As manchetes de Gilmar e a saga do julgamento da suspeição de Moro
"Os escandalosos e arbitrários adiamentos do julgamento da suspeição do Moro ofendem a inteligência humana e o pouco que ainda resta de Estado de Direito e de ordem jurídica no Brasil", afirma o jornalista Jeferson Miola. "O STF dispõe de tempo inclusive para dedicar-se a discussões inaceitáveis, mas adia por mais de 2 anos o julgamento sobre a suspeição"
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Por Jeferson Miola
Há mais de 2 anos, em 1º de novembro de 2018 a defesa do Lula impetrou um habeas corpus no STF pedindo a suspeição do ex-juiz Sérgio Moro, a nulidade dos processos julgados por ele contra Lula e a liberdade do ex-presidente, na época ainda preso ilegalmente em Curitiba.
Embora estivessem presentes os elementos substantivos para a concessão imediatíssima do habeas corpus – a idade do Lula, a condição do Lula como preso político, e as provas robustas da atuação parcial e criminosa do Moro –, em 4 de dezembro de 2018 a manchete do site Conjur sinalizou a saga que seria o julgamento da suspeição do Moro: “Gilmar pede vista e 2ª Turma adia julgamento de pedido de liberdade de Lula”.
Alguns dias depois, em 9 de dezembro de 2018, o jornalista Lauro Jardim avisou que “Gilmar Mendes só vai devolver o pedido de habeas corpus de Lula para votação na Segunda Turma do Supremo em 2019”.
Seis meses depois, em 11 de junho de 2019, com as revelações estarrecedoras da Vaza Jato a revista IstoÉ manchetou que “Suspeição de Moro será julgada dia 25, diz Gilmar Mendes”.
Mas eis que, em 24 de junho de 2019, véspera da data prometida por Gilmar, o STF adiou o julgamento com um despacho lacônico: “De ordem, certificamos que o processo foi retirado do calendário de julgamento do dia 25.6.2019”.
Em 17 de setembro de 2019 a manchete do site Conjur anunciou que “2ª Turma do STF deve analisar suspeição de Moro até novembro, diz Gilmar”.
No dia 18 do mês prometido por Gilmar [novembro de 2019] o jornal Valor divulgou nova “ameaça” de que finalmente a justiça seria praticada e, mais alvissareiro, que isso ocorreria ainda em 2019: “Para Gilmar, suspeição de Moro pode ser julgada neste ano”.
O ano de 2019 terminou, porém, sem o julgamento da suspeição do Moro pelo STF, em que pese as inúmeras manchetes do Gilmar Mendes no noticiário “ameaçando” julgar a matéria.
O ministro do STF voltou às manchetes sobre o assunto em 6 de abril de 2020 no jornal Valor: “Gilmar diz que pautará suspeição de Moro assim que STF voltar a se reunir”.
Neste tempo o STF julgou vários processos, menos a suspeição do Moro. Em 25 de junho de 2020 Gilmar fez nova “ameaça” de praticar a justiça e o Direito: “Gilmar Mendes quer julgar suspeição de Moro com Celso de Mello até setembro” [UOL].
Numa variante dos tantos milagres anunciados e nunca concretizados, em 21 de julho de 2020 a revista Veja noticiou que “Gilmar quer sessão presencial no STF para julgar suspeição de Moro”.
Menos de 1 mês depois da “ameaça” anterior, em 5 de agosto de 2020 o site Jota divulgou que “Gilmar deve levar HC de Lula sobre suspeição de Moro a julgamento até novembro”.
Apenas 4 dias depois, em 9 de agosto de 2020 o portal UOL “esclareceu”, entretanto, que “Gilmar quer pautar ‘assim que possível’ processo de suspeição contra Moro” – frise-se: assim que possível!
Completados 2 anos do aniversário do pedido de habeas corpus do Lula sem julgamento pelo STF, em 28 de dezembro de 2020 o Brasil247 noticiou que “Gilmar quer julgar suspeição do Moro em fevereiro” de 2021.
Recém pusemos os pés em 2021 e eis que no dia 11 de janeiro o site Poder360 desfaz a ilusão e noticia que “Suspeição de Moro pode ser julgada no 1º semestre, diz Gilmar Mendes”.
Como este script é por demais manjado, não é difícil imaginar qual será a próxima manchete do Gilmar no noticiário.
Os escandalosos e arbitrários adiamentos do julgamento da suspeição do Moro ofendem a inteligência humana e o pouco que ainda resta de Estado de Direito e de ordem jurídica no Brasil.
O STF dispõe de tempo inclusive para dedicar-se a discussões inaceitáveis, como aquela a respeito da reeleição das presidências do Congresso, que transformaria a Constituição do Brasil em papel higiênico usado; mas adia por mais de 2 anos o julgamento sobre a suspeição do Moro.
O STF precisa responder: por que, afinal, tantos volteios e tantos adiamentos deste julgamento?
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