A inconfundível “fala suave” dos EUA na política mundial

A Ilha de Formosa (Taiwan) e a Ucrânia colocam os EUA em posição de conflito direto com os seus dois maiores inimigos (China e Rússia)

(Foto: Reuters)


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José Álvaro de Lima Cardoso

Dois dos lugares mais “quentes” do mundo, neste momento, são a Ilha de Formosa (Taiwan) e a Ucrânia, que colocam os EUA em posição de conflito direto com os seus dois maiores inimigos (China e Rússia). No dia 17 de dezembro a Rússia divulgou um documento preliminar, do que seria um acordo que pretende firmar com os EUA para pôr fim à crise da Ucrânia. Basicamente quer que os EUA se comprometam a “impedir uma maior expansão para o leste da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) e a negar a adesão à aliança aos estados da antiga União das Repúblicas Socialistas Soviéticas”. Para cumprir o acordo, a Otan teria que sair da Estônia, Letônia e Lituânia. Pelo documento apresentado por Putin, seria também vetada a possível entrada da Ucrânia na Otan. Além disso, a Rússia também solicita a devolução, aos respectivos territórios (Rússia e EUA), de armas nucleares já posicionadas em outros países. 

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O governo da Ucrânia alega que mais de 90 mil soldados russos já estão concentrados na fronteira e teme uma invasão do país. Mas outras fontes informam que as tropas russas estão a cerca de 150 km da fronteira, e, conforme o governo russo, as operações visam exclusivamente a autodefesa do país. O risco de a situação piorar é muito elevado, dificilmente o entrevero irá se resolver sem confronto. Um dos dois lados teria que ceder, mas essa possibilidade não parece estar colocada. Essa é uma das situações mais críticas na região, nas últimas décadas, o que deixa todas as possibilidades de desfecho, em aberto. 

A crise mostra também que o governo de Joe Biden é uma grande ameaça para a conjuntura internacional, trazendo permanentemente o risco de guerra, em várias partes do mundo. Desde as primeiras entrevistas de Biden, já na condição de presidente, ficava clara essa tendência da política de Biden de acirrar as relações entre as potências. Vale lembrar que o presidente dos Estados Unidos, em março deste ano, utilizou uma entrevista ao canal ABC News, dos EUA, para chamar Putin de assassino. Provocado pelo apresentador, Biden respondeu afirmativamente à indagação de que Putin seria um assassino. A linha adotada por Biden nessa e em outras manifestações, já indicavam o tom que teria a diplomacia norte-americana neste governo. Mas o certo é que, desde as eleições, Biden falava recorrentemente em recuperar terreno em relação à Rússia e China, no referente a vários aspectos, especialmente o geopolítico.

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O agravamento da situação política na Ucrânia decorre principalmente do comportamento agressivo dos países imperialistas, especialmente dos EUA.  Os países imperialistas europeus, como Inglaterra, Alemanha e França, com nuances, no geral apoiam a política do império estadunidense na região. A Ucrânia, que é um país independente, poderia fazer parte da Rússia, como gostam de lembrar os analistas internacionais independentes. Mas é um país que sem dúvida faz parte do cordão de defesa do território russo, e é estratégico para a Rússia de muitos pontos de vista, incluindo o da segurança. 

Apesar dos alertas do governo da Ucrânia, não parece que a Rússia esteja disposta a invadir o país. Putin tem procurado abrir diálogos com os demais países imperialistas, no sentido de evitar um agravamento da crise, que pode descambar para uma guerra na Região, envolvendo as principais potências. Os EUA têm uma postura bastante agressiva na Ucrânia. Segundo o governo da Rússia, em novembro, as forças armadas dos EUA ensaiaram um ataque nuclear contra a Rússia com bombardeiros vindos de duas direções, no início daquele mês. O governo russo tem acusado os EUA e a Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte) em geral, de manter um comportamento provocador, destacando o fornecimento de armas para a Ucrânia, e também de realizar exercícios militares perto da fronteira russa, a menos de 20 KM. O governo russo denunciou, inclusive, que os EUA fizeram simulação de um ataque nuclear, no começo de novembro.

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No dia 15 de dezembro, numa iniciativa do enxadrista Vladimir Putin, a Rússia aprovou na Assembleia Geral da ONU, a resolução «Combater a glorificação do Nazismo, Neonazismo e outras práticas que contribuem para alimentar formas contemporâneas de racismo, discriminação racial, xenofobia e intolerância relacionada». Foram 130 votos a favor, dois votos contra (EUA e Ucrânia) e 51 abstenções (incluindo a de Portugal, de todos os estados-membros da União Europeia e outros aliados dos EUA, como o Reino Unido). A resolução visa impedir construções de monumentos e memoriais, bem como a celebração de manifestações públicas em nome da glorificação do passado nazi, do movimento nazi e do neonazismo. Moscou denuncia que são frequentes a profanação e demolição de monumentos construídos em memória dos que combateram o nazismo na Segunda Guerra Mundial. Essas iniciativas têm o apoio, tácito ou explícito, do governo da Ucrânia. 

O governo Biden tem que ficar muito atento para evitar novas derrotas. A que amargou no Afeganistão neste ano, país conhecido como “cemitério dos impérios”, foi simplesmente acachapante. O Talibã impôs uma derrota ao exército mais poderoso do mundo, superior à que os EUA experimentaram em Saigon, há quase meio século atrás. Apesar das tentativas de disfarçar a gravidade do acontecimento, os EUA saíram escorraçados do Afeganistão, por um grupo de combatentes inferiorizados militarmente, tecnicamente e financeiramente. A derrota dos EUA para o exército Talibã, que dispunha de armamentos infinitamente inferiores aos dos EUA, só tem uma explicação: a população apoiou a guerrilha. 

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Com Biden, os norte-americanos deverão promover uma série de conflitos militares no mundo, “por procuração” com outros grupos, tropas irregulares como fizeram na Síria e em outros países. O objetivo é estimular a oposição interna para depois, apoiado pela OTAN, partir para agressões militares. Provocação à Rússia, China, Venezuela e Nicarágua, é esse o ambiente que deve prevalecer nos próximos anos. Joe Biden foi o candidato da máquina de guerra norte-americana: Pentágono, falcões, CIA e demais serviços de espionagem, forças armadas, grande capital imperialista, etc. Ou seja, a fina flor da política imperialista apoiou Biden. Trump presidente, comparado com Biden, foi um “estranho no ninho”, acusado, inclusive, de aproximação com a Rússia.

O padrão de vida conquistado pelos norte-americanos está relacionado, em parte, à sua ação imperialista no mundo todo. Então, ao mesmo tempo em que eles têm que se preocupar com a disputa geopolítica com a Rússia, estão de olho, por exemplo, no tabuleiro político latino americano. Não é nada específico contra a Rússia ou China. É que atuam como um Império que são, e aqueles são seus principais rivais. Se quisermos entender a natureza da “democracia” nos países imperialistas, precisamos saber que o orçamento militar dos EUA para o ano que vem, de US$ 768 bilhões, é superior aos orçamentos militares somados dos 10 países seguintes com os maiores orçamentos.

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Os Estados Unidos, além de suas frotas de porta-aviões, navios e submarinos nucleares que cruzam os mares de todo o mundo, possuem mais de 700 bases militares terrestres fora de seu território nacional nos mais diversos países. Eles conseguiram essas bases através de tratados e do peso da economia norte-americana, do imperialismo norte-americano. Russos e chineses não têm esse poderio. Uma das razões dos EUA terem encaminhado o golpe no Brasil foi a aproximação com a Rússia e a China através dos BRICS. Em 2015, antes do impeachment, o Brasil tinha assinado com a China 35 grandes projetos de infraestrutura no país, incluindo a Ferrovia Transoceânica, ligando o Atlântico ao Pacífico, ligando o Brasil (RJ) à Lima, no Peru.

A democracia norte-americana funciona segundo aquele princípio sintetizado por Roosevelt: “Fale suavemente e carregue um porrete grande” (Theodore Roosevelt, Presidente dos Estados Unidos, 1901-1909). A situação na América do Sul, por exemplo, é muito frágil porque não tem nenhuma potência com capacidade nuclear. Por outro lado, nenhum país tem uma aliança estratégica do ponto de vista militar, com Rússia ou China. Tudo isso torna a situação do subcontinente extremamente vulnerável.

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Um sintoma de que a política do “grande porrete” funciona nas relações internacionais, foi o quase sepulcral silêncio da China e da Rússia, em relação ao golpe no Brasil, assim como nos demais países da América do Sul. A China perdeu uma porção de negócios na América Latina toda, por causa dos golpes, mas não se manifestou mais fortemente.  Os norte-americanos querem obrigar Rússia e China a recuarem das posições geopolíticas que eles adquiriram no último período. Eles vão procurar fazer com que os russos e os chineses gradativamente cedam terreno, tanto do ponto de vista militar como do ponto de vista econômico. Essa postura tende a acirrar muito as relações entre as potências, no próximo período.

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