As precipitações do PT
"Se o pressuposto é ou deve ser a formação da frente, então o momento não é o de lançamento de candidatos, mas o da definição de métodos e procedimentos comuns entre os partidos para definir um programa", escreve o cientista político Aldo Fornazieri
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A direção do PT parece não ter limites na precipitação e nos erros. O mais grave foi o apoio a Baleia Rossi. Não se tratava apenas de uma canoa furada, mas de uma canoa arrombada. Logo após a decisão de integrar o bloco articulado por Rodrigo Maia, a presidente da legenda, Gleisi Hoffmann, concedeu uma entrevista justificando a decisão com os seguintes argumentos, entre outros: impedir a vitória do candidato de Bolsonaro; vencer no primeiro turno e obter um cargo importante na Mesa da Câmara.
O único ponto que ficou de pé consistiu na obtenção do cargo na Mesa. A tese de derrotar o candidato de Bolsonoro ruiu rapidamente: como o PT buscaria derrotar o candidato de Bolsonoro na Câmara e contribuiria com seu apoio para dar a vitória ao candidato de Bolsonaro no Senado? Para não mostrar tanta inconsistência e para não abrir tanto os flancos, a direção do partido deveria articular melhor sua coerência discursiva ou a sua coerência nas escolhas e nas ações. Não dá para se dizer que se faz uma coisa numa ponta e fazer outra coisa contrária na outra ponta.
A perspectiva de vencer no primeiro turno com Baleia Rossi foi um verdadeiro fiasco, pois Arthur Lira venceu justamente no primeiro tuno por larga margem. A decisão do PT dividiu a bancada. Na votação interna o resultado foi 27 a 23 pró apoio a Baleia. Parte da bancada do PT defendeu apoio a Lira e, alguns parlamentares, ao que se sabe, terminaram votando no candidato vitorioso.
O fisco se aprofundou com o atraso no registro da adesão formal ao bloco e na dissidência vitoriosa de Marília Arraes que recorreu ao plenário da Câmara para derrotar a decisão da bancada e a direção do PT que apoiavam outro deputado. Tudo somado, a direção do PT mostrou que não dirige. Os erros recorrentes fazem com que os próprios filiados e parte dos dirigentes dissintam publicamente das decisões partidárias, assim como eleitores e filiados do partido votaram em candidatos de outros partidos nas eleições municipais. Em suma, o PT tem uma direção que não dirige, que perdeu a fidelidade de militantes, eleitores e filiados e conduz o partido a erros sistemáticos.
Por não estar no comando, por não estar no governo, por estar na defensiva, as esquerdas tinham o dever de apresentar-se com fisionomia própria, como fez o PSOL. Não poderiam escudar-se em uma direita que não tem compromissos com a democracia, que é linha auxiliar de Bolsonaro e que traiu o governo Dilma, abrindo o caminho para a extrema direita. O PT sequer seguiu a máxima de Trotsky: “Marchar separados e golpear juntos”. Na verdade, marchou na retaguarda dessa direita sem convicções e não golpeou nada.
Outra precipitação consistiu no lançamento de Fernando Haddad à candidatura à presidência, na última semana. É certo que o PT tem o direito de ter um candidato e que Haddad tem o direito de ser candidato. O problema é que o anúncio foi extemporâneo e equivocado. Extemporâneo, porque a conjuntura não é a de lançamento de candidatos, mas de lutas contra o governo e de defesa dos interesses do povo, que se encontra abandonado e sem representação.
Trata-se de um erro porque a sinalização é de que o PT vai ter um candidato independentemente da formação da frente popular. Ou seja: se os demais partidos quiserem fazer parte de uma frente, teriam que aderir ao candidato do PT. O PT já tem o candidato e o programa e, Aloísio Mercadante, em sua soberba arrogância, se dispôs a enviá-lo ao Guilherme Boulos. É a mesma arrogância do deputado Reginaldo Lopes que pergunta se Boulos já conhece o programa do PT. Consideram que este programa foi elaborado na sede da sabedoria e que eles são os sábios filósofos-reis platônicos a quem todos devem seguir. Parece que nem mesmo as derrotas conseguem fazer com que alguns petistas pratiquem a virtude da humildade.
Eleições municipais são, em sua natureza, diferentes de eleições presidenciais. Se em eleições municipais os partidos têm o direito de potencializar seus interesses para se organizarem e se fortalecerem, nas eleições presidenciais os interesses que falam mais alto são os interesses do povo e do país. Por onde quer que se olhe, esses interesses indicam a necessidade de se lutar pela formação de uma frente popular, agregando os partidos de esquerda e centro-esquerda.
Se o pressuposto é ou deve ser a formação da frente, então o momento não é o de lançamento de candidatos, mas o da definição de métodos e procedimentos comuns entre os partidos para definir um programa e, como resultado desse processo, a escolha dos nomes que comporão a chapa da frente. Esta deveria ser a lógica e a conduta daqueles que, realmente, querem colocar os interesses do povo e do Brasil acima dos interesses partidários.
Além dessas tarefas tendo em vista a montagem da estratégia para 2022, no ano de 2021 os partidos deveriam priorizar uma série de lutas que estão postas na conjuntura, tais como: Exigência de vacina para toda a população, CPI da Saúde, aprovação da prorrogação do auxilio emergencial, medidas de proteção do emprego e da renda dos trabalhadores, impeachment de Bolsonaro, taxação das grandes fortunas e corte dos privilégios no setor público nos três poderes. Se a reforma tributária for encaminhada, as esquerdas deveriam apresentar uma proposta de uma reforma que estabelecesse a justiça tributária, aliviando os pobres e penalizando os ricos. Deve-se evitar que aconteça o que aconteceu com a reforma da Previdência: sem propostas, as esquerdas não conseguiram mobilizar ninguém.
A exigência da restauração dos direitos políticos de Lula, além de ser uma luta democrática, deve carregar a exigência de uma reforma do Judiciário. O mesmo Judiciário que condena e encarcera Lula, é o Judiciário que condena e encarcera negros e pobres e alivia os ricos, os sonegadores e os corruptos. É em torno dessas lutas principais e de outras que o bloco dos partidos de oposição precisa ser posto nas ruas e nas mobilizações. É em torno dessas lutas que Haddad, Boulos, o PCdoB, o PSB, a Rede, o PDT precisam construir a unidade, pois uma unidade que se constrói sem povo e sem lutas não é unidade.
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