A exposição de Lula e a direção política

"A avaliação não é boa, mas também não é desesperadora", diz Fornazieri sobre pesquisa Datafolha que mede a popularidade do governo Lula

Presidente Luiz Inácio Lula da Silva
Presidente Luiz Inácio Lula da Silva (Foto: REUTERS/Adriano Machado)


✅ Receba as notícias do Brasil 247 e da TV 247 no canal do Brasil 247 e na comunidade 247 no WhatsApp.

A avaliação do governo divulgada pelo Datafolha no final de semana – 38% de bom e ótimo, 30% de regular, 29% de ruim ou péssimo – não difere significativamente da pesquisa do IPEC, divulgada anteriormente. A conclusão é a mesma: a avaliação não é boa, mas também não é desesperadora. As duas pesquisas mostram ainda que os parâmetros da divisão da sociedade apresentados na disputa eleitoral se alteraram pouco. Bolsonaro permanece com significativo capital político e eleitoral. Tudo isto não significa que não haja espaço para o governo crescer em termos de avaliação positiva e de que Lula não possa desequilibrar o jogo político a seu favor. 

Mas existem problemas. O primeiro é o de comunicação, tanto de Lula e do governo, quanto do PT. Há um consenso, inclusive entre analistas e comentaristas de esquerda, de que Lula errou ao se referir a Moro em duas ocasiões, principalmente naquela em que lançou suspeita de armação do ex-juiz envolvendo o suposto plano do PCC contra ele. É certo que tudo o que vem de Moro é suspeito pelo seu histórico de arbitrariedades e de violações. Mas se alguma suspeita existia/existe, não cabia a Lula revela-la, abrindo espaço para o contra-ataque de Moro. 

continua após o anúncio

Outro erro de Lula, e nisso ele foi acompanhado pela presidente do PT, consistiu em pessoalizar os ataques ao presidente do Banco Central. A crítica aos juros altos podia ser feita sem levar o embate para o lado pessoal. Quer dizer: o estatuto de Lula como chefe da principal magistratura política do país não permite que ele meça armas verbais com pessoas como Moro e o presidente do BC. Lula ocupa uma posição política e hierárquica superior, o que não lhe permite medir-se com pessoas que ocupam posições políticas e hierárquicas inferiores em termos de embates pessoais. Isto significa que Lula não pode colocar-se, em qualquer circunstância, numa posição de status inferior à sua função e àquela que ele ocupa na espacialidade do poder político.

Lula deveria preservar-se mais também nas agendas físicas presenciais. É certo que é importante que o governante esteja com o povo, para ouvi-lo e ver de perto suas aflições. Mas Lula já é um líder reputado junto ao povo. Assim, deveria ser mais seletivo nas suas agendas populares e públicas, privilegiando as mais significativas, aquelas que se revestem de grande importância simbólicas e as que emprestam sentido de grandeza à sua presença. 

continua após o anúncio

Nas regras discursivas do mundo antigo já havia a preocupação acerca do que dizer, como dizer, quando dizer e em que ambiente dizer. Esta preocupação prudencial é ainda mais importante na era da comunicação digital, quando o discurso tem repercussão imediata e amplificada de forma incontrolável. O sujeito do discurso deve pressupor as possíveis consequências do que diz. Quando não há o devido cálculo do risco, é comum que um discurso produza efeitos contrários daqueles que o sujeito pretende. 

O governo também se comunica mal, principalmente em função de iniciativas e decisões equivocadas de ministros e demonstração de falta de unidade interna. Neste ponto se destacam decisões precipitadas de Carlos Lupi e de Marcio França e os posicionamentos de Rui Costa e de Gleisi Hoffmann em relação às definições da política fiscal. Não que não possam existir divergências internas. Mas o governo precisa mostrar unidade, principalmente neste momento de instabilidade política e de tendência de crescimento de conflitos. A presidente do PT não pode ser imputada como a líder da oposição. 

continua após o anúncio

Mas há um problema mais de fundo: os relatórios de análise de redes mostram que há algumas semanas o bolsonarismo vem derrotando os campos democráticos e de esquerda no Facebook, no Instagram e no Youtube. O ponto fora da curva foi o anúncio das diretrizes do arcabouço fiscal pelo ministro Haddad, que conseguiu reverter a sequência de derrotas. 

Na última semana de março, Sérgio Moro pontificou nas interações bolsonaristas. Em regra, o governo e o campo democrático e progressista estão fornecendo as munições para que a extrema-direita ataque. Mas há que se notar que o campo governo/esquerda não tem uma estratégia mais centralizada de produção de conteúdos e nem dispõe de centros fortes de mediação e de disseminação desses conteúdos. A extrema-direita, ao contrário, tem potentes centros de mediação e disseminação, a exemplo dos perfis de Carla Zambelli, Jovem Pan News, Jair Bolsonaro, entre outros. 

continua após o anúncio

Um dos principais problemas de comunicação do governo consiste em que ele não consegue gerar confiança para além dos setores mais fidelizados. Isto se deve a duas questões: a campanha de Lula e esse início de governo construíram sua fantasia no passado. Toda fantasia concreta (estratégia) deve orientar-se para o futuro. Os governos do passado de Lula deveriam ter servido apenas como exemplos e referências de valores para fundamentar um novo governo de caráter inovador. Usando a analogia do novo príncipe: todo novo governo deve comportar-se pelas regras do novo príncipe, da inovação política, mesmo que o governante já tenha governado no passado. Ao não seguir as regras do novo príncipe, em certo sentido, o governo já parece velho.

Mas a falta de geração de confiança se deve ao fato de que o governo demorou muito em dizer o que vai fazer com a economia. Somente no dia 30 de março, depois de três meses, o governo apresentou o primeiro esboço do que pretende fazer, com a apresentação de Haddad. 

continua após o anúncio

Essa demora decorre de um erro de cálculo: Lula deveria ter indicado os ministros da Fazenda e da Casa Civil logo após de ter confirmado sua vitória. Deveria ter autorizado o ministro da Fazenda a constituir sua equipe para definir os eixos centrais da política econômica, visando apresentá-la no início do governo. Já o ministro da Casa Civil deveria ter montado toda a estrutura e funcionalidade do governo. 

Para que a economia volte a se expandir e crescer, para que retornem os investimentos e a geração de empregos, os agentes econômicos precisam ter um horizonte de estabilidade e previsibilidade e o governo precisa gerar confiança. As incertezas e a falta de confiança adiam a tomada de decisões. E, até por isso, os ruídos e as críticas internas, as palavras duvidosas, as sinalizações ambivalentes e os apoios tíbios aumentam as incertezas e postergam as decisões de governo. O governo, no seu corpo interno e a sua base política mais fiel, precisa de uma condução política forte e unificante.

continua após o anúncio

Sem essa condução, além de gerar incertezas na economia, provoca uma dispersão e uma frouxidão de apoios daqueles setores políticos menos comprometidos. Por isso, a capacidade de condução política interna e de sua base fiel é condição para que o governo consiga imprimir uma direção política de sua base mais ampla no Congresso e de gerar confiança na sociedade e nos agentes econômicos. É preciso acelerar e explicitar o programa de condução da economia. O programa de condução econômica será o centro de gravidade do governo, o fator que decidirá o seu sucesso ou seu fracasso. Os erros de comunicação decorrem também da falta de clareza no que fazer.

continua após o anúncio

iBest: 247 é o melhor canal de política do Brasil no voto popular

Assine o 247, apoie por Pix, inscreva-se na TV 247, no canal Cortes 247 e assista:

Este artigo não representa a opinião do Brasil 247 e é de responsabilidade do colunista.

Comentários

Os comentários aqui postados expressam a opinião dos seus autores, responsáveis por seu teor, e não do 247

continua após o anúncio

Ao vivo na TV 247

Cortes 247