Autoritarismo de Gabinete ou trocando alhos por bugalhos?

Tema deveria ser debatido democraticamente e não judicializado; porque os cargos de provimento em comissão são aqueles vocacionados para serem ocupados em caráter transitório por pessoa de confiança da autoridade competente, autoridade que pode exonerar ad nutum, isto é, livremente



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Vamos reduzir os comissionados do serviço público?

Todos responderiam afirmativamente à questão, afinal há uma versão tomada por verdade de que há em todas as administrações o uso inadequado dos cargos em comissão.

Assim quando se noticiou em meados do ano passado que o Ministério Público Estadual buscava judicialmente declaração de inconstitucionalidade de lei municipal que regulamenta o tema, bem como a limitação a cem (100) do número de cargos a serem preenchidos por livre disposição do Prefeito de Campinas, houve algum apoio da opinião pública.

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Mas o tema merece reflexão.

Vamos lá. Passado um (1) ano sobreveio decisão do Judiciário que não acolheu o pedido do MP e não julgou inconstitucional nenhuma lei, mas com base em "convicções" estabeleceu critérios para ocupação de cargos comissionados, bem como determinou a exoneração dos ocupantes de determinados cargos comissionados.

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Ora, se a lei que trata do tema não é inconstitucional com base em que o Judiciário "estabeleceu critérios"?

A sentença, contra a qual cabe recurso, é um equívoco (para dizer o mínimo) pois não declara inconstitucional lei municipal, nem indica qual lei a administração teria descumprido; ou seja, o Poder Judiciário precisou fazer uma "ginastica argumentativa" para acolher parcialmente o pedido do Ministério Público e acabou por interferir indevidamente no processo político, no processo legislativo e se apropriando de funções do executivo. É isso que eu penso.

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Por que afirmo que ocorreu interferência indevida no processo político, no processo legislativo e apropriação das funções do executivo? Porque o tema não deveria ter sido provocado pelo Ministério Público, nem resolvido pelo Poder Judiciário, falta a eles interesse e competência respectivamente; o tema deveria ser debatido democraticamente e não judicializado; porque os cargos de provimento em comissão são aqueles vocacionados para serem ocupados em caráter transitório por pessoa de confiança da autoridade competente, autoridade que pode exonerar ad nutum, isto é, livremente.

A cidade de Campinas, com mais de 1 milhão de habitantes, com uma multiplicidade de demandas e questões a serem conhecidas, compreendidas e atendidas necessita da presença dos agentes públicos que transitoriamente ocupam funções e cargos de natureza técnico-politica, pois são eles que aproximam as citadas demandas, os representantes populares, sindicais ou empresariais do Poder Público; eles que, gozando da confiança do chefe do executivo, são capazes de harmonizar tais demandas às políticas públicas em curso ou as em formação.

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Por isso acredito que negar a importância dos que ocupam transitoriamente cargos e funções é ignorar como deve se desenvolver validamente a administração pública.

Mas a Ilustre e respeitável representante do Ministério Público depois de ouvir cidadãos não menos respeitáveis em seu gabinete ajuizou uma ação, denominada de "ação cível pública de improbidade administrativa" contra o prefeito Jonas Donizette com o objetivo de reduzir a 100 o número de cargos em comissão e de declarar que as leis que autorizaram as nomeações combatidas são inconstitucionais e o Judiciário não acolheu o pedido.

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A minha curiosidade é por que 100 e não 50, 25 ou 1000? Quais os critérios utilizados pelo MP?

Bem, o tal processo tramitou pela 1ª Vara da Fazenda e que será reapreciado pelo Tribunal de Justiça; o MP buscou por decisão judicial fossem extintos cargos comissionados, reduzindo-os a 100, mas não obteve seu intento.

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Também por isso minha inquietação segue viva: quais seriam os 100 cargos em comissão não inconstitucionais aos olhos do Ministério Público? E qual o critério usado pelo MP Bandeirante para escolher 100 cargos e não 10, 20, 30 ou 200? Não foi apesentado nenhum estudo técnico que sustentasse o pedido.

E não é só. O sempre criativo MP propôs uma metodologia para as demissões dos comissionados; eles deveriam ser demitidos em um prazo de 12 meses, realmente fico curioso em ler a petição para entender a lógica da proposta. Afinal ou a lei é inconstitucional ou não?

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O que sei é o que a imprensa publicou, por isso de antemão peço desculpas por alguma inconsistência na minha narrativa, mas o fato é que em nome dos princípios da moralidade e da impessoalidade o ministério público de Campinas está buscando usurpar competência do Executivo e do Legislativo. Essa é a minha opinião.

"Trocando alhos por bugalhos". Essa iniciativa do MP em Campinas tem viés autoritário e lembrou uma entrevista do jurista Ives Gandra à jornalista Mônica Bergamo na qual ele afirma que a teoria do domínio do fato foi adotada de forma inédita pelo STF e de forma oportunista; a teoria do domínio do fato conteria segundo ele um ineditismo indesejado e uma insegurança jurídica "monumental", já que permitiria a partir de agora um inocente poder ser condenado com base apenas em presunções e indícios. É mais ou menos a mesma coisa o que o Ministério Público fez, trocou alhos por bugalhos.

Por quê? Ora, o Ministério Público não debateu esse assunto com a sociedade; não ocorreram audiências públicas; nenhuma entidade participou da elaboração de um projeto que buscasse a redução do número de comissionados ou a qualificação das nomeações.

Essa ação, por mais simpática que seja a priori representa exemplo brutal de autoritarismo de gabinete, porque onde não houve participação popular, porque a ideia não emergiu do debate sobre políticas públicas, sobre eficiência e sem debate democrático não há legitimidade.

E que fique claro, não sou daqueles que acham que há indevida interferência na esfera legislativa e no executivo o tempo todo, mas não se pode negar que quando o Poder Judiciário invalida ou dá uma nova interpretação a uma lei, surge uma tensão entre os poderes e que dessa tensão institucional pode surgir um ajuste necessário, quando há democracia, mas quando não há democracia a judicialização prévia do que deveria ser debatido, apenas contribui para a corrosão institucional.

Assim não há nenhuma contradição em, de um lado (i) aceitar a invalidação ou uma nova interpretação de uma lei pelo judiciário e de outro lado (ii) afirmar que é proibido aos integrantes do Poder Judiciário promover inovações no ordenamento normativo como se parlamentares fossem, pois ao Poder Judiciário não é dado o poder de criar normas jurídicas, pois se fosse aceitável o Poder Judiciário criar leis estaríamos ao mesmo tempo negando dois princípios adotados pela constituição brasileira: (a) a separação de poderes, arranjo por meio do qual se busca prevenir o abuso de poder e (b) a democracia, ideal político que almeja institucionalizar um governo do povo.

A fusão desses dois princípios, na prática, confere ao legislativo, e somente a ele, a função de legislar, e aos outros dois poderes o papel de aplicar o Direito.

Ademais, o controle judicial de constitucionalidade é exceção, pois ele permite ao Judiciário a declaração de inadequação de uma lei em relação ao texto constitucional. Mas nem de longe o controle judicial de constitucionalidade dá ao Poder Judiciário o status de colegislador.

O controle judicial de constitucionalidade é prerrogativa necessária em nome da supremacia da constituição, mas a atividade de controle não faz do judiciário um legislador positivo que cria normas, mas apenas um legislador negativo, que se limita a vetar certas normas emanadas do Congresso Nacional, permanecendo assim preservada a integridade da separação de poderes e da democracia.

Querer transformar o Poder Judiciário em colegislador tem viés elitista e aristocrático, pois falta ao poder judiciário: legitimidade jurídica, legitimidade política e competência institucional para criar leis ou executá-las, afinal nem os juízes, nem os promotores foram eleitos pelo voto popular.

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