Alguns são mais iguais que outros?

O livro “A Revolução dos Bichos” de George Orwell continua brutalmente atual

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Dinheiro (Foto: José Cruz/Agência Brasil)


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Pedro Benedito Maciel Neto

"Todos os animais são iguais, mas alguns são mais iguais que outros”

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(de George Orwell na “A Revolução dos Bichos")

O livro “A Revolução dos Bichos” de George Orwell continua brutalmente atual, reverberando como um grito de lucidez onde quer que a liberdade e a igualdade estejam sob ataque, quem não leu precisa ler.

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Faço essa introdução para falar da Dona Maria, uma funcionária aqui no escritório, que está afastada do trabalho, recebe auxílio-doença, ela está temporariamente incapaz para o trabalho.

Trata-se de excelente funcionária, que deve aposentar-se por invalidez e receberá pouco mais de 1 salário-mínimo, mesmo tendo trabalhado quarenta e nove anos; ela não é idosa, tem apenas 59 anos, mas trabalha desde os 10 anos, mas está condenada a uma vida de privações. 

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Será que ela não alcançou os méritos necessários? Ao contrário, ela alcançou na sua atividade profissional todo o mérito possível. Paradoxalmente, uma das filhas do diplomata Vinicius de Moraes, a senhora Maria Gurjão de Moraes, recebe, desde os 10 anos, sem trabalhar, um benefício é de 13,7 mil reais por mês e a outra filha de Vinícius, a senhora Georgiana de Moraes recebe outros 13,7 mil reais ao mês desde 1980, mesmo vivendo, comprovadamente, em união estável.

É justo isso? Não, não é.

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O Estadão trouxe matéria que causa indignação e que merece nossa atenção: o pagamento de pensões às filhas solteiras de ex-servidores públicos custa, por ano, 3 bilhões de reais, a meu juízo uma imoralidade, e, a matéria faz referência apenas aos gastos da União.

A Controladoria Geral da União (CGU) identificou 4 mil mulheres pensionistas que recebem o benefício de forma irregular e descobriu que 2,3 mil se casaram ou mantêm união estável e outras 1,7 mil ingressaram no serviço público. 

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A pensão para filhas solteiras de servidores de algumas categorias, como diplomatas, auditores fiscais e desembargadores, foi instituída em 1958; em 1990, o governo deixou de reconhecer novas beneficiárias, mas a pensão continua a ser paga a quem já a recebia. 

Sessenta mil filhas de ex-servidores públicos recebem pensão entre 39 mil e 60 mil reais mensalmente por serem, em tese, solteiras. A dona Maria, nossa funcionária é solteira. 

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As filhas dos parlamentares que morreram até 1990, também têm direito à mesada do governo por essa condição. 

Outra imoralidade está no pagamento da pensão às filhas solteiras de militares, algumas das filhas solteiras de militares recebem até 117 mil reais por mês de pensão. 

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A União gastou 19,3 bilhões para pagar das 226 mil militares aposentados e pensionistas, mais de 100 mil são filha de militares já falecidos – é verdade que o benefício da pensão vitalícia para filhas de militares foi extinto em 2000 para servidores admitidos a partir daquela data, mas quem já integrava o quadro das Forças Armadas pode optar pelo pagamento de um adicional de 1,5% na contribuição previdenciária para manter o privilégio, por conta do que o regime será deficitário até 2080.

Alguns bilhões de reais são destinados ao pagamento de pensões a filhas de algum funcionário público falecido, civil ou militar; são benefícios vitalícios, são privilégios que permanecem intocados em um país que 65 milhões de pessoas recebem até dois salários-mínimos. 

A questão é: por que as filhas de funcionário público falecido, civil ou militar, tem direito a essa pensão e a Dona Maria de Lourdes, nossa funcionária, está condenada a receber pouco mais de um salário-mínimo?

A resposta: porque vivemos um mundo de privilégios construídos ao longo das décadas, que remontam ao império; privilégios mantidos por governos de direita e de esquerda.

Em 2017 o Banco Mundial divulgou um relatório que traz a seguinte informação: entre 53 países pesquisados, o Brasil é o que a apresenta a maior diferença entre o salário de um funcionário público federal e o de um trabalhador da iniciativa privada, ambos com a mesma idade, a mesma formação e a mesma experiência profissional. 

O gasto do país com funcionários públicos, em todas as esferas de governo, era de 13,1% do PIB, muito acima de países como Portugal, França, Austrália e EUA, cujo o gasto é de 9% do PIB; o Chile gasta cerca de 6,4% do PIB. O curioso é que o próprio Banco Mundial reconhece que o quadro do funcionalismo público brasileiro é "enxuto" em relação ao resto do mundo, temos 5,6% da população empregada está no setor público, quanto nos países da OCDE este percentual é de quase 10%.

A conclusão óbvia, portanto, é que o alto gasto com funcionalismo público no Brasil não decorre exatamente de um excessivo número de funcionários público, mas sim dos altos salários, de aposentadorias e pensões imorais, sendo que quem paga a conta somos nós, pois a cada reforma da previdência a aposentadoria fica mais distante.

E, pasmem, no Brasil, considerando todo o funcionalismo público federal, 83% dos funcionários estão no topo da pirâmide da renda, sete em cada dez estão no grupo dos 10% mais ricos do país, ou seja, o governo é concentrador de renda.

Há ainda os vários benefícios - chamados de penduricalhos - atrelados ao cargo, como auxílio-moradia, auxílio-transporte, auxílio-creche, auxílio-educação, auxílio-funeral, auxílio plano de saúde, auxílio-paletó, reembolso por despesas médicas e odontológicas não cobertas pelo plano de saúde, retribuição por acúmulo de funções, bônus de eficiência etc. e tal (só o auxílio-moradia dos juízes federais custava 1 bilhão de reais por ano).

O governo Lula tem o dever de enfrentar essa realidade injusta, que apenas perpetua o “pariato”, um sistema aristocrático que remunera a simples existência de alguns privilegiados.

Os odiáveis privilégios que devem ser extirpados da nossa realidade.

Essas são as reflexões. 

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