“A ficção meritocrática”

A meritocracia funciona como um “tapa olhos” que inibe que se enxergue o contexto e a sociedade como produtoras coletivas do que poderia haver de melhor em nós

(Foto: Divulgação)


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Por Roberto Moraes

O sentimento da meritocracia é inimigo da solidariedade e irmão da soberba e da vaidade. A meritocracia funciona como um “tapa olhos” que inibe que se enxergue o contexto e a sociedade como produtoras coletivas do que poderia haver de melhor em nós humanos. Ao inverso, a meritocracia realça o maniqueísmo entre poucos vencedores e a maioria de perdedores que se sentem sobrantes de uma sociedade globalizada e cada vez mais desigual.

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O resultado disso tem sido o ódio, o ressentimento e a apartação violenta produzida pelo aumento das desigualdades e pelo individualismo com abandono da solidariedade como alternativa para as fases de colapso de nossos ciclos de vida individuais que poderiam ser compensados pelas fases de bonança de outros. Fora daí o que resta é o fascismo da superioridade étnica, racial e de títulos, pior que a barbárie, porque os bárbaros nunca foram assim, tão bárbaros.

Essa síntese surge da leitura de “A ficção meritocrática: executivos brasileiros e o novo capitalismo” (2022, 244 p.), livro e pesquisa organizados pelo professor Fabricio Maciel, junto com um ótimo grupo de pesquisadores. Devorei em dois dias a excelente publicação.

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O livro oferece elementos empíricos e teóricos interessantes para compreendermos a sociedade produzida pelo capitalismo contemporâneo e seus agentes.

Estudar os executivos e gerentes é jogar luz sobre a origem e o percurso destes agentes, de certa forma escamoteados, que operam na alta e média direção das empresas e corporações que hoje atuam, cada vez mais sob a lógica do "capitalismo da gestão de ativos" e o controle das gestoras dos fundos financeiros. E também, em boa parte, daquilo que tenho chamado de "plataformismo", como etapa contemporânea do Modo de Produção Capitalista. 

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A publicação nos ajuda a conhecer e começar a compreender o perfil, origem e "habitus" dos executivos que operam os ativos reais e financeiros do capitalismo contemporâneo. O livro faz uma análise empírica sobre a construção e naturalização do falso e individualista discurso da meritocracia que tenta expor o novo capitalismo flexível (Sennet) é estruturada em três eixos: origem social e familiar (habitus de classe), estilo de vida e o posicionamento político dos brasileiros.

É uma pesquisa e uma análise bastante rica, potente e que fortalece os argumentos teóricos de um conjunto de importantes autores do campo da sociologia como Pierre Boudier, Richard Sennet, Boltanski e Chiapello, Eric Fromm, Jessé de Souza, Wright Mills, Michael Sandel e o próprio Fabrício Maciel da UFF/UENF. 

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A coletânea editada e publicada em e-book pela editora da Universidade Estadual do Norte Fluminense (edUENF) tem capítulos do organizador Fabricio Maciel e ainda dos pesquisadores: Carine Passos, Gabriel Duarte, Carolina Zetterman e Kimberly Gutierrez.

Parabéns a todos pesquisadores pela belíssima publicação que nos oferecem e que merece ser lida e aprofundada, bem para além da academia, por tudo que nos oferece para uma compreensão mais ampla da sociedade desigual em que vivemos e sobre o papel, a tirania e o totalitarismo que representa essa “ficção tecnocrática” sobre a maioria da população.

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Neste link acesse o PDF do livro na íntegra (e-book).

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