A taxa de juros e a pirâmide financeira

Com este andar da carruagem, um dia a casa vai ruir

Roberto Campos Neto (à esq.), presidente do Banco Central, Bolsa de Valores e dinheiro em espécie
Roberto Campos Neto (à esq.), presidente do Banco Central, Bolsa de Valores e dinheiro em espécie (Foto: ABR)


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Pelo que podemos deduzir com a leitura dos noticiários recentes, o atual presidente do Banco Central, que foi indicado para o cargo pelo  anterior governo nazista-bolsonarista, está decidido a manter a taxa de juros no patamar em que se encontra (13,75%) ou, se possível, elevá-la ainda mais.

Muitos andam se perguntando quais as razões que estariam por trás de tal  determinação, uma vez que, no final das contas, a perspectiva é de que as consequências dessa medida venham a ser tremendamente negativas para o conjunto de nosso país.

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Adianto aos leitores que não me incluo entre os que acreditam que o presidente do BC esteja agindo tão somente em função de um plano que visaria inviabilizar a toda custa o novo governo encabeçado por Lula, a despeito dos sérios prejuízos que isso possa acarretar para a nação, inclusive para os grupos socioeconômicos com os quais ele abertamente se identifica. Se ele se mantém incólume em sua atuação, é porque ele deve contar com suficiente sustentação.

Sabemos muito bem que as classes sociais que detêm a hegemonia econômica em nosso país são capazes de demonstrar muita tolerância quando creem que isso é necessário para a preservação de seus interesses maiores. Elas podem até aceitar que o comando político da nação seja entregue a um ser inteiramente desclassificado e bestializado, desde que o dito cujo dê provas de respeitar seus interesses mais sagrados e evidencie uma clara disposição de mantê-los intactos. Em outras palavras, como acabamos de constatar na gestão nazista-bolsonarista, quando um líder político assegura que tem o desejo e condições de manter o poder efetivo do Estado nas mãos de quem sempre o exerceu, ou seja, nas mãos dessas próprias classes dominantes, defeitos menores como grosseria, falta de cultura ou de bons modos podem ser facilmente tolerados.

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Por isso, não me parece crível que essa gente esteja acendendo luz verde, sem esboçar forte reação, para que um de seus funcionários venha a pôr em risco o futuro de seus interesses e de sua hegemonia pelo mero desprezo que sentem pelo governante atual, que se configura como alguém que destoa muitíssimo do padrão que eles gostam de ter nos postos de comando do país. Certamente, eles odeiam Lula e desejam removê-lo da presidência da nação o mais rápido possível. Mas, nem por isso, estariam dispostos a concordar com a destruição de sua base de poder e de sua fonte de riqueza sem que estivessem obtendo nenhuma contrapartida. Portanto, algum ganho eles devem estar recebendo.

Se, como acabamos de dar a entender, não é por mera picuinha que a taxa de juros vem sendo mantida nesses níveis estratosféricos, o que, então, poderia estar motivando a conduta da direção do órgão responsável por defini-la? É o que vou me esforçar para responder à continuação.

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Para que seja possível entender o que pode gerar prosperidade para uma nação, precisamos deixar bem clara a compreensão de que o dinheiro por si só nunca vai ser capaz de criar novas riquezas. O que possibilita o verdadeiro enriquecimento de uma sociedade são as atividades produtivas (de bens ou serviços) desenvolvidas pelos integrantes da mesma. O dinheiro representa o valor da riqueza existente, mas não é ele mesmo essa riqueza. Se dinheiro fosse o mesmo que riqueza, bastaria o governo ir emitindo mais e mais dinheiro para que todos se tornassem ricos. Para que expresse valor real, o dinheiro precisa estar amparado na produção.

Sendo assim, por exemplo, surge uma interrogante quando um empresário precisa definir o que vai fazer com o lucro de R$ 1.000.000,00 que obteve ao final de um exercício de atividades produtivas de sua empresa. A primeira ideia que poderia vir-lhe à mente neste caso seria investi-lo na ampliação das atividades de seu atual negócio ou, talvez, criar um novo. Porém, sabendo que a taxa de lucro estimada para os tipos de produção por ele vislumbradas anda por volta de 10% ao ano, ele a compara com os 13,75% que ganharia se decidisse comprar títulos do tesouro público. Qual das alternativas apresentadas se mostra mais atrativa para esse empresário? Será que ele vai optar por colocar seu dinheiro na produção e, se tudo correr bem, contar com um lucro de 10% sobre o valor investido? Ou, será que ele vai preferir aplicar esses recursos na compra de títulos e, sem precisar se preocupar com mais nada, sair com um resultado 13,75% maior? Dá para adivinhar?

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Se a questão  se limitasse a um caso esporádico e isolado, o problema poderia não ser tão grave. No entanto, o que vai ocorrer é que a maioria dos donos de empresas que desempenham atividades que apresentam taxa de lucro inferior à taxa de remuneração dos títulos públicos também vão tender a se comportar de modo semelhante. E aqueles recursos que serviriam para abrir novos negócios ou expandir os já existentes vão passar a desempenhar uma função meramente especulativa. Os trabalhadores que seriam contratados para exercer as funções relativas à produção dos negócios que seriam criados, ou expandidos, simplesmente, deixariam de ser requeridos.

Mas, o mal não se limita ao que ocorre com o dinheiro a mais que os empresários obtiveram como lucro de suas atividades produtivas anteriores. Na persistência dessa situação em que a taxa de juros seja mais atrativa do que as perspectivas de lucro na produção efetiva, mais e mais empresários retirarão os recursos que investiam em atividades produtivas para transferi-los para a especulação financeira pura e simples.

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A catástrofe para a qual este quadro aponta não é nenhum exercício de terror que visa apenas amedrontar os leitores dotados de mais sensibilidade. Infelizmente, esses são os efeitos concretos que podemos ir constatando em um crescendo cada vez mais acelerado nos países onde o capitalismo de viés neoliberal vai se impondo. Mas, quem ganha com isso se, como já tínhamos indicado, a tendência é que, ao final, as estruturas de tais sociedades desabem?

É aqui que, na prática, desponta a semelhança desse esquema mantido pelos dirigentes nomeados para o Banco Central pelo anterior governo nazista-bolsonarista com as conhecidas pirâmides financeiras, pelas quais muita gente incauta já foi levada à bancarrota.

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Todos sabemos que essas pirâmides provocam desastre e devastação social para a imensa maioria daqueles que decidem nelas participar. Além disso, elas são responsáveis indiretas por grandes sofrimentos que vão afetar muita gente simples que nem sequer sabe de sua existência, mas se tornam vítimas indefesas de seus efeitos colaterais.

Porém, os grandes beneficiados são aqueles especuladores mais espertos e poderosos que montam e dominam as estruturas de funcionamento dessas pirâmides e sabem o momento certo de aplicar seus recursos e de retirar seus vultosos ganhos, deixando para os incautos (a imensa maioria dos outros participantes das pirâmides) o enorme rombo provocado por essa sanha especulativa. É assim que eles se apropriam de fortunas gigantescas, e deixam na ruína aqueles que entraram de gaiatos na brincadeira.

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Analogamente, os grandes especuladores do mercado de títulos públicos vão abocanhando para si parte muito significativa da riqueza nacional. Só que, neste caso, a conta com o prejuízo fica para todo o restante da sociedade. Nessa ciranda financeira, nenhuma nova riqueza é gerada. Mas, há uma acentuada transferência dos recursos existentes para o controle dos poucos espertalhões que dominam o processo.

Assim como os trambiqueiros que organizam as pirâmides financeiras acumulam fortunas gigantescas e deixam na penúria quase todos os que entraram nas fases posteriores, os grandes especuladores que dominam o mercado de títulos públicos vão abocanhando o máximo de recursos para si e lançando a conta para o restante. Só que, neste último caso, quem vai ter de bancar o custo e arcar com o prejuízo do desastre causado pelas elevadas taxas estipuladas pelo BC vai ser a imensa maioria de nossa população.

Um número expressivo de empresários que, no passado, faziam suas fortunas através de atividades produtivas estão hoje dependendo muito mais dos ganhos da especulação financeira do que dos resultados das atividades formalmente associadas a suas empresas. Basta, para exemplificar, tomar o caso da rede Globo, que apresenta em seus balanços prejuízos operacionais que são regiamente compensados com os ganhos da especulação financeira.

Obviamente, com este andar da carruagem, um dia a casa vai ruir. Porém, os grandes capitalistas que hegemonizam nossa economia na atualidade, sejam eles banqueiros, empresários do agronegócio, proprietários de meios de comunicação ou donos de igrejas, entre outros, todos eles estão se locupletando com as altíssimas taxas de juros que o Banco Central vem praticando.

Evidentemente, para as massas trabalhadoras, a independência do Banco Central e a possibilidade de que ele persista com a prática de estabelecer taxas de juros que inviabilizem as atividades produtivas representa um golpe mortal em todos os sentidos. Não apenas por dificultar a aquisição de bens de consumo duráveis por parte dessa população, mas, principalmente, pela diminuição nas oportunidades de trabalho, que redunda em salários mais baixos, retirada de direitos, aumento brutal do número de desempregados e, em consequência, um alastramento da miséria a níveis antes impensados.

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