Ataque à estátua de Ariano Suassuna e a cruzada contra a cultura
Vendo a foto de Ariano Suassuna assim caído, as mãos para trás do escritor me pareceram estar amarradas, algemadas. De fato, na imagem e em outros atos, os bárbaros tentam derrubar a cultura, na escultura, para assim melhor o bolsonarismo andar à solta
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A imprensa nesta segunda-feira divulga a notícia, mas não se dá conta do mal que tem diante dos olhos.
“A estátua do escritor Ariano Suassuna, localizada na Rua da Aurora, área central do Recife, amanheceu depredada e caída após ato de vandalismo.
Em março deste ano, a estátua de Ariano Suassuna teve o nariz quebrado e a de João Cabral de Melo Neto teve o nariz e parte do queixo quebrados, além das placas de identificação pichadas”.
O que as notícias não dizem é que esse vandalismo é sintoma de uma cruzada contra a cultura, um assalto que vem do alto, ou melhor, que vem do mais baixo valor que está na presidência. O desgoverno do Brasil hoje atrai e espalha uma onda contra tudo que representa educação e artes. Nestes dias, não há um só ato bárbaro que não seja inspirado e estimulado pelo bolsonarismo.
Destruir um patrimônio cultural é natural em bárbaros no governo que prevê um corte de 78% na verba destinada à cultura, em nível de orçamento. Mas em nível ideológico a pregação contra valores humanos é feita por todos escalões do seu ministério. Eles aconselham e incendeiam matas e florestas de árvores e de gentes. Alguma dúvida? Alunos filmam professores nas salas de aula para denunciá-los, mulheres são espancadas nas ruas, negros sofrem racismo explícito, público, declarado, lideranças indígenas são mortas. E de tal modo estão à vontade, que não se envergonham de expressões fascistas de baixo calão:
“Atos antidemocráticos são meus ovos na goela de quem inventou isso!”
No conjunto dessa destruição, os vândalos desta segunda-feira podem não saber a dimensão do escritor Ariano Suassuna, que um dia falou em entrevista:
“Considero Canudos o mais importante episódio brasileiro. É quando Brasil urbano e privilegiado se lança contra o arraial popular. Agora, na literatura universal, Dom Quixote foi fundamental na minha vida e obra, porque Cervantes conseguiu expressar, como ninguém, os problemas do ser humano, a partir de circunstâncias locais”.
Esses bárbaros podem não alcançar O Cão sem plumas de João Cabral de Melo Neto, cuja estátua na Rua da Aurora também já foi mutilada:
“A cidade é passada pelo rio
como uma rua
é passada por um cachorro;
uma fruta
por uma espada.
O rio ora lembrava
a língua mansa de um cão,
ora o ventre triste de um cão,
ora o outro rio
de aquoso pano sujo
dos olhos de um cão.
Aquele rio
era como um cão sem plumas.
Nada sabia da chuva azul,
da fonte cor-de-rosa,
da água do copo de água,
da água de cântaro,
dos peixes de água,
da brisa na água....”
Mas essa canalha sabe as razões por que derrubam e depredam valores universais esculpidos em pedra no Recife. Pois como vândalos são bárbaros, que odeiam a cultura. E desse modo cometem atos contra a arte, a ciência e a civilização. Destroem símbolos porque desejam destruir o que representa a história. As trevas em primeiro lugar, o fascismo acima de tudo.
Hoje, vendo a foto de Ariano Suassuna assim caído, as mãos para trás do escritor me pareceram estar amarradas, algemadas. De fato, na imagem e em outros atos, os bárbaros tentam derrubar a cultura, na escultura, para assim melhor o bolsonarismo andar à solta.
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