72 horas depois

Três dias após a divulgação das conversas entre Procuradores da República da Força-Tarefa da Operação Lava Jato e o ex-juiz e atual Ministro da Justiça, Sérgio Moro, ainda predominam incertezas e controvérsias. Mesmo assim, balanços parciais já podem ser traçados. Esta é a ousadia deste artigo: esboçar seis dimensões do episódio

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Três dias após a divulgação das conversas entre Procuradores da República da Força-Tarefa da Operação Lava Jato e o ex-juiz e atual Ministro da Justiça, Sérgio Moro, ainda predominam incertezas e controvérsias. Mesmo assim, balanços parciais já podem ser traçados. Esta é a ousadia deste artigo: esboçar seis dimensões do episódio.

Primeiro, ao que é certo.

Os envolvidos nas conversas não negaram a autenticidade de seu conteúdo. Em três manifestações distintas, não houve questionamento à veracidade das conversas.

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Em um primeiro momento, na própria página institucional do Ministério Público Federal, alegou-se que os agentes públicos foram vítimas de criminosos (hackers que teriam invadido seus dispositivos e copiado seus conteúdos). Em um segundo momento, o Ministro da Justiça, em sua conta do Twitter, procurou relativizar a importância das mensagens, dizendo não haver ali qualquer anormalidade. Na terceira reação substancial, Deltan Dallagnol publicou vídeo em sua rede social, no qual, para além dos argumentos anteriores, exaltou os feitos da Operação Lava Jato, com números e elogios.

Segundo, ao que é preocupante.

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O conteúdo das conversas é extremamente grave. Se comprovadas verdadeiras, as relações entre o Procurador e o Juiz podem colocar em xeque a imprescindível imparcialidade do magistrado (e, também, do membro do Ministério Público Federal). Em consequência, podem ser anulados determinados processos da operação, essencialmente aqueles mencionados nas conversas.

Ainda que as conversas tenham sido interceptadas ilegalmente, uma prova ilícita pode ser usada em benefício do acusado, sempre que se afigure como um meio imprescindível à demonstração de sua inocência.

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Terceiro, ao que é corriqueiro e ao que é problemático.

De fato, não há qualquer problema na comunicação entre juízes, promotores e advogados em um processo. Seja de forma presencial ou por outros meios, a comunicação é uma necessidade premente da justiça, inclusive como modo de economizar o tempo das partes envolvidas na relação processual. Portanto, a troca de mensagens entre as partes jamais foi o problema.

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O que de fato levanta sérias questões é o seu conteúdo. O que ali se observa, aparentemente, é um possível direcionamento dos rumos de determinadas investigações pelo magistrado que irá julgar a causa. E tal situação, se comprovada, certamente foge radicalmente à normalidade e, potencialmente, até mesmo da licitude.

Quarto, o direito de defesa das autoridades.

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O que ainda não se sabe é se as conversas, denotam, de fato um direcionamento espúrio de investigações oficiais pela autoridade judicante. As partes envolvidas não foram ouvidas previamente nas matérias (conforme ressalva feita pelos próprios autores) e ainda não prestaram explicações aos órgãos competentes. Se tiradas de seu encadeamento, como já alegado, os agentes públicos deverão ter a oportunidade de contextualizá-las, exercendo seu direito de defesa de forma ampla.

De toda sorte, frente ao que foi divulgado na Parte 5 da matéria, com transcrições completas das conversas vazadas, fica cada vez mais claro o contexto em que estão mergulhadas as conversas, confirmando-se as "teorias de desvirtuamento".

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Também não se sabe se, de fato, as conversas foram obtidas de maneira ilegal, por meio de uma invasão de dispositivo informático. Não se pode descartar a hipótese de entrega das informações aos jornalistas por pessoas que tiveram o material sob sua guarda. A teoria do "fogo amigo" não pode ser descartada, enquanto não examinados os dispositivos nos quais eram mantidas as indigitadas conversas. Não obstante, a hipótese do ataque virtual é ainda há mais propagada, até por seu suporte da narrativa de que a Lavajato estaria sob ataque.

Quinto, ao que ainda poderá ser revelado.

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Deixamos, aqui, o plano das certezas e passamos a caminhar no terreno enevoado das irresoluções.

Não se sabe ainda o que mais pode vir à tona nos próximos dias e qual será o impacto para a sociedade e para o mercado a partir dessas revelações.

A percepção dessas revelações pela opinião pública estabelecerá os rumos da política e da economia, à curto e longo prazo. Já existe, em curso, a guerra das narrativas.

Sexto, às apostas para o futuro.

Há a possibilidade de a teoria da normalidade prosperar e as revelações das conversas não causarem substancial consternação. Nessa hipótese, o Ministro da Justiça poderia, ainda que fustigado, manter-se em seu cargo.

A segunda hipótese é a teoria da instabilidade. O terremoto poderia afetar não apenas o Ministério da Justiça. Os danos atingiriam o Governo Federal como um todo. Neste caso, a turbulência comprometeria as agendas no Legislativo, entre elas o "Pacote Anticrime" e, substancialmente, a reforma da previdência.

Por fim, emerge cada vez mais sólida a possibilidade de alguns processos conduzidos pela Operação Lava Jato serem anulados no âmbito das Cortes Superiores, o que poderá trazer ao centro político alguns players afastados da arena em virtude da atuação da própria operação. Vale destacar, em especial, o ex-Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva, agora fortalecido pela confirmação de tudo quanto alegou em sua defesa nos últimos anos.

Com o agravante de uma prisão que se estende indevidamente – pois antecipada para antes do trânsito em julgado - por mais de um ano.

Todas essas possibilidades - queda ou desgaste profundo de Moro, volta de Lula, atraso na reforma da previdência - ainda são bastante incertas, mas poderão se delinear com maior precisão nos próximos dias, a depender das novas revelações e da reação a elas. E certamente terão influência decisiva no mercado.

A conferir. De preferência embalados com o som da histórica canção de Cazuza: "saiba que ainda estão rolando os dados, porque o tempo, o tempo não para".

Marco Aurélio de Carvalho. Especialista em Direito Notarial e de Registro. Sócio da CM Advogados. Integrante-fundador da Associação Brasileira de Juristas para a Democracia e do Grupo Prerrogativas

Bruno Salles Pereira Ribeiro. Mestre em Direito pela USP e sócio de Cavalcanti, Sion e Salles Advogados. Membro do Grupo Prerrogativas.

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