A vitória de Boric e a luta progressista na América Latina

"O povo chileno deu um importante passo na luta contra o neoliberalismo e estimla novas vitórias da esquerda na América Latina", escreve José Reinaldo Carvalho

Gabriel Boric
Gabriel Boric (Foto: Rodrigo Garrido/Reuters)


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Gabriel Boric, o candidato da coalizão "Apruebo Dignidad" (Frente Ampla e Partido Comunista), venceu o pleito presidencial neste domingo (19), com 55,86 por cento dos votos, 11,6 pontos a mais que seu adversário de extrema direita, José Antonio Kast. Foi a maior votação - 4,6 milhões de sufrágios - alcançada por um candidato à Presidência chilena. Outro dado histórico relevante: Boric venceu as eleições com o maior nível de participação da cidadania desde que foi implantado o voto facultativo, em 2012. Um resultado tão incontestável, que antes mesmo de estar matematicamente assegurado, o concorrente declarou que reconhecia a derrota. Um recuo importante, levando-se em conta que poucos dias antes do pleito, Kast bradou que não aceitaria o veredito das urnas caso fosse pequena a diferença a favor de Boric. 

A vitória do candidato das forças de esquerda chilenas foi fruto antes de tudo da nitidez programática e de perfil. Boric foi o candidato de sua formação política, a Frente Ampla, uma coligação de movimentos políticos e sociais de esquerda, e do Partido Comunista. Estas foram as duas forças políticas fundamentais que construíram a vitória. No segundo turno, ele recebeu o apoio de outras forças políticas democráticas de centro e centro-esquerda, que a tempo perceberam a ameaça fascista. 

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Esta nitidez programática, a força originada das massas populares e o perfil de esquerda da candidatura emanaram da rebelião de 2019, quando explodiu a indignação popular, principalmente os trabalhadores, a juventude e as mulheres, em face das políticas neoliberais que têm sido aplicadas no Chile e a ofensiva antissocial do governo direitista de Sebastián Piñera. A evolução política do país e a acumulação eleitoral da esquerda nas eleições presidenciais são tributárias também da eleição da Assembleia Constituinte no ano passado e que se encontra em pleno processo de redação da nova Carta Magna. As razões das ruas e da eleição constituinte foram as mesmas do triunfo eleitoral nas presidenciais. As reivindicações presentes em ambos os episódios ecoaram também na campanha de Boric, em antagonismo com a plataforma de extrema direita do adversário.

A vitória de Gabriel Boric abre uma nova etapa na vida política e social do Chile, cujo povo dá um passo gigantesco para enfrentar os desafios de realizar transformações de fundo, a começar pela superação do neoliberalismo, com uma nova linha política de governo, antagônica à que esteve em vigor até agora. 

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Para a América Latina, o triunfo das forças progressistas chilenas tem enorme impacto. Objetivamente, Boric se somará aos líderes progressistas hoje no poder no México, Argentina, Bolívia, Peru, Honduras e aos governos revolucionários de Cuba, Venezuela e Nicarágua, ainda que com diferenças políticas e ideológicas, na luta pela emancipação nacional e social de nossos povos, pela integração latino-americana e caribenha, enfrentando as forças dominantes internas e o imperialismo estadunidense, que pretende exercer domínio e hegemonia na região. O novo governo chileno poderá ser mais um fator favorável à união dos povos e à acumulação de forças na luta anti-imperialista.

A América Latina e Caribe, como região constituída por países em desenvolvimento, com históricas contradições sociais e situações políticas instáveis, em um mundo em transformação, viveu durante o ano de 2021 situações em que suas populações mostraram resiliência. 

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A região, sempre no alvo da cobiça hegemônica estadunidense, viveu momentos de tensões, com tentativas de golpes, sanções, bloqueios e ameaças de intervenção de guerra híbrida. Até agora, não houve mudanças positivas na política externa dos Estados Unidos.  

Países da região fizeram esforços em 2021 por seu desenvolvimento político progressista. E deram significativos passos para se integrar a projetos de desenvolvimento comum. No plano diplomático o acontecimento mais significativo foi a 6ª Cúpula de Chefes de Estado e de Governo da Comunidade de Estados da América Latina e do Caribe (Celac), realizada em setembro no México, ocasião em que o presidente desta nação, André Manuel Lópes Obrador,  defendeu a criação de novos mecanismos de integração regional. Agora, às vésperas do recesso do final de ano, a Cúpula da Alba também fez valer a voz dos seus países membros em prol da independência. 

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No plano político, países da região viveram importantes momentos em que se defrontaram as tendências para o progresso e o atraso.  A Bolívia enfrentou vitoriosamente mais uma tentativa de divisão do país e retrocesso político. O Peru teve eleições presidenciais, em que venceu o candidato das forças progressistas. Na Nicarágua, o presidente Daniel Ortega foi reeleito, confimando sua liderança e colocando-se à frente da resistência contra as tentativas de deslegitimar suas instituições políticas por parte dos Estados Unidos. Na Venezuela as forças que apoiam o presidente legítimo e constitucional do país, Nicolás Maduro, venceram as eleições regionais, dando mais um passo para a conquista da estabilidade. Esta vitória se estendeu ao plano externo, com o reconhecimento do governo por parte das Nações Unidas. 

Cuba mais uma vez derrotou política e diplomaticamente o bloqueio imposto há seis décadas pelos Estados Unidos, conseguindo a aprovação por esmagadora maioria dos países membros da Assembleia Geral da ONU de uma moção pelo levantamento desse embargo. 

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A eleição de Boric no Chile encerra o ano de 2021 na América Latina com chave de ouro e despertando grandes expectativas não só quanto à realização de mudanças profundas no país, mas também por criar um ambiente propício a novas mudanças em outros países da região. Agora as expectativas se voltam para a Colômbia e o Brasil, onde ocorrerão eleições presidenciais decisivas com polarização entre as forças progressistas e as de extrema direita.  

Assim, as populações dos países da América Latina ingressam no ano de 2022 com expectativas positivas para a conquista de maiores êxitos nos esforços pelo desenvolvimento, o progresso social,  a integração regional e a paz.

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