As vidas secas dos professores em Alagoas
Essa terra desolada, porém, ainda é fonte do olho grande para o enriquecimento ilícito como demonstra o escândalo das vendas superfaturadas do kit robótica
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Entre os muitos temas que embalam o espírito da “União e Reconstrução” que pauta o governo que emergiu das urnas em outubro do ano passado, um dos mais prementes é o da educação. Seja pelos efeitos devastadores da pandemia no processo ensino-aprendizagem dos mais pobres, seja pela necessidade de se usar seu poder de esclarecimento contra o acirramento do processo excludente, neoliberal e fascista que se instaurou no Brasil a partir de 2016.
Uma das raízes da precariedade para harmonizar o país diante das conquistas que podem advir da educação encontra-se na desvalorização do professor, o principal responsável para essa transformação. O fato de alguns representantes dessa profissão terem embarcado na nau de loucos do último governo, é sinal que sua valorização deve passar não só pela dignidade salarial, mas também pela melhoria de sua formação. Em algum momento é necessário que ele se encontre com esse pensamento visceral do filósofo alemão Theodor Adorno: impedir o retorno da barbárie, nos moldes nazifascistas, é a primeira das exigências da educação. Nesse caso, não precisa viajar para tão longe. Basta estar afinado com a educação libertadora do pernambucano Paulo Freire.
Pegando como exemplo o estado cuja capital teve um rigoroso diretor da Instrução Pública chamado Graciliano Ramos, detecta-se uma prática viciosa que anula os esforços da visão crítica que se espera dos que atuam no magistério: a ausência de concursos e o consequente atrelamento do professor a um cabresto nefasto: o contrato temporário de trabalho. Este é um recurso poderoso que faz a festa de certos ocupantes da administração pública, sobretudo prefeitos e governadores.
Fica muito difícil acreditar que sob esse tipo de atrelamento, aliado às precárias condições de trabalho em escolas que (ainda) parecem abatedouros, possa-se alcançar a esperada educação de qualidade. Como se sabe, esse resultado vai muito além do esforço de se caçar alunos a laço para se entupir salas e assim justificar o recebimento de verbas federais.
Em artigo recente, feito como trabalho de conclusão de curso na Universidade Estadual de Alagoas, Jaciel Manoel da Silva apresentou uma pesquisa sobre o professor contratado. Os dados colhidos por ele demonstram, pegando carona numa imagem cara a Nelson Rodrigues, “uma tragédia em 25 atos”. Com foco na realidade dos quinze municípios da Zona da Mata Alagoana, tem-se um quadro desanimador diante da normalização do contrato temporário entre prefeituras e professores. Estar sob essa condição é ficar distante do piso salarial, anular-se como sujeito, passar a ser visto como um “eleitor em potencial”, além de ser usado nas propagandas das “ações” dos gestores munícipes.
Nesse cenário danificado, ainda há informação que há muitos professores sem graduação ou formação em licenciatura. Os que têm a graduação exigida, conquistada a duras penas, ficam limitados a ela quando se pensa em aperfeiçoamento. A prova disso é não haver, nos municípios contemplados pela pesquisa, um único professor com doutorado. Quanto ao mestrado, somente um com essa titulação em União dos Palmares.
Para mostrar que a reversão desse descalabro só depende da vontade política estão abertas as inscrições para concurso de professores em Caruaru. Já em União dos Palmares, onde trabalho como professor da Universidade Estadual de Alagoas, o último foi há vinte anos! É evidente que esse é um dos fatores que explica por que, a cada ano, aparecem menos interessados para os cursos de licenciatura em Letras e Geografia ali ofertados. Com a chegada da geração Tik Tok, adeus! Essa terra desolada, porém, ainda é fonte do olho grande para o enriquecimento ilícito como demonstra o escândalo das vendas superfaturadas do kit robótica. Infelizmente, a lisura do autor de Vidas secas não se aprende na escola.
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