A questão dos refugiados ucranianos

Os vizinhos da Ucrânia empurram Zelensky a buscar a paz, enquanto milhões de pessoas desalojadas fluem para a Europa

Presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky
Presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky (Foto: REUTERS)


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Originalmente no Substack do autor. Traduzido e adaptado por Rubens Turkienicz com exclusividade para o Brasil 247

No sábado passado o Washington Post publicou uma série de documentos classificados da inteligência estadunidense mostrando que o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky, trabalhando por detrás das costas da Casa Branca de Biden, empurrou com força no início deste ano por uma série expandida de ataques de mísseis dentro da Rússia. Os documentos faziam parte de um lote grande de materiais publicados online por um homem da Força Aérea dos EUA que agora está sob custódia. Um alto funcionário do governo Biden, questionado pelo Post a comentar sobre a recentemente revelada inteligência, disse que Zelensky jamais violou a sua promessa de jamais usar armamentos estadunidenses para atacar alvos dentro da Rússia. Segundo a visão da Casa Branca, Zelensky é inofensivo.

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O desejo de Zelensky de levar a guerra para a Rússia pode não estar claro para o presidente dos EUA e os seus auxiliares de relações exteriores na Casa Branca, porém está para a comunidade estadunidense de inteligência, que tem encontrado dificuldades para fazer ver a sua inteligência e as suas avaliações serem escutadas no Escritório Oval. Neste ínterim, a matança na cidade de Bakhmut continua. Isto é similar em idiotice, se não em números, ao massacre em Verdun e no Somme durante a Primeira Guerra Mundial. Os homens no comando da guerra atual – em Moscou, em Kiev e em Washington – não demonstraram interesse sequer em ter conversações sobre um cessar-fogo temporário que poderia servir como um prelúdio para algo permanente. A conversa agora trata apenas das possibilidades de uma ofensiva no final da primavera ou durante o verão executada por qualquer uma das partes.

Porém, há outra coisa sendo cozinhada, à medida que algumas pessoas na comunidade de inteligência estadunidense sabem e reportaram em segredo sobre a instigação de autoridades governamentais de vários níveis na Polônia, na Hungria, na Lituânia, na Estônia, na Tchecoslováquia e na Letônia. Estes países são todos aliados da Ucrânia e são inimigos declarados de Vladimir Putin.

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Este grupo é liderado pela Polônia, cuja liderança não teme mais o exército russo, porque o seu desempenho na Ucrânia esfarrapou o brilho do seu sucesso em Stalingrado durante a Segunda Guerra Mundial. Eles estão conclamando silenciosamente a Zelensky para encontrar uma maneira de acabar com a guerra – mesmo que seja pela sua renúncia, se necessário – e permitir que o processo de reconstrução da sua nação se inicie. Zelensky não cede, segundo as interceptações e outros dados conhecidos dentro da CIA, mas ele está começando a perder o apoio privado dos seus vizinhos.

Uma das forças impulsionadoras das conversações silenciosas com Zelensky tem sido os mais de cinco milhões de ucranianos que fugiram da guerra e cruzaram as fronteiras do país e se registraram nos seus vizinhos, sob a proteção temporária de um acordo com a União Europeia que inclui direitos de residência, acesso ao mercado de trabalho, habitação, assistência de seguridade social e cuidados médicos. Uma avaliação publicada pelo Alto Comissariado da ONU para Refugiados reporta que a estimativa exclui cerca de 3 milhões de refugiados ucranianos que escaparam da zona de guerra sem um visto para qualquer uma das 27 nações europeias que aboliram o controle de fronteiras entre elas sob o acordo de Schengen. A Ucrânia, apesar de não fazer parte da União Europeia, agora desfruta de todos os benefícios do pacto de Schengen. Algumas poucas nações, exauridas pelos 15 meses de guerra, reintroduziram algumas formas de controles de fronteiras, mas a crise regional de refugiados não será resolvida até que haja um acordo formal de paz.

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O Conselho de Direitos Humanos da ONU (UNHRC – United Nations Human Rights Council) reporta que o livre trânsito da Ucrânia para os estados bálticos e os estados da União Europeia na Europa Ocidental “torna particularmente difícil determinar-se exatamente quantos ucranianos conseguiram entrar na União Europeia nos últimos meses, e onde eles estão agora”. O relatório diz que “uma vasta maioria” dos refugiados ucranianos são mulheres e crianças, e que um terço deles têm idades inferiores a dezoito anos. Setenta e três por cento dos refugiados em idade para trabalhar são mulheres, muitas com crianças.

Uma análise de fevereiro sobre a questão dos refugiados europeus feita pelo Conselho de Relações Exteriores descobriu que "dezenas de bilhões de dólares” em ajuda humanitária foram despejados nos vizinhos da Ucrânia durante o primeiro ano da guerra. “À medida que o conflito adentra o seu segundo ano sem ter um fim à vista”, diz o relatório, “os especialistas se preocupam que os países hospedeiros estão entrando em fadiga”.

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Há algumas semanas eu soube que a comunidade de inteligência estadunidense sabia que algumas autoridades na Europa Ocidental e nos estados bálticos querem que a guerra entre a Ucrânia e a Rússia acabe. Estas autoridades concluíram que está na hora de Zelensky "retroceder" e buscar um acordo. Uma autoridade estadunidense bem informada me contou que alguns dentre as lideranças da Hungria e da Polônia estavam entre aqueles que trabalhavam juntos para conseguir fazer com que a Ucrânia se envolvesse em conversações sérias com Moscou. “A Hungria é um ator importante nisso, bem como a Polônia e a Alemanha, e elas estão trabalhando para fazer Zelensky retroceder”, disse a autoridade estadunidense. Os líderes europeus deixaram claro que “Zelensky pode ficar com o que ele tem” - uma mansão na Itália e interesses em contas bancárias offshore - “se ele trabalhar por um acordo de paz, mesmo se ele tiver que ser pago, caso esta seja a única maneira de se conseguir um acordo”.

A autoridade disse que, até agora, Zelensky rejeitou tal conselho e ignorou ofertas de grandes somas de dinheiro para facilitar o seu retiro para uma propriedade que ele tem na Itália. Não há apoio no governo Biden para qualquer acordo que envolva a partida de Zelensky, e a liderança da França e da Inglaterra estão “demasiado em dívida” com Biden para contemplar tal cenário. Há uma realidade que alguns elementos que a comunidade de inteligência estadunidense não pode ignorar, disse a autoridade, mesmo que a Casa Branca os ignore: “A Ucrânia está chegando ao fim do dinheiro e é sabido que os próximos quatro ou cinco meses são críticos. E os europeus orientais estão falando sobre um acordo”. A autoridade me contou que, para eles, a questão “é como fazer os EUA pararem de apoiar Zelensky”. O apoio da Casa Branca vai além das necessidades da guerra: “Nós estamos pagando todos os fundos de pensão – os artigos 401k – para a Ucrânia”.

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E Zelensky quer mais, disse a autoridade. “Zelensky está nos dizendo que, se vocês querem que ele vença a guerra, vocês têm que me dar mais dinheiro e mais coisas, Ele nos diz, 'Eu tenho que pagar os generais'. Ele está nos dizendo” que, se ele for forçado a renunciar o poder, “ele irá a quem fizer a maior oferta. Ele prefere ir para a Itália do que ficar na Ucrânia e possivelmente ser morto pelo seu próprio povo”.

“Toda esta conversa está sendo reportada e agora está voando dentro da comunidade de inteligência estadunidense; mas, como de costume”, disse a autoridade, “não está claro para a comunidade de inteligência o que o presidente e os seus auxiliares de política externa na Casa Branca conhecem como sendo a realidade” da discussão europeia sobre como encontrar uma maneira para acabar com a guerra. “Nós ainda estamos treinando os ucranianos como voar os F-16s que estão sendo abatidos pela Rússia assim que chegam à zona de guerra. Putin pode ficar onde ele está” - no poder - “apesar do seu fracasso em varrer a Ucrânia do mapa enquanto um estado independente. E ele pensou que venceria a guerra com apenas uma divisão aerotransportada” - uma referência sardônica ao esforço falido da Rússia para ocupar um aeroporto vital nos primeiros dias da guerra com um ataque de uma força de para-quedistas.

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“O problema da Europa”, disse a autoridade, em termos de chegar a um acordo rápido para a guerra, “é que a Casa Branca quer que Zelensky sobreviva, enquanto há outros” - na Rússia e em algumas capitais europeias - “que dizem que Zelensky deve ir embora, não importa como”.

Não está claro que esta compreensão chegou até o Escritório Oval da Casa Branca. Me contaram que a melhor inteligência disponível sobre a guerra não chega até o presidente, não por falta daqueles preparam as frequentemente avaliações em contrário. Diz-se que Biden confia nos briefings e outros materiais preparados por Avril Haines, diretora da Inteligência Nacional, desde que o governo Biden chegou ao poder. Ela passou muito da sua carreira trabalhando para o secretário de estado Anthony Blinken, cujos laços com Biden e a sua concordância com ele sobre questões relativas à Rússia e à China remontam a muitas décadas.

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Me disseram que a única graça salvadora para alguns na comunidade tem sido o diretor da CIA William Burns. Burns foi embaixador dos EUA na Rússia e vice-secretário de estado, e é visto por muitos como alguém que “retrocedeu”, em oposição a algumas loucuras de relações exteriores da Casa Branca. “Ele não quer ser um rato num navio que está afundando”, a autoridade me disse.

Por outro lado, me contaram, não está claro para aqueles na CIA que preparam o Relatório Diário para o presidente que Biden seja um leitor regular dos seus resumos de inteligência. Este documento geralmente tem três páginas. Décadas atrás me contaram – por alguém que me implorou de não escrever sobre isso naquela época – que Ronald Reagan raramente lia o Briefing Diário do Presidente até que Colin Powell, que estava então na Casa Branca, começou a lê-lo num gravador de vídeo. Então, rodavam a fita para o presidente. Não está claro quem, se é que há alguém, que tome a iniciativa de ser o Colin Powell de Biden.

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