A direita faz o que sabe fazer: golpe da Bolívia
"Desde a tentativa de golpe contra Hugo Chavez em 2002, os golpes não foram mais admitidos na região (com a exceção do Brasil). Derrotada nas urnas e sentindo-se sem condições de concorrer a novas eleições contra Evo, a direita fez o que sabe fazer: deu um golpe", diz o sociólogo Emir Sader sobre o retrocesso democrático no país andino
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Na Argentina a esquerda perdeu, voltou a disputar democraticamente as eleições e voltou a ganhar. No Brasil, Lula teve reconhecidos seus direitos e se reincorpora a luta democrática contra um governo eleito por manobras antidemocráticas. No Uruguai, a Frente Ampla luta com todas suas forças para manter seu governo. No Chile o povo luta democraticamente pelo direito a ter uma constituição democrática. Lopez Obrador, depois de várias derrotas, triunfou e exerce democraticamente seu governo.
Na Bolívia, a direita questionou o resultado eleitoral, com o apoio da OEA, que ficou de fazer a recontagem dos votos, com a aceitação do governo de que esse resultante seria o resultado oficial. De repente, de forma sincronizada, a própria OEA propôs novas eleições, com novo Tribunal Eleitoral. Evo aceitou a proposta e convocou novas eleições e anunciou que haveria um novo Tribunal Eleitoral.
Mas a direita tinha se radicalizado, tinha escolhido o caminho do golpe. Mesa foi ofuscado pela ofensiva da extrema direita, de Santa Cruz de la Sierra, com novo dirigente, que propôs a renuncia do Evo. A isso se somaram ações violentas, sem as quais o golpe não teria sido possível. Policiais de alguns estados se rebelaram contra o governo do Evo, enquanto ataques corretos contra a casa de governadores, de ministros, do presidente da Câmara de Deputados e da irmã do Evo. Aqueles renunciaram a seus cargos, objetivo conseguido pelas ações paramilitares. Até que as FFAA, que tinham afirmado que não reprimiriam o povo, terminara pressionando Evo, para que ele renunciasse.
Para frear a ofensiva violenta da direita, Evo apresentou sua renúncia, assim como seu vice-presidente, Alvaro Garcia Linera, como forma de defender as vítimas das agressões. Se consolidou assim mais um golpe militar na Bolívia. Um país que, antes do governo do Evo, era o campeão de golpes militares no continente. Sua elite branca resistiu quanto pôde ao governo de maior sucesso na história do país, presidido justamente por um dirigente indígena.
Não interessa as histórias que vão contar. No Brasil também argumentaram que o Jango abandonou o governo, mas o fez frente a um levantamento militar contra seu governo. Na Bolívia também se trata de um golpe, que rompe com a mais longa continuidade democrática da história boliviana, desde que Evo ganhou a primeira eleição, em 2005. A renúncia do Evo se dá sob a pressão militar e a renúncia da polícia a coibir as ações violentas a oposição. Interrompe-se um governo reeleito pela grande maioria dos bolivianos e que teria mandato até janeiro de 2020.
O que faz então a OEA, quando sua proposta foi aceita pelo governo, mas não pela oposição, nem pelas FFAA? A OEA atuava supostamente preocupada com a transparência da democracia boliviana. Como vai agir agora? Vai denunciar o golpe e impor sanções como fez com a Honduras e com o Paraguai (embora não fizesse, covardemente com o golpe no Brasil)?
Desde a tentativa de golpe contra Hugo Chavez em 2002, os golpes não foram mais admitidos na região (com a exceção do Brasil). Derrotada nas urnas e sentindo-se sem condições de concorrer a novas eleições contra Evo, a direita fez o que sabe fazer: deu um golpe.
A primeira década deste século foi dominada por governos progressistas, todos eleitos e reeleitos democraticamente. A segunda década esteve marca pela contraofensiva conservadora, que restaurou o modelo neoliberal na Argentina, no Brasil, no Equador, no primeiro caso através de eleições, nos outros, de golpes. A esquerda soube resistir os retrocessos do governo Macri, se fortalecer e triunfar. No Brasil, Lula resistiu à sua prisão injusta e saiu da prisão para comandar a luta democrática no país. Na Bolívia e no Uruguai se disputa a terceira década do século.
O futuro do continente volta a estar aberto. Argentina e México se tornam os eixos da reconstrução do eixo progressista. O Brasil se torna o cenário decisivo para o futuro do continente e o Lula o ator fundamental para o que passe no Brasil e na América Latina.
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