no Brasil, e que a liberdade de expressão está assegurada.
Diz Jair Bolsonaro, o ultradireitista que preside este país náufrago, que não existe censura: existem ‘filtros’.
Diz escancaradamente a realidade que a censura voltou, e voltou com força. Inimigo radical da cultura, das artes e da inteligência, o governo de Bolsonaro tornou a censurar drásticamente. E começou pelo cinema.
‘Chico: um artista brasileiro’, documentário do premiado diretor Miguel Faria sobre Chico Buarque, foi convidado a participar de um festival de cinema brasileiro que se realizará por esses dias en Montevidéu. A embaixada do Brasil no Uruguai, uma das patrocinadoras do evento, determinou que o filme fosse eliminado da programação.
Com isso, o governo de Bolsonaro fez sua estréia em uma nova modalidade: a censura além-fronteiras. Se existem os ‘Médicos sem fronteira’, Bolsonaro lançou os ‘Censores sem fronteira’.
A ojeriza do governo com Chico Buarque não tem limites. Quando ele foi contemplado com o prêmio Camões, o mais importante do idioma, por tudo que escreveu ao longo da vida, Bolsonaro explodiu em cólera. Quis saber quem havia indicado os brasileiros que integraram o júri. Não para felicitá-lo, é claro: para exigir a decapitação do então secretário de Cultura, responsável pela indicação.
‘Marighella’, primeiro filme dirigido por Wagner Moura – um dos mais brilhantes atores da sua geração em toda a América Latina – vem sendo recibido com forte impacto em festivais de vários países. No de Berlim, um dos mais importantes do mundo, a história do mítico guerrilheiro foi recibida com fortes aplausos. Em Brasilia, com fortes mostras de fúria.
A data de estréia seria o dia 20 de noviembre. Seria: travas postas pela ANCINE (Agência Nacional de Cinema) suspenderam a estréia, e já não se sabe quando será.
Onze outros filmes, entre documentários e obras de ficção, serão exibidos em festivais importantes ao redor do mundo. A mesma ANCINE havía aprovado cobrir gastos de transporte dos diretores ou produtores. A contribuição mais generosa: uns mil e cem dólares. Outras, menos. Ou seja, pouquíssimo dinheiro.
A pesar da insignificância dos valores anunciados, nos últimos días a ANCINE avisou que os recursos anteriormente aprovados estavam cancelados. O argumento: falta de dinheiro. O total não chegava a treze mil dólares.
Não por coincidência, dois dos filmes tratam de temas homo-afetivos, outro aborda a questão da juventude negra. Um deles, ‘Greta’, tem como protagonista Marco Nanini, um dos maiores atores brasileiros. Não importa: é preciso preservar ‘os valores da família’ defendidos pela família presidencial, que ninguém sabe quais são.
Bolsonaro já havia anunciado que não seriam feitos filmes ‘pornográficos’ com recursos públicos. Foi intensamente aplaudido pelos fundamentalistas que o seguem.
O critério que determina o que é e o que não é pornografía depende exclusivamente do senhor presidente. Ou do que determinem seus alucinados filhos.
Para fazer ainda mais turva a situação do cinema brasileiro – que passa por um período de forte reconochecimnnto internacional –, a ANCINE está praticamente acéfala.
Bolsonaro amenaçou liquidá-la. Se acalmou um pouquinho (se é que ele se acalma alguma hora…) diante do argumento de que o setor emprega milhares de trabalhadores e move milhões de dólares. Não liquidou mas congelou: cortou 43% do orçamento do fundo responsável por financiar a produção audiovisual brasileira, e o que restou ninguém sabe quando aparecerá, nem quais serão os critérios para sua liberação.
Com isso, estão paralisadas practicamente todas as novas produções programadas para rodagem ou finalização. A indústria do cinema, como consequência, ameaça colapsar.
O ministro da Educação, que comete erros de concordância quando fala e de ortografía quando escreve, não pratica censura de forma aberta: optou por suspender em alguns casos, e cancelar em muitíssimos outros, a concessão de bolsas de pesquisa acadêmica. Dedicou atenção especial às destinadas a temas ligados às artes, à cultura e às ciências humanas. E suspendeu, claro, a compra de livros.
Sim, sim, não há censura, o que existem são ‘filtros’. Tremendo cinismo…
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