As nuances da democracia e a liberdade de Picciani

Colunista Ricardo Bruno afirma que "a decisão da Assembléia Legislativa do Rio de revogar a prisão do presidente da Casa, Jorge Picciani, e dos deputados Paulo Melo e Edson Albertassi deve ser tomada como uma saudável manifestação de independência dos poderes, própria do estado democrático de direito. A iniciativa é juridicamente perfeita, adequa-se a deliberações recentes do STF e não constitui estímulo à impunidade como apregoam os justiceiros de plantão"; "A democracia não é linear, não permite a preponderância de um poder sobre os demais, não se esgota na possibilidade de punir. Sua beleza é exatamente o estrito respeito aos direitos ainda que isto retarde ou dificulte a correção de distorções ou mesmo a punição para os envolvidos em supostos crimes", diz ele

Jorge Picciani 
Jorge Picciani  (Foto: Ricardo Bruno)


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A decisão da Assembléia Legislativa de revogar a prisão do presidente da Casa, Jorge Picciani, e dos deputados Paulo Melo e Edson Albertassi deve ser tomada como uma saudável manifestação de independência dos poderes, própria do estado democrático de direito. A iniciativa é juridicamente perfeita, adequa-se a deliberações recentes  do STF e não constitui estímulo à impunidade como apregoam os justiceiros de plantão. A democracia não é linear, não permite a preponderância de um poder sobre os demais, não se esgota na possibilidade de punir.  Sua beleza é exatamente o estrito respeito aos direitos ainda que isto retarde ou dificulte a correção de distorções ou mesmo a punição dos envolvidos em supostos crimes.

 O exercício do poder, em regimes democráticos,  tem mecanismos que visam a não permitir o atropelo de regras, a supressão de direitos, a eliminação de etapas intermediárias decisivas para a correta  apuração de denúncias e as consequentes punições. Desconsidera-las, em nome do atual moralismo vigente, seria um perigoso e lamentável passo em direção a quebra do estado  democrático de direito.

Em tempos sombrios como os atuais, acusações passam a ser tomadas como verdade absoluta,  indícios tornam-se provas, delações são tidas como revelações irretocáveis da prática criminosa. Estimulada por setores do Judiciário e parte da imprensa, a cruzada moralista que varre o país é implacável com quem discorda desta pregação quase fanática por condenações sumárias, ao arrepio do processo legal. Estes setores são intérpretes de um pensamento único, monolítico, inquestionável: é necessário punir, cassar, prender, segregar todos os políticos sobre os quais há suspeição. Quem ousar discordar deste axioma da ética vigente é imediatamente tomado como adepto da lassidão moral que fomenta à impunidade. É lançado na vala comum dos deletérios amorais que infestam a sociedade.

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Infelizmente, o Brasil perdeu a capacidade de enxergar pela nuance, longe da torturante e obtusa dicotomia do certo e do errado. O mundo não é monocromático. Há tons e semitons,  cores intermediárias,  variação cromática que nos permite ver além do preto  e do branco. Há, portanto, uma outra posição que não a apresentada pelo Tribunal Regional Federal tampouco a de defesa de qualquer prática criminosa. O moralismo que reduz este reduz este debate a duas possibilidades nos embrutece, nos tira a capacidade de raciocinar com a sutileza de argumentos inteligentes e assertivos.

Longe da tentativa de inocentar os parlamentares, o que se pretende é resguardar o  processo legal.  Picciani, Albertassi e Melo não foram condenados sequer em primeira instância.  Não tiveram  direito de defesa. A eles, não foi concedida a oportunidade de apresentar uma versão diferente da apresentada pelo Ministério Público. As acusações mais relevantes contra os três estão fundamentadas na simples confissão de delatores. A delação, ressalte-se, é ponto de partida para investigações; nunca, nem de longe, uma peça incontrastável de verdade final. A interpretação de crime continuado para justificar a prisão em flagrante é questionável, pois não há fato real e objetivo a respalda-la. A lei não pode moldada pelas circunstâncias, não deve ser adaptada ao momento, para dar resposta à sociedade, enfastiada pelos desmandos e pela corrupção. A lei deve ser apenas cumprida, com  a acepção natural  de seu texto, sem interpretações invertebradas, elásticas,  de seu propósito original.

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Por coerência, o que se aplica a Picciani, vale para Aécio, para o ex-presidente Lula e para todos os outros acusados em casos desta natureza.

Se os deputados favoreceram os empresários de transportes, que as acusações prossigam; que respondam criminalmente, com direito irrestrito de defesa. Ao fim e ao cabo do processo legal, se restar provado culpa e dolo, que sejam condenados. Queimar etapas, abreviar o trâmite, numa condenação sumária é renegar princípios do Estado Democrático de Direito.

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