Alckmin não ‘orna’ na vice de Lula e não tem sintonia com a galera do Podpah
"É a cara velha e desgastada do tucanato e dos paulistas ricaços. Lula precisa da companhia de sangue novo", escreve Milton Alves
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Nos últimos dias aumentaram os rumores sobre a possibilidade do tucano Geraldo Alckmin integrar a vice-presidência na chapa de Lula para a disputa das eleições presidenciais de 2022. Apesar das negativas públicas da presidenta do Partido dos Trabalhadores (PT), Gleisi Hoffmann, de que não existe ainda uma definição acerca das futuras alianças e acordos eleitorais.
O prato indigesto de Alckmin na vice do petista é oferecido junto com o discurso da governabilidade, da necessidade de ampliação ao centro, e, principalmente, da mensagem de “moderação” e “equilíbrio” que supostamente passa para o eleitor antipetista — e que também teria o efeito mágico de aplacar os temores da classe média abastada e dos especuladores e financistas da Faria Lima.
Além disso, é apresentado o argumento – com um certo tom incisivo, definitivo – que para derrotar Bolsonaro vale a pena marchar com o tucano, que ele é até um sujeito civilizado, abonam os defensores da fórmula Lula-Alckmin. Sugiro que ouçam o que pensam os moradores que foram despejados de forma brutal do Pinheirinho em São José dos Campos ou os professores quase sempre espancados pela PM nas imediações do Palácio Bandeirantes quando reivindicavam melhorias salariais no governo Alckmin-França. E o que dizer dos esquemas de roubalheiras nas obras do Rodoanel, dos nebulosos contratos das Linhas 4 (Amarela) e 5 (Lilás) do Metrô e do superfaturamento na compra de merendas escolares –, objeto de uma CPI na Assembleia Legislativa. E as ligações com os obscurantistas da Opus Dei, um banho de civilização, não é mesmo!
A aposta de setores da esquerda no ex-governador paulista ganhou terreno no interior do PT no curso da discussão da formação das federações partidárias, o que deixou a situação mais complicada e aberta para toda sorte de especulações. Vejamos: o famoso picolé de chuchu lidera as pesquisas para o governo de São Paulo, mas seu atual partido, o PSDB, lançou outro candidato. No momento, Alckmin articula seu ingresso no PSD de Kassab ou no PSB, que tem como pré-candidato Márcio França, um aliado histórico do tucano. Então eis que surge a brilhante fórmula: Alckmin na vice de Lula. Acomoda todos no PSB em São Paulo e, de quebra, endireita a chapa do petista. Bingo! A armação toda nos faz lembrar da célebre máxima de Mané Garrincha: “vem cá, já combinaram a jogada com os russos”.
A questão da indicação de Alckmin ocorre no momento do avanço de Lula em todas as pesquisas eleitorais; em que o presidente Bolsonaro encolhe politicamente, mas demonstra capacidade de reação do governo, aparelhando de forma inédita o orçamento nacional; em que Sergio Moro consolida uma posição de maior vantagem entre os candidatos da chamada terceira via. Neste sentido, a vertente do crescimento eleitoral do líder petista acontece em contraposição ao governo da extrema direita e aos candidatos da velha direita neoliberal.
A polarização, um fator político objetivo, opõe Lula a Bolsonaro e aos golpistas da terceira via, indicando uma tendência de voto do eleitorado, que não suporta mais as agruras da crise econômica e social, como o desemprego de mais de 20 milhões de brasileiros, da volta da fome, da inflação, o fim dos programas sociais e do mal-estar generalizado entre os trabalhadores formais com salários arrochados e ameaçados de demissão. É um voto pela mudança e de rejeição ao atual estado de coisas.
Um nome como o de Geraldo Alckmin (PSDB) não soma eleitoralmente para Lula. Ao contrário, provoca a divisão entre o eleitorado mais progressista, confunde e gera desconfiança nas camadas mais combativas da militância popular e pode contribuir para o surgimento de uma candidatura alternativa entre os partidos de esquerda — notadamente do PSOL. Ou seja, é uma péssima aposta quando precisamos sinalizar para a sociedade que um futuro governo de Lula pretende romper com a desgraçada herança neoliberal.
O PT precisa concentrar mais forças no combate aos nefastos projetos de fim de feira do governo bolsonarista, enfrentar a xepa da entrega das refinarias da Petrobras, a privatização fatiada dos Correios e o desmonte dos serviços públicos. E nesse processo trabalhar na formação de uma frente de esquerda e dos progressistas, com uma clara identidade programática — radicalmente antineoliberal e democrática-popular. Um duplo e necessário movimento político para enfrentar os desafios de uma crise prolongada e de caráter combinado: conjuntural e estrutural.
Apesar de diferenças políticas e de métodos, o conjunto da burguesia e seus representantes políticos abriram mão de qualquer projeto nacional e de integração continental – as classes dominantes sul-americanas enterraram o Mercosul -, favorecendo o pacto de recolonização neoliberal do Brasil, o que resulta objetivamente na transformação do país numa grande plataforma agrário-exportadora, território de exploração mineral e de exportação de produtos industriais semi-acabados de baixa incorporação tecnológica. Uma ameaça estratégica para a soberania do país no contexto de um mundo dividido pelos interesses geopolíticos de agressivos blocos imperialistas.
O futuro governo de Lula, caso ele vença as eleições, terá pela frente o desafio de reconstruir o país e, nos primeiros meses, adotar medidas emergenciais de reversão da fome e da miséria da população. Um governo que será premido pela urgência das demandas.
Vice de Lula, do andar de baixo, do Brasil profundo
Diferente de 2002 quando Lula precisava sinalizar um acordo com as classes dominantes, através da indicação de um veterano capitão de indústria, o mineiro José Alencar, e da assinatura da “Carta aos Brasileiros”, o ex-presidente sofre atualmente um veto aberto dos setores hegemônicos do grande capital, que rejeitam até mesmo um acordo do tipo “ganha-ganha” via manejo do orçamento estatal, e que continuam apostando as suas fichas em Bolsonaro ou, em caso de esvaziamento dele, encontrar um candidato para ser o anti-Lula. Um cenário que apresenta certas semelhanças com as eleições de 1989, que após sucessivas apostas – Afif, Aureliano, Covas – os donos do dinheiro acabaram escolhendo Fernando Collor de Mello — uma espécie de cosplay do combate contra a corrupção. Agora encenam o mesmo enredo com o ex-juiz Sergio Moro.
Uma liderança política para integrar a chapa lulista precisa apresentar as credenciais de identidade orgânica com o andar de baixo e fidelidade ao projeto defendido pelo presidente. Uma candidatura oriunda do protagonismo da luta emergente das vastas periferias do país — de maioria feminina, jovem e negra. Uma candidatura que apresente também uma inegável marca antissistêmica.
A festejada entrevista de Lula ao Podpah, que atingiu milhões de jovens na periferia, rompendo a barreira informativa, não encontra sintonia com a figura política representada por Alckmin, um homem de perfil conservador e que não tem empatia com os anseios da população trabalhadora e com os excluídos. Como se fala comumente em algumas regiões do interior de São Paulo e de Minas Gerais, Alckmin não orna na vice de Lula. É a cara velha e desgastada do tucanato e dos paulistas ricaços. Lula precisa da companhia de sangue novo.
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