Assustado, mas não surpreso

Hoje escrevo isso para tentar desabafar e acalmar, pois na escola que leciono, uma ameaça aconteceu e nos assustou. O medo nos assombra, mas não nos surpreende.

Carro da Polícia Científica deixa creche que sofreu atentado em Blumenau, Santa Catarina
Carro da Polícia Científica deixa creche que sofreu atentado em Blumenau, Santa Catarina (Foto: REUTERS/Denner Ovidio)


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Os recentes crimes cometidos em escolas chocam o país. Creches e escolas particulares ganham manchetes nos noticiários. Mas dessa vez, não foram na periferia - quase sempre negligenciada e apagada. Os alvos são escolas de elite, com suas mensalidades estratosféricas, climatizadas com ar condicionado, jardins internos e aparelhada com tudo de melhor que o dinheiro pode comprar, incluindo câmeras para segurança e - nossa vigilância. 

Infelizmente, uma previsão que fizemos há anos, desde o golpe de 2016. 

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Não podemos esquecer que tudo começou com a famigerada proposta da “escola sem partido”, que não apenas afrontou nossa liberdade de cátedra, prevista na Constituição, como foi um passe livre para a caçada aos professores e professoras. Fomos alvos – não que não sejamos mais – de discursos reacionários, infundados e inflados por um pseudo líder que promoveu a desordem e o caos no país.

E sim, prezados pais e mães (nem tão prezados assim!), tudo é política!

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Alertamos que seus discursos e “brincadeiras” fazendo arminha e defendendo o ódio e a política de morte, surtiria efeito na sociedade. Mas, como sempre, fomos rotulados, desacreditados e perseguidos. E hoje a sociedade colhe aquilo que foi plantado.

E, para desespero da classe elitizada, os frutos podres ultrapassaram os muros e cercas eletrificadas de suas escolas, fazendo seus filhos abastados de dinheiro os alvos da vez.

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Poderia dizer que é nossa vingança, mas não somos assim. Por mais que tenhamos sido perseguidos e sofrido durante esses anos de desgoverno, não é de nossa índole desejar o mesmo sofrimento e muito menos morte – muito menos de crianças e jovens que não tem a culpa e o sangue nas mãos que seus pais e mães ajudaram a derramar.

Porém, tenho a certeza que o que estão passando nesses dias, é uma pequena amostra do que nós passamos nesses últimos 6 anos. O medo, a incerteza, a insegurança, a tensão. Sofrimento maior quando os educadores eram esquerdistas e, mesmo que isso não seja crime, éramos tratados como tal. “Criminosos” que acreditam em uma sociedade justa, emancipada, crítica.

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Hoje, são essas famílias, geralmente intituladas “de bem” que são vítimas desse medo. No caso deles, o medo que ajudaram a plantar e disseminar.

As mesmas escolas, pais e mães (ou meros genitores) que nos viam como inimigos, que cerceavam nossa liberdade, que nos perseguiam e vigiavam para intimidar, hoje são reféns dessa sociedade destruída...por eles mesmos.

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Uma falha social que ganhou força com a proibição da educação libertadora (palavras proibidas e associadas à “ameaça comunista” de Paulo Freire). A proibição irracional e reacionária contra a formação de cidadãos e cidadãs empáticos, tolerantes, críticos, que saibam analisar os reais problemas do país e que sejam, acima de tudo, verdadeiramente humanos. Mas não. Isso era – e continua, de certo modo – proibido. Com medo da demissão, e sem o salário espúrio que recebemos perante tamanha demanda de trabalho extra sala de aula e, consequentemente, o receio de não conseguirmos pagar nossas contas, conseguiram nos tornar professores medíocres, repetidores de conteúdo e seguidores de uma educação bancária. Tiraram nossa alma educadora. E os frutos podres se espalharam.

Quanto tempo demoraremos para corrigir esse erro? Não saberia dizer. E, sinceramente, não sei se nós, verdadeiros educadores, teremos saúde mental – ou se estaremos vivos! – para ver essa reorganização.

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Mas como otimista que tento permanecer sendo, espero que as noites que essa gente passará em claro, sem dormir ou com constantes pesadelos que terão pela preocupação com seus filhos e filhas, os faça refletir sobre o erro que cometeram perante a sociedade.

Não espero pedido de desculpas – hipócritas jamais se arrependem porque não admitem qualquer culpa – mas desejo que não vejam mais os educadores e educadoras como inimigos, mas como aliados que estão na linha de frente para combater essa barbárie que causaram.

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Hoje escrevo isso para tentar desabafar e acalmar, pois na escola que leciono, uma ameaça aconteceu e nos assustou. O medo nos assombra, mas não nos surpreende. Hoje escrevo e espero que dias melhores e normais voltem a ser nossa realidade. Hoje escrevo porque amanhã, não sei se estarei aqui para escrever tudo isso que gostaria.

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