Alckmin e a armadilha dos vices

"Recrutados para servir como aliados, nossos vices escreveram uma história política muito mais complicada", escreve Paulo Moreira Leite

Geraldo Alckmin
Geraldo Alckmin (Foto: Reprodução)


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Há uma questão incontornável em torno da indicação de Geraldo Alckmin para candidato a vice-presidente na chapa encabeçada por Luiz Inácio Lula da Silva.

Recrutados para servir como aliados leais, destinados a garantir a estabilidade de um governo eleito e sustentar o titular, nossos vices escreveram uma história política muito mais complicada -- e não é preciso recordar o criminoso papel de Michel Temer para compreender isso.

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Num país onde a classe dominante devota um compreensível receio diante da soberania popular, explicado por uma conhecida dificuldade para exercer o poder de Estado pelas vias consagradas da democracia, o cargo de vice-presidente tem funcionado como a solução de emergência a ser utilizada quando o titular não corresponde às necessidades do andar de cima.

Apontados, formalmente, para ocupar o banco de reservas do cargo número 1 da República, função que pode ser justificada em diversas circunstâncias, frequentemente os vices assumem o papel de cães-de-guarda da velha ordem, assegurando, em caso de necessidade,  que uma eventual substituição do titular, mesmo de modo injusto e truculento,  possa ser processada sem atropelos ou contestações -- ou até com vantagens em comparação com o antecessor.

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Um caso exemplar foi de Café Filho, imposto por Adhemar de Barros na chapa de Getúlio Vargas, em 1950. Na primeira crise grave do governo -- provocada pelo atentado da Rua Tonelero -- Café Filho já mudou de lado e queria convencer Getúlio a renunciar a presidência, comprometendo-se a fazer o mesmo e convocar novas eleições. O presidente nãoi aceitou  mas o vice não desistiu.

Chamado a substituir Getúlio após o suicídio, Café Filho já tinha um novo governo pronto para ser empossado, integrado por conspiradores de primeira ordem para ocupar o ministério e derrubar a herança recebida.
No fim de uma presidência caída do céu, quando uma vitória de Juscelino nas urnas anunciava a continuidade do getulismo, Café Filho integrou-se a uma conspiração destinada a impedir a posse de JK.

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Seu papel foi simular uma doença que lhe permitiu se licenciar do posto e entregar o cargo a Carlos Luz, presidente da Câmara, golpista sem nuances. Quem conhece a história sabe que, no último capítulo, foi preciso contar com a intervenção do Marechal  Henrique Lott para impedir o vexame. Só assim o candidato vitorioso nas urnas foi empossado.

O próprio JK viveu uma situação com semelhanças e diferenças. Como Getúlio, foi alvo de conspirações permanentes para afastá-lo do cargo, até antes da posse.

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Ao contrário de Getulio, JK possuía um vice, João Goulart, que era um puro sangue do trabalhismo. Do ponto de vista dos adversários, tirar JK para dar posse a Jango era igual a trocar seis por meia dúzia -- quem sabe, por uma dúzia.

Embora tenha sido alvo de permanentes iniciativas golpistas, era óbvio que, do ponto de vista de um projeto à direita, seria impensável descartar JK para empossar Jango.

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Os vices têm essa utilidade: oferecem uma saída funcional para um movimento que tem origem golpista mas pode ser chamado de institucional. Tudo parece ter acontecido dentro da lei -- inclusive uma operação vergonhosa como o golpe que derrubou Dilma. Aí reside a armadilha.

Alguma dúvida?

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