A virada do Jornal Nacional: ampla cobertura a favor das manifestações e contra a repressão
O jornalista Mauro Lopes escreve sobre a edição do Jornal Nacional desta segunda-feira: “foi um primor de jornalismo”. E pondera: “é bem melhor ter o Jornal Nacional ao nosso lado na batalha contra Bolsonaro do que do lado de lá”.
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Por Mauro Lopes
A edição do Jornal Nacional desta segunda-feira (31) foi um primor de jornalismo. Sim, é preciso que se diga. Caceteamos a Globo -justamente- quando ela esconde o que importa e pratica uma cobertura dos fatos a partir das lentes ideológicas dos Marinho e contra o povo. Mas, contra os fatos, é melhor não brigarmos. Na noite de ontem, houve uma mudança de qualidade.
Vejamos:
- Reportagem de mais de 1 minuto sobre as manifestações do sábado. A cobertura parte da declaração alucinada de Bolsonaro de que teria havido “pouca gente nessa manifestação da esquerda do último fim de semana”. Na sequência, William Bonner contestou a assertiva bolsonariana e afirmou: “Mas na verdade, as manifestações não foram pequenas”. A partir daí, foi um desfile de belas imagens do sábado em várias capitais do país. Bonner, enfático, disse que os protestos “reuniram milhares de pessoas em 26 estados e no Distrito Federal”. E encerrou laudando a mobilização: “As quase 500 mil vítimas da Covid foram homenageadas em camisetas e cartazes”. Ao contrário do que asseguraram muitos intelectuais de esquerda e jornalistas que eram contrários às manifestações, não houve na cobertura da Globo uma palavra sequer sobre “aglomeração da esquerda” ou um ataque ao que seria uma “contradição da esquerda” que critica as aglomerações de Bolsonaro e agora vai às ruas. Nada. A cobertura foi totalmente favorável. Se quiser comprovar, assista aqui.
- Outra reportagem, com mais de 3 minutos, cuidou de colher as repercussões no Congresso. A chamada de Renata Vasconcellos foi significativa: “No meio político, a semana começou sob impacto das manifestações do sábado contra o presidente Bolsonaro”. Foram ouvidos dois parlamentares bolsonaristas e dois da oposição (Randolfe Rodrigues e Humberto Costa). O tom foi claramente amistoso em relação aos protestos. Veja aqui.
- Mas não foi só: outra reportagem, de mais de 4 minutos (um tempo grandioso para os padrões do Jornal Nacional) sobre a repressão da PM à manifestação de Recife. Toda a cobertura foi em defesa do caráter pacífico dos protestos e de denúncia da repressão. O ataque à vereadora Liana Cirne Lins, líder do PT na Câmara de Vereadores da cidade e comentarista na TV 247 foi destaque, com direito a entrevista com ela. Assista aqui.
- Houve mais: uma reportagem de 47 segundos sobre a prisão pela PM em Goiás do professor Arquidones Bites, que tem em seu carro uma faixa com a inscrição “Fora Bolsonaro genocida!”. Foi uma denúncia contra a ação que tentou -sem sucesso- enquadrar o professor na Lei de Segurança Nacional. No fim, algo impensável tempos atrás: Bonner leu a nota da direção estadual do PT sobre a prisão ilegal. Assista aqui.
- Calma: a Globo não aderiu ao socialismo nem abandonou a defesa dos interesses do grande capital. No mesmo Jornal Nacional, uma reportagem em defesa da privatização da Eletrobrás, aqui.
O tom da análise de setores da esquerda sobre a cobertura das mídias conservadoras em geral e da Globo em particular sobre o sábado talvez tenha sido enviesada pelas manchetes das edições impressas de O Globo e de O Estado de S.Paulo.
Como apontou mestre Moisés Mendes num artigo aqui no 247 nesta segunda-feira, as esquerdas precisam deixar de dar importância para algo que é cada dia mais irrelevante, os jornais impressos, e concentrar sua análise nos sites, portais, blogs, redes sociais TVs e rádios e, neles, a cobertura do que aconteceu no sábado. E, nas mídias eletrônicas da imprensa conservadora, anotou, Moisés Mendes, “foram e continuam sendo razoáveis, todos com fotos nas capas e textos informativos e análises”.
Pontifica mestre Mendes: “O que precisa acontecer é uma mudança na cabeça das esquerdas mais veteranas em relação à imprensa das corporações. As esquerdas precisam se livrar do fetiche do jornalão impresso. (...) Os jornais impressos hoje são apenas isso: tradição. São tão relevantes quanto as carruagens”.
Façamos isso: olhemos para o que importa. Por mais que tenha perdido audiência ao longo dos anos, o Jornal Nacional é ainda a mídia de maior repercussão e referência no país.
E o Jornal Nacional mudou nesta segunda. Isso significa uma virada editorial? Veremos. Mas ninguém anda sem dar o primeiro passo.
Cada um interpreta como quiser, mas o fato é esse: mudou;
E eu prefiro ter o Jornal Nacional ao lado das lutas pela democracia e contra Bolsonaro do que do outro lado. Eu sei e nós sabemos, para estabelecer uma relação que não me parece despropositada, o quanto é melhor ter Gilmar Mendes ao nosso lado em algumas batalhas do que tê-lo como inimigo. O mesmo vale para o Jornal Nacional.
Quais as razões para a mudança de Gilmar Mendes e do Jornal Nacional? Aberta a temporada para as interpretações.
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