A última máscara do partido militar e o país na porta do inferno
"Ao proteger Pazuello na gravíssima transgressão, o comando do Exército se assume abertamente como Comitê Central do partido militar, e tira a última máscara com a qual mantinham o simulacro do Exército como instituição profissional, legalista e de Estado", escreve o colunista Jeferson Miola
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Nenhuma ilusão; absolutamente nenhuma ilusão é tolerável nesta hora.
A impunidade do general e ex-ministro da Morte Eduardo Pazuello depois de participar de ato de moto-fascistas e subir no palanque político-partidário do Bolsonaro [23/5] não dá lugar a dúvidas: o partido militar abriu as portas do inferno e pode mergulhar o país no caos, na ditadura e na barbárie.
Não temos direito – os civis, democratas e republicanos de esquerda, progressistas, socialistas, conservadores ou liberais – a nos iludirmos e a nos auto-enganarmos a respeito da partidarização das Forças Armadas e do perigoso avanço do projeto de poder militar.
O respaldo do Alto Comando do Exército à decisão do Comandante Paulo Sérgio de Oliveira evidencia coesão institucional em torno da inflexão que marca séria mudança do padrão de intervenção do partido militar na política e nas instituições civis.
Esta inflexão representa a reação mais contundente à conjuntura desfavorável que ameaça a continuidade do seu projeto de poder. Às catástrofes sanitária, econômica, ambiental e humanitária, se somam a perspectiva de vitória eleitoral do Lula em 2022 e a dinâmica de mobilização social vigorosa aberta no último 29 de maio.
Esta inflexão comprova, também, o quão concreta e eficiente, apesar de secreta, foi a atuação oculta do partido militar na gênese do plano que resultou na eleição de Bolsonaro.
É preciso reconhecer, em definitivo, que Bolsonaro é consequência, e não causa, do governo militar instalado no país.
Lançado candidato presidencial para 2018 no pátio da AMAN em 29/11/2014, Bolsonaro é um títere que emprestou popularidade e voto para o “retorno eleitoral” ao poder dos militares originários do porão da ditadura anterior [turmas AMAN anos 1970], dando-lhes a oportunidade de instalarem a almejada “ditadura democraticamente eleita” [sic].
Bolsonaro é apenas uma peça da engrenagem de poder que tem no comando real o partido militar; ele é um “soldado” do partido. O estereótipo de “incendiário incontrolável”, inclusive, é funcional à estratégia diversionista do partido militar, que pode, a qualquer tempo, descartá-lo e substituí-lo por um “bombeiro racional e equilibrado” como o vice Hamilton Mourão.
É equivocado, por isso, insistir-se na tese de que Bolsonaro mais uma vez “dobrou” o Exército, em que pese a encenação do partido militar para aparentar falso distanciamento das Forças Armadas dos desatinos da criatura por eles inventada, da política e da responsabilidade pelo descalabro do governo militar.
É ilusório pensar que o partido militar tenha alguma preocupação com os efeitos da decisão de proteger o general transgressor sobre o respeito das tropas à disciplina e à hierarquia. Eles são irresponsáveis, e escolheram conscientemente este caminho da anarquia, da indisciplina e do tumulto, porque é o caminho que legitima a intervenção deles para “garantir a lei e a ordem”, segundo interpretação cínica que fazem do artigo 142 da Constituição [aqui].
A evolução de governo militar para uma ditadura militar, a essas alturas, é questão menor, de mero detalhe.
É urgente que o poder político, as instituições e a população civil reajam duramente ao militarismo e à atuação ilegal e inconstitucional do partido militar para tentar impedir que o país seja jogado no mais tenebroso inferno, com as Forças Armadas atuando como bando político armado que extermina compatriotas e instala o terror de Estado para concretizar um brutal projeto de saqueio e pilhagem do país.
Ao proteger Pazuello na gravíssima transgressão, o comando do Exército se assume abertamente como Comitê Central do partido militar, e tira a última máscara com a qual mantinham o simulacro do Exército como instituição profissional, legalista e de Estado.
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