Banco Central autônomo é dogma do pensamento único neoliberal para alimentar voracidade do mercado

"A autonomia do Banco Central, aprovada em fevereiro de 2021, deu errado", escreve Jeferson Miola

Sede do Banco Central, em Brasília
Sede do Banco Central, em Brasília (Foto: Reuters/Amanda Perobelli)


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A autonomia do Banco Central é um dogma do pensamento único neoliberal; um totem sagrado do capital financeiro.

O debate mundial sobre a autonomia do Banco Central foi encorpado nos anos 1990, no auge da expansão da hegemonia neoliberal e do fim da União Soviética e regimes satélites do leste europeu.

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Foi quando o economista estadunidense Francis Fukuyama “decretou” o fim da história e a chegada da humanidade ao nirvana neoliberal: privatizações, desregulamentação dos mercados, flexibilização do mercado de trabalho e abertura indiscriminada das economias nacionais para a livre penetração dos capitais.

A era da ultra-financeirização do capitalismo triunfara de “forma definitiva” sobre a utopia socialista e anticapitalista.

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There is no alternative” – não há alternativa fora do capitalismo neoliberal – proclamavam os profetas do financismo.

Este ideário era reverberado em uníssono pela mídia hegemônica mundial como receita a ser adotada por todos países. Muitos governos adotaram a autonomia do Banco Central, mas com uma diferença importante em relação à experiência brasileira, na opinião de economistas.

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Diferentemente dos países com Banco Central independente, no Brasil o Banco Central não coordena as decisões sobre juros, dívida e inflação com o governo, pois aqui ele é teleguiado diretamente pelo deus-mercado das finanças.

Em meados dos anos 1990, quando o atual presidente do Banco Central do Brasil Roberto Campos Neto engatinhava na especulação financeira como operador de derivativos de juros e câmbio no Banco Bozano Simonsen, a economista Maria da Conceição Tavares já desnudava duramente este dogma do pensamento único neoliberal.

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“Os congressos do mundo controlam a emissão de títulos da dívida pública. O nosso Banco Central emite dívida por conta do Tesouro sem pedir licença ao orçamento. Isso é um escândalo. O nosso Banco Central é independentíssimo, faz o que lhe dá na telha; na telha. Endivida o Tesouro, sem pedir licença ao Congresso”, disse a brilhante Maria da Conceição em uma edição do programa Roda Viva, da TV Cultura, provavelmente no ano de 1995.

A autonomia do Banco Central para agir por conta própria, sem considerar as diretrizes e o programa eleito pela maioria da população, afronta a democracia.

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A autonomia do Banco Central frauda o sistema de representação popular, pois sequestra a prerrogativa do governo eleito gerir a taxa de juros e o sistema de dívida do país.

É um modelo concebido para alimentar a voracidade incontrolável do rentismo por meio do pagamento de juros estratosféricos. É uma política profundamente prejudicial à economia do Brasil, que paga a taxa de juros reais mais alta do mundo, 8% ao ano.

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Governo que perde a prerrogativa de controlar juros e dívida não governa. Perde a capacidade de governar e se transforma num gerente da escassez orçamentária legada pelo Banco Central, sendo obrigado a cortar despesas e investimentos sociais, ao invés de alavancar investimentos e produzir políticas públicas para desenvolver o país.

Nos dois últimos anos, esta relação binária do Banco Central – de independência do governo, mas de dependência do deus-mercado – significou um aumento de R$ 410 bilhões das despesas do Tesouro Nacional para o pagamento de juros da dívida.

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A autonomia do Banco Central, aprovada em fevereiro de 2021, deu errado. É um modelo fracassado, que provocou um desfalque monumental nas contas do Tesouro Nacional.

Apesar disso, não conseguiu manter a inflação dentro da meta em dois anos consecutivos, devendo repetir o fracasso novamente em 2023.

Com este resultado, o presidente e os diretores do Banco Central preenchem as condições para serem demitidos, como estabelece a Lei Complementar nº 179/2021: “quando apresentarem comprovado e recorrente desempenho insuficiente para o alcance dos objetivos do Banco Central do Brasil”.

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