Ali Babá de uma república presidencialista desviada
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O senhor Arthur Lira não preside a Câmara enquanto um poder institucional do Estado que ajuda o governo a desenvolver economica e socialmente o país. Quer, simplesmente, fazer da presidência da Casa um instrumento institucional para garantir a posição que lhe assegurou, no governo Bolsonaro, o controle da caverna de Ali Babá, através do Centrão, e a que certos parlamentares (seriam apenas 40?) querem ter acesso de forma permanente através do chamado “orçamento secreto”.
O presidente Lula, obrigado pela composição do Congresso a conviver com forças conflitantes, foi obrigado a montar uma estrutura administrativa que, em última instância, não está comprometida com um programa comum. O compromisso básico, que não se restringe, infelizmente, às correntes da oposição, é com os esquemas para desviar dinheiro público através do exercício de emendas parlamentares, uma distorção óbvia do presidencialismo em que vivemos.
O esquema, segundo me foi relatado por um informante que conhece há muito tempo os meandros da construção civil brasileira, funcionou da seguinte forma no governo Bolsonaro. O presidente estava determinado a assegurar sua reeleição a qualquer custo, e para isso precisava do apoio das construtoras. As maiores delas estavam insatisfeitas, já que, sob as luzes negras do neoliberalismo, já não havia grandes obras públicas a serem empreendidas.
O artifício, então, foi cooptar os médios e pequenos empreiteiros. Parlamentares ligados ao Centrão, operado de cima por Lira, aprovavam, mediante arreglos com seus colegas do Congresso, os projetos que seriam aprovados. Lira, mediante “negociação” com o chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira, escolhia, através de licitações fraudadas, os que seriam “oferecidos” a empresários de médio e pequeno porte. Médios que não se interessassem por eles repassavam-nos aos pequenos. Todos recebiam propinas intermediárias.
Tudo funcionou muito bem até que a Polícia Federal descobriu, no Maranhão, uma série de contratos fraudulentos assinados por construtoras de fachada com a Codevasf, a Companhia de Desenvolvimento do Vale do São Francisco. Alguns empresários e intermediários foram presos, e seus nomes noticiados (inclusive por mim, em blogs). A partir de determinado momento, porém, já não se falou mais nisso. Houve a transição de governo, e as dificuldades tremendas do 8 de janeiro.
A esmagadora maioria dos parlamentares do Centrão está envolvida nesse esquema dirigido por Lira. É isso, fundamentalmente, que o tem mantido na presidência da Câmara. E seus poderes de Ali Babá foram as fichas básicas com que tentou jogar também com Lula, já que, sem isso, não teria sido possível ao presidente formar um governo na parte administrativa, nem fazer passar o projeto do “arcabouço fiscal”. Não há, pois, divergências entre Executivo e Legislativo no governo da República. Há divergências ao nível de apropriação do caixa do Tesouro devidas à ação de Lira.
Institucionalmente, o que existe por trás desses esquemas de corruptos e corruptores no país é uma distorção absurda da organização dos poderes da República, que não dividiu claramente as funções do Executivo e do Parlamento. Ao Executivo competiria planejar e fazer obras. Ao Legislativo, aprovar o orçamento e sua execução. Na prática da qual se derivou o Centrão e seus esquemas, o Congresso assumiu funções de planejamento e de execução, através das emendas de parlamentares.
É por isso que o julgamento de Arthur Lira pelo Supremo Tribunal Federal na próxima semana assume um sentido histórico. Se Lira for condenado, e espero que o Supremo aja com rigor, nos livraremos de boa parte da fonte de corrupção no Congresso, já que, sem sua liderança, o Centrão será esvaziado pelo medo de também ele enfrentar a Justiça. Que bom o regime democrático! Pelo menos em tese, os maus podem ser separados dos bons, e os últimos prevalecerão sobre os primeiros.
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