A Versão Impressa da Realidade

"O antipetismo que alimentou a eleição acabou sendo muito mais cruel e irracional e mesmo aqueles que colocavam o mercado em primeiro lugar acabaram percebendo que eles foram longe demais", escreve Miguel Paiva, do Jornalistas pela Democracia. "Agora, mesmo sem Bolsonaro, temos o bolsonarismo estabelecido"

(Foto: Miguel Paiva)


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Por Miguel Paiva, do Jornalistas pela Democracia

Alguma coisa realmente mudou. Nesses últimos 3 anos vivemos experiências que, se não foram transformadoras, foram detonadoras de vários sonhos, inclusive parte da nossa esperança. Antes da pandemia que criou uma espécie de fim do mundo sem efeitos especiais, o governo Bolsonaro já nos fez mergulhar no poço lamacento da mentira, da perversidade e da total incompreensão histórica. 

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O que está acontecendo com a gente? Não era isso que eu esperava depois de tantos anos onde a evolução acontecia naturalmente, onde regimes democráticos se sucediam ao período ditatorial e os governos populares acabaram estabelecendo as bases do sonho democrático. Mas durou o tempo para o golpe se estabelecer e nos jogar novamente na realidade dura e crua do neoliberalismo sem pudor.

O golpe foi duro até para eles. O antipetismo que alimentou a eleição acabou sendo muito mais cruel e irracional e mesmo aqueles que colocavam o mercado em primeiro lugar acabaram percebendo que eles foram longe demais. Agora, mesmo sem Bolsonaro, temos o bolsonarismo estabelecido. As porteiras da reação foram abertas e aqueles que estavam num silêncio histórico, numa retração das águas que antecede o tsunami, se soltaram, invadiram, alagaram nossas instituições com o que há de pior na face da terra. Mas o que há de pior na face da terra realmente existe, sempre existiu. Caímos numa espécie de versão impressa da realidade. 

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Achar que o ser humano está evoluindo mais do que o próprio tempo estabelece é acreditar demais em Deus. O ser humano comete hoje crimes que já cometia há séculos. É cruel e preconceituoso como já vem sendo há milênios. É destruidor e belicista como sempre foi. A exceção é o desenvolvimento, o bem estar, a justiça social. É uma realidade em alguns países, mas é exceção. 

Mas somos teimosos, apesar da pandemia que nos aprisiona e nos tira o impulso espontâneo da vida, que nos traz medo e nos retrai, agora somos nós, sem a certeza que um tsunami do bem possa acontecer. Tsunamis nunca são do bem e a civilização nunca precisou de rompantes para se desenvolver. O ritmo dela é o ritmo natural da vida. Assim ela se estabelece. Rompantes são necessários para aquilo que se impõe à força. Será que perdemos para sempre a graça de viver? Quando falo para sempre, falo do meu sempre. Já vivi boa parte da vida e boa parte das coisas boas, mas quero mais. Não quero ser freado nem pela pandemia nem pelo Bolsonaro. 

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Quero continuar sonhando com aquilo que consigo alcançar, mas podendo tentar. Sem medo de não poder exercer a democracia e sem medo de não conseguir respirar sem ameaças. Sei que a vida mudou, mas eu também mudei e talvez agora esteja até mais preparado mesmo que com mais medo. Mas vou surpreender este medo não me paralisando. Vou em frente e sei que, como dizia Mário Quintana, “eles passarão e eu, passarinho”.

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