A martelada de Tarcísio na cabeça dos paulistas: grupo que levou Rodoanel foi responsável pelo apagão no Amapá
Starboard floresceu no rastro da ruína provocada pela Lava Jato e governo Bolsonaro, e controla empresa que deixou estado inteiro sem energia elétrica
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Ao bater o martelo com violência, no leilão do trecho norte do Rodoanel, o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, parece ter tentado demonstrar virilidade, mas, visto por outro ângulo, o ato não passou da consolidação de covardia administrativa que, em última instância, acertou a cabeça dos usuários de rodovias em São Paulo.
Antes de adentrar nas possíveis irregularidades no processo de escolha de uma empresa para a construção do trecho da rodovia que custará, em princípio, R$ 3,4 bilhões, é preciso registrar que o líder do consórcio que venceu a disputa, a Starboard Partners, controla a empresa de energia que, em 2020, deixou os moradores do Amapá em completa escuridão.
O blecaute no Amapá foi ocasionado por um incêndio em uma subestação da concessionária Linhas do Macapá Transmissora de Energia (LMTE), da Gemini Energia, controlada pela Starboard Partners.
A subestação tinha três transformadores. Um pegou fogo, o outro estava em reparo fazia mais de um ano. O único que sobrou não suportou a carga e, por isso, os moradores do Amapá ficaram na escuridão.
A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) responsabilizou a empresa controlada pela Starboard e aplicou multa de R$ 9,3 milhões, que até alguns meses atrás ainda não tinha sido paga. A Aneel foi procurada nesta tarde, mas até o fechamento deste artigo não tinha respondido.
Na época, o então ministro das Minas e Energia, almirante Bento Albuquerque (sim, aquele das joias), disse que uma investigação poderia levar até à cassação da concessão da Gemini Energia para operar no Amapá, mas nenhuma penalidade foi aplicada.
"É inadmissível e inaceitável o que ocorreu", afirmou, à época, no programa do Datena.
Bento Albuquerque não era desconhecido de um dos sócios da Starboard Partners. Pedro Bianchi é filho de um dos conselheiros do Iate Clube do Rio de Janeiro, cuja diretoria recebeu comenda das mãos do então ministro, em fevereiro de 2022.
Sem punição pelo caso do Amapá, a Starboard Partners, que tem como imagem principal em seu site um barco a vela, aportou em São Paulo, estado que é governado por um ex-colega de Bento Albuquerque no ministério de Jair Bolsonaro.
Para levar a concessão do Rodoanel, a Starboard Partner contou com um empenho poucas vezes visto no governo de São Paulo. O leilão havia sido suspenso na tarde de segunda-feira, por decisão da juíza Simone Gomes Rodrigues Casoretti, da 9a. Vara da Fazenda Pública.
Ela aceitou os argumentos da Associação Brasileira de Usuários de Rodovias Sob Concessão (Usuvias), que reclamavam da falta de transparência e atropelo por parte do governo do Estado.
O trecho norte do Rodoanel foi planejado para ser construído na modalidade convencional de licitação. O estado arcaria com os custos e depois cobraria pedágio de R$ 3,80, de acordo com edital lançado em 2021.
No ano seguinte, a gestão de João Doria e depois a de Rodrigo Garcia alteraram o modelo de construção para parceria público-privada, e o pedágio foi elevado para R$ 6,50. Em nenhum dos casos, o governo apresentou planilha de custos para justificar o preço, segundo o advogado Edison Araújo da Silva, que é diretor-executivo da Usuvias.
"Com a PPP, o governo do Estado colocará dinheiro do contribuinte na obra, e mesmo assim o pedágio sobe. Não há explicação", disse Araújo da Silva ao 247.
"A legislação estadual e a federal determinam que, antes de um edital de PPP, é preciso realizar audiência pública, para que o povo tenha oportunidade de se manifestar. O governo anterior, de Rodrigo Garcia, e o atual, de Tarcísio de Freitas, passaram por cima das normas legais e não realizaram nenhuma audiência pública", acrescentou.
A decisão da juíza Simone Casoretti vigeu durante algumas horas. À meia noite e meia desta terça-feira (14/03), horas antes do leilão, o presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, Ricardo Mair Anafe, cassou a decisão, mas não fechou a porta. Até porque não podia. "Vamos recorrer", afirmou Araújo da Silva.
A Starboard Partners se estabeleceu no Brasil em 2015, e aproveitou as oportunidades de negócios que surgiram com a ruína empresarial provocada pela Lava Jato.
Assumiu o espólio da Ricardo Eletro e também obteve concessão para explorar poços de petróleo colocados à venda pela Petrobras na administração de Pedro Parente.
Com o bolsonarista Tarcísio de Freitas à frente do Estado mais rico da federação, a empresa amplia seus negócios. O consórcio que a Starboard lidera poderá cobrar pedágio na rodovia durante 31 anos, a partir de 2026, ano de eleição e prazo fixado para o término da obra.
Resta saber se os paulistas terão a mesma infelicidade dos brasileiros do Amapá, e sofrerão um apagão rodoviário.
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