As razões de Lula
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Foi das decisões mais difíceis da já longa carreira política do ex-presidente Lula. Ele oscilou várias vezes, mas sua preocupação sempre esteve voltada para o governo da presidente Dilma Rousseff e nunca para as acusações sobre ele. Estas entravam em sua linha de raciocínio somente no sentido de saber como seria a circunstância de estar com um pedido de prisão preventiva e ser nomeado ministro.
Na própria viagem anterior a Brasília ficou claro que as preocupações de Lula eram com a situação do governo, tanto no sentido de fortalecer a base de apoio, evitando uma ruptura do PMDB, quanto no de contornar as possibilidades de impeachment. A decisão de aceitar a oferta de Dilma junta vários aspectos.
O primeiro, a necessidade de recompor a capacidade de articulação do governo, especialmente em relação ao PMDB, pelo próprio caráter pendular e decisivo desse partido na balança da relação de forças no Congresso, com as consequências no apoio ou no isolamento do governo. Sem dúvida essa é uma primeira função que ele se propõe a cumprir.
Além disso, a intermediação entre o governo e a esquerda e os movimentos sociais tem sido uma preocupação central de Lula, que chegou a promover a reunião do ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, com lideranças partidárias e sindicais em torno das divergências sobre a política econômica. Certamente ele vai tratar de estabelecer pontes permanentes com esses setores, que até aqui tinham visto suas críticas à política econômica ficarem sem efeito no governo.
Mas além disso, sem atropelar, Lula vai tratar de que a política econômica do governo mude, senão de forma brusca, pelo menos de forma gradual, mas com sinais seguros de que essa mudança se dará. Seria muito difícil para ele estar no governo sem que esse tema, central em suas divergências, seja alterado.
Lula também pode usar suas vias de diálogo com setores do empresariado, que nunca tiveram boas relações com Dilma, ainda mais se houver acenos concretos de que o governo retoma o caminho da recuperação da economia. Junto com o diálogo com o PMDB, foram dois pilares da arquitetura política que Lula tinha montado desde o começo de seu governo e que foram se desfazendo durante o governo Dilma.
Embora com a delicadeza que sua situação impõe, Lula também preencherá em parte o vazio de discurso por parte do governo, seja em relação ao que está fazendo, seja também em relação às dificuldades que enfrenta, sua natureza e como pretende enfrentá-las.
A presença e a ação de Lula permitirão também a limitação das formas de criminalização da política levadas a cabo pela Lava-Jato e que tinham no próprio Lula uma vítima privilegiada. Na interpretação do juiz Sérgio Moro, ele pretenderia praticamente reescrever a história recente do país – numa caricatura do que aconteceu na Europa, para o que ele se proporia a ser uma espécie de Jânio Quadros, se conseguisse fazer carreira eleitoral , desqualificando as realizações dos governos do PT, que teriam se eleito e se reeleito com recursos desviados da Petrobras. Essa ação passa a ficar limitada agora.
Lula se apoia na convicção da maioria da opinião pública, a partir das arbitrariedades cometidas duas vezes contra ele em curto espaço de tempo, de que ele é perseguido e não apenas investigado. Ele reiterará sua disposição de esclarecer todas as acusações no Supremo Tribunal Federal.
As iniciativas do impeachment e de alguma forma de parlamentarismo serão também objeto da ação de articulação política de Lula, porque elas só podem prosperar num processo de ruptura do PMDB com o governo, que será objeto de preocupação prioritária e imediata do Lula.
Por último, a decisão difícil de aceitar participar do governo da parte de Lula vem também da percepção de que as possibilidades de impeachment ou de parlamentarismo, com o desfecho do governo Dilma, não o poupariam, porque a direita tem consciência de sua força popular e se voltaria com todas as suas forças contra o ex-presidente. O seu destino, portanto, mais do que nunca, está atrelado ao destino do governo Dilma.
O resultado de sua incorporação ao governo está ainda por se ver. Mas o ânimo nos setores que o apoiam e o desconcerto na oposição são indicadores de que pelo menos o clima político começa a mudar. O fundamental vai depender da capacidade de articulação política do próprio Lula e, principalmente – e disto ele tem plena consciência – da mudança da política econômica do governo, que possibilite a recuperação da base popular de apoio que elegeu e reelegeu quatro vezes os presidentes do Brasil.
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