Bolívia confirma que as rupturas democráticas são golpes
"A direita uniu forças com as polícias e as FFAA, com os meios de comunicação e o Judiciário, para derrubar o governo reeleito legalmente de Evo Morales", escreve o sociólogo Emir Sader. "A Bolívia recorre o caminho brasileiro, da guerra híbrida, do regime de exceção"
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Desde que assumiu sua nova estratégia, a direita latino-americana tentou impor a bandeira de que havia derrotado governos progressistas da América Latina por meios democráticos, através da mobilização popular e cívica da "sociedade civil", contra governos que teriam rompido a Institucionalidade, cometido arbitrariedades e ataques contra a democracia.
Ela o fez no Brasil, derrubando o governo reeleito de Dilma Rousseff, pretextando arranjos orçamentários que não permitem, de acordo com a Constituição Brasileira, promover o impeachment de um presidente da república. A decisão é tão arbitrária e inconstitucional que, até agora, quase quatro anos depois, o STF (Supremo Tribunal Constitucional), a instância mais alta do Judiciário do Brasil, não julgou o impeachment contra a Dilma. Porque se ele abrir a Constituição, não encontrará nenhum apoio à decisão mais séria que um Congresso possa tomar - derrubar um presidente democrático recém-reeleito para o cargo pelo voto popular. Como não encontra fundamento para legitimar o golpe, adia sua posição, como se a passagem do tempo fizesse com que a conivência do Judiciário brasileiro esquecesse o golpe que rompeu com a democracia brasileira e passou o país dos governos mais virtuosos de sua história para o inferno que o país vive atualmente.
A discussão sobre se o impeachment foi um golpe ou não, é absolutamente relevante, pois denuncia que foi uma ruptura da democracia e da Constituição Brasileira ou, pelo contrário, como a direita e seus porta-vozes na mídia querem, uma a correção de caminho, de um ato perfeitamente legal e aceitável, para derrubar um governo que a direita não conseguiu derrotar por meios democráticos, tendo sido derrotada quatro vezes sucessivamente.
Quando a direita derrotou um governo progressista pelas eleições, como aconteceu na Argentina, tendo que respeitar as instituições democráticas, foi abertamente derrotada quatro anos depois. Confirmando que, por meios democráticos, a direita pode até ter sucesso, mas não possui políticas que deem estabilidade e apoio popular a suas políticas neoliberais, imediatamente restabelecidas, quando a direita retorna ao governo. A democracia é incompatível com o neoliberalismo, que condena a direita à derrota, se não recorrer a métodos antidemocráticos.
O caso da Bolívia é, de alguma forma, semelhante ao do Brasil. A direita uniu forças com as polícias e as FFAA, com os meios de comunicação e o Judiciário, para derrubar o governo reeleito legalmente de Evo Morales. Ela alegou ilegalidades eleitorais, mencionadas pela OEA, que rapidamente revelou estar participando do golpe, a ponto de ter proposto novas eleições, aceitas por Evo Morales, mas que abandonou essa proposta, para aderir ao golpe e a governo ditatorial.
A prova definitiva de que esse movimento seria de restauração democrática ou, pelo contrário, de colapso da democracia, seria dada pelas novas eleições convocadas pela presidenta que, sem qualquer legitimidade institucional, assumiu o governo. A repressão aos movimentos populares, a prisão dos líderes do MAS, as condições cada vez mais estreitas em que pretende que as eleições sejam realizadas, em princípio convocadas para maio deste ano, confirmam que foi uma farsa o movimento de mobilização popular e de restauração democrática, como a direita boliviana quis afirmar, sustentada pelo governo dos EUA e seus aliados na região.
A recente proibição da candidatura de Evo Morales ao Senado boliviano apenas confere as condições controladas, antidemocráticas e excludentes em que pretendem realizar as eleições. Segundo a candidatura de Luis Arce, do MAS, assume a liderança nas pesquisas, até a realização dessas eleições é posta em perigo, pois as FFAA bolivianas assumiram espaços decisivos no atual governo e podem impedir as eleições.
A Bolívia recorre o caminho brasileiro, da guerra híbrida, do regime de exceção, e não o argentino, no qual as forças democráticas foram restabelecidas, porque foram mantidas as condições democráticas mínimas para a disputa eleitoral.
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