Aborto: por que descriminalizar?

Mais do que deixar a hipocrisia de lado, é preciso deixar que o Estado trabalhe como deva trabalhar: em seu estado laico e comprometido com todos e todas. A opção do aborto não deve ser um entrave nos processos democráticos, mas uma ferramenta que permita que a mulher – somente ela! – opte ou não



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Legalizar o aborto é, sem dúvida, um assunto que rende e está envolto por muita controvérsia e desinformação.

Vimos recentemente que nossos vizinhos argentinos legalizaram o aborto, assim como a Coréia do Sul, seguindo tantos outros da Europa, América do Norte e Oceania.

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Antes de mais nada é preciso entender que legalizar significa única e exclusivamente não criminalizar. Ou seja, garante à mãe o direito de abortar se assim desejar. Importante lembrar também que, aquelas que não concordam com esse ato, não serão obrigadas a realizarem – isso serve para quem tem suas ideologias religiosas, por exemplo.

Mas por que é preciso legalizar?

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Em primeiro lugar, porque o Estado brasileiro é laico. Ou seja, deve ter leis que amparem e garantam direitos para todos os cidadãos e cidadãs, independente das crenças religiosas! (Como costumo exemplificar para meus alunos e alunas: imagine que nosso presidente fosse alguém que elaboraria leis sobre sua crença religiosas – por exemplo, um presidente umbandista – e você, enquanto cristão, por exemplo, tivesse que seguir essas leis que não condizem com sua religião. Acha justo isso?)

Além disso, – e não menos importante – porque os abortos seguirão acontecendo clandestinamente. Seja em clínicas altamente equipadas que cobram milhares de reais e assistem à alta classe, ou em locais precários, que se utilizam de agulhas de tricô e materiais inadequados, colocando em risco a vida da gestante.

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De acordo com estimativas da Organização Mundial da Saúde (OMS), entre 2010 e 2014, ocorreram cerca de 55 milhões de abortos, sendo 45% considerados abortos inseguros. Desse montante, 97% concentram-se na África, Ásia e América Latina. De acordo com o Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero (ANIS), 503 mil mulheres entre 18 e 40 anos interromperam gestações em 2015.

Exemplificando essa preocupação, é importante lembrar que, apesar da proibição, uma em cada cinco mulheres brasileiras já realizam um aborto. Além disso, no Brasil, a cada ano 203 mulheres morrem e outras 250.000 são hospitalizadas por complicações em intervenções clandestinas – dados de 2008 a 2015.

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O perfil das mulheres que morrem por aborto, segundo estimativas levantadas em Minas Gerais e que podem ser extrapoladas para o país como um todo, mostram que têm de 20-34 anos, solteiras (68%) e negras (70,5%) – dados que não levaram em conta abortos que não precisaram de internação e que foram realizados em serviço privado.

No Brasil, o aborto é um problema de saúde pública, sendo autorizado em três situações: risco de morte à mãe, gravidez fruto de um estupro e quando o filho(a) gestado é anencéfalo. Assim, quando em um desses caso, o Estado garante acesso ao aborto – novamente, se esse for o desejo da mãe.

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(Paralelamente, é necessário dizer que medidas como educação sexual devem ser trabalhadas, inclusive em salas de aula, sem que com isso educadores sejam taxados de “doutrinadores”. Falar sobre sexualidade abertamente, abordando o respeito, empoderamento feminino e mostrando a importância do uso de preservativos – por sinal, o único método não apenas contraceptivo, mas único na prevenção das infecções sexualmente transmissíveis (IST’s) que infelizmente têm aumentando vertiginosamente na sociedade – é a única maneira de conscientização das pessoas, formando-se uma sociedade crítica e pensante).

A autorização do aborto, no entanto, não será feita de qualquer maneira. Respeita-se o desenvolvimento do embrião e sua capacidade sensitiva, sendo autorizado até, geralmente, a 14ª semana de gravidez, assim como a assistência psicológica às mulheres.

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Como disse, o assunto é complexo, mas necessário de ser discutido – e legalizado. Mais do que deixar a hipocrisia de lado, é preciso deixar que o Estado trabalhe como deva trabalhar: em seu estado laico e comprometido com todos e todas. A opção do aborto não deve ser um entrave nos processos democráticos, mas uma ferramenta que permita que a mulher – somente ela! – opte ou não.

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