A volta por cima do desembargador Favreto, que foi isolado e ameaçado quando tentou conter Moro
Ele assumiu a direção da Escola da Magistratura do TRF-4 e alertou os colegas para não "estimular e emular heróis ou salvadores da pátria", referência a Moro
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Ao tomar posse como diretor da Escola da Magistratura (Emagis) do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), nesta quarta-feira (28), o desembargador Rogério Favreto fez mais um movimento no sentido de virar a página do lavajatismo, que arruinou a credibilidade da Justiça Federal no sul do País.
"Não devemos estimular e emular heróis ou salvadores da pátria, sob pena fragilizarmos ainda mais o Sistema de Justiça, como estamos experimentando pelos recentes devaneios e personificação de alguns agentes, a partir da excessiva exposição midiática e foco em projetos pessoais e políticos", disse, numa referência a Sergio Moro e aos integrantes da força-tarefa da Lava Jato coordenados por Deltan Dallagnol.
Rogério Favreto é desembargador do TRF-4 desde 2011 e, em 2016, foi o único a votar na corte especial pela abertura de um processo administrativo disciplinar contra Moro, por parcialidade na condução dos processos da Lava Jato, em especial naquele que resultou na gravação e divulgação da conversa entre a então presidente da República, Dilma Rousseff, e Lula.
Treze desembargadores rejeitaram o pedido de abertura do PAD e um não compareceu. Para o jurista Pedro Serrano, que atuou nos processos da Lava Jato, aquela decisão do TRF-4 representou o "decreto da ditadura judicial" que o Brasil viveu até recentemente, pois deu a Sergio Moro poderes excepcionais, não previstos na Constituição.
Favreto viveu dias de isolamento no TRF-4, mas manteve a mesma linha de atuação e, em 8 de julho de 2018, experimentou o sabor amargo de ver uma decisão sua não cumprida pela Polícia Federal. É que, naquele dia, ele deu liminar no habeas corpus para libertar Lula, que estava preso em Curitiba. E expediu o alvará de soltura, mas Sérgio Moro, então titular da 13a. Vara, João Pedro Gebran Neto, relator da Lava Jato no TRF-4, e Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, presidente do tribunal, se uniram para impedir o cumprimento da decisão judicial.
Moro estava de férias, Gebran e Thompson Flores Lenz de folga, e quem tinha poder jurisdicional naquele domingo era Favreto. Mas a Superintendência da PF em Curitiba, orientada por Moro, manteve Lula no cárcere enquanto Thompson Flores Lenz buscava uma saída legal. Não encontrou, mas, ainda assim, no início da noite, assinou um despacho para impedir que o alvará de soltura fosse cumprido. Um escândalo judicial, que as instituições, tardiamente, corrigiram.
Favreto teve que responder a uma denúncia criminal da então procuradora-geral da república, Raquel Dodge, arquivada por Luís Roberto Barroso, do STF. O ministro considerou que era legítima a decisão de Favreto. Em outra ação, a corte suprema também considerou Moro um juiz parcial e o foro de Curitiba incompetente para julgar Lula. Decisões tardias porque, em consequência do erro judicial, o Brasil teve quatro anos de um "governo anticonstitucional", para usar as palavras do jurista Alfredo Attié.
A posse de Favreto como diretor da Escola de Magistratura contrasta com a situação dos integrantes do TRF-4 que condenaram Lula e abriram caminho para esse governo anticonstitucional de Jair Bolsonaro. Gebran Neto pediu transferência para uma seção do tribunal em Curitiba, Leandro Paulsen saiu de licença para estudar na Espanha, depois de ser preterido na disputa por uma vaga no Superior Tribunal de Justiça.
Victor Laus, após ser eleito presidente do TRF-4 em 2019, sofreu uma derrota humilhante na própria corte quando tentou ser indicado para o Tribunal Regional Eleitoral (TRE), em 2021. Thompson Flores Lenz teve que prestar depoimento na correição instalada depois que a corte afastou o juiz Eduardo Appio da 13a. Vara Federal em Curitiba, e nos bastidores o que se comenta é que será aposentado.
Em seu discurso nesta quarta-feira, Favreto garantiu que a Escola da Magistratura do TRF-4 seguirá as diretrizes da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento dos Magistrados, para que, "acima de tudo", sejam respeitados "os preceitos basilares da presunção da inocência, ampla defesa, contraditório e paridade de armas, evitando-se pré-condenações que podem destruir pessoas, famílias, profissionais e empresas, antes de um julgamento imparcial e justo."
Como se viu no caso do afastamento de Eduardo Appio, sem direito à defesa, ainda há um longo caminho para o TRF-4 virar a página do lavajatismo. Mas a sociedade de Porto Alegre dá sinais de que quer seguir nessa estrada da Constituição. Em 2019, por iniciativa de uma vereadora de direita, Mônica Leal, Carlos Eduardo Thomson Flores Lenz, recebeu o título de cidadão emérito de Porto Alegre.
Nesta quarta-feira, Favreto, antes de tomar posse como diretor da Escola da Magistratura, recebeu um grupo de vereadores em seu gabinete, que comunicaram que a Câmara Municipal de Porto Alegre lhe entregará o título de cidadão porto-alegrense, por iniciativa do vereador Carlos Roberto Comassetto e da ex-vereadora Margareth Moraes.
"Todos os homens e mulheres são e devem ser contra o crime e a corrupção, mas não é papel do juiz fazer esse combate direto. Isso cumpre aos órgãos de controle do estado e ao Ministério Público. Juiz tem que imparcial e se ater ao direito e os fatos, buscando a melhor decisão judicial, sem se preocupar com o rugir da imprensa ou redes sociais, nem temer em ser contramajoritário", afirmou Favreto em seu discurso de posse.
O desembargador, que esteve ameaçado até de ser afastado, sem ter feito nada de ilegal, prova agora o sabor da vitória, não mais aquele amargo da injustiça.
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