A burguesia resolveu brincar de Bela Adormecida

"Sem o menor constrangimento, nossos banqueiros, empresários, respectivos cônjuges e herdeiros já cunharam a expressão do momento", escreve Paulo Moreira Leite

Jair Bolsonaro e Manifesto pela Democracia
Jair Bolsonaro e Manifesto pela Democracia (Foto: REUTERS/Carla Carniel | Reprodução)


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Por Paulo Moreira Leite

"Os brasileiros acordaram", dizem, numa referência ao ambiente nacional de revolta contra Bolsonaro e ao bolsonarismo, que marca a conjuntura política de 2022. 

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A sugestão é que após quatro anos de sono profundo, os 212 milhões de brasileiros recuperaram a consciência. Basta recordar alguns fatos básicos de nossa história para lembrar quem dormia e quem estava acordado na eleição de 2018.

Em dezembro de 2017, véspera da campanha eleitoral, uma pesquisa Ipsos informava que Bolsonaro tinha 21% de aprovação nas pesquisas. Marina Silva tinha 20% e Geraldo Alckmin, 19%. Mesmo perseguido pela Lava Jato de Deltan Dallagnol e Sérgio Moro, Lula seguia o favorito absoluto. 

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Suas intenções de voto eram mais que o dobro do ex-capitão: 45% de aprovação, em tendência de alta, conforme registrou o Estado de S. Paulo (20/12/2017). Nem era preciso estar muito desperto para imaginar qual teria sido o resultado provável das urnas de 2018.   

Sem a menor disposição para reconhecer a primazia da vontade popular numa decisão fundamental da República, nossa classe dominante acionou o cadafalso do STF e consumou um golpe judicial escancarado. Simples assim: a candidatura Lula foi degolada por 6 a 5, numa operação que ignorou uma cláusula essencial do direito de defesa, o trânsito em julgado para o cumprimento de sentença penal condenatória. 

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A operação Bela Adormecida não parou aí. Em agosto de 2018, Lula encontrava-se preso em Curitiba, quando uma decisão do Conselho de Direitos Humanos da ONU não só reconheceu seu direito de participar da eleição mas determinou que ele fosse autorizado a disputar o pleito. 

Apenas o sono profundo de nossa classe dominante explica o que ocorreu: formou-se um pacto de silêncio entre adversários de Lula no Judiciário, no Congresso e, especialmente, entre concorrentes à presidência, e a decisão acabou acabou ignorada por anos a fio (em abril de 2022, quando as fraturas e doenças do bolsonarismo já não podiam ser escamoteadas, a ONU voltou ao caso e concluiu que Lula fora vítima de um julgamento parcial e injusto). 

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Antes da campanha de 2018 chegar ao fim, Lula ainda foi atacado em sua liberdade de expressão. O STF lhe negou o direito a dar entrevistas, prerrogativa que a legislação brasileira confere a todo prisioneiro -- inclusive homicidas e sequestradores --contribuindo, novamente, a dar um respiro a Bolsonaro. As cenas seguintes mostraram quem estava desperto, para fazer o quê.

Quem não ajudou Bolsonaro, fez o possível para atrapalhar Lula -- o que era mais ou menos a mesma coisa. Enquanto Ciro Gomes lavou as mãos e foi a Paris, na reta final do primeiro turno, Fernando Henrique Cardoso ajudou Bolsonaro sem sair de casa. Não só divulgou uma declaração condenando o que chamou de "radicalismos", o que lhe permitia fazer pose  numa neutralidade conveniente ao bolsonarismo e desmobilizar eleitores que poderiam dar um voto útil para Haddad. 

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Numa exigência que fez Paulo Guedes sorrir de satisfação, FHC cobrou um compromisso pelo "ajuste inadiável de contas publicas", exigência que faz parte da bíblia do neoliberalismo.  Fernando Henrique não descansou. Em nova medida em benefício do inominável, disse que o fato de Bolsonaro "ter como principal opositor quem representa um líder preso por acusação de corrupção mostra a que ponto chegamos".  Pois é. 

Quatro anos depois, é preciso encarar os fatos, inclusive os desagradáveis. Com um mínimo de honestidade intelectual, não é difícil reconhecer quem esteve acordado e quem simulou dormir em berço esplêndido ao longo de um período terrível de nossa história -- e agora quer reescrever a fábula da Bela Adormecida. 

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