300 picaretas
“Luís Inácio falou, Luís Inácio avisou / São trezentos picaretas com anel de doutor"
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“Luís Inácio falou, Luís Inácio avisou / São trezentos picaretas com anel de doutor / Luís Inácio falou, Luís Inácio avisou / Luís Inácio falou, Luís Inácio avisou / São trezentos picaretas com anel de doutor / Luís Inácio falou, Luís Inácio avisou / Eles ficaram ofendidos com a afirmação / Que reflete na verdade o sentimento da nação / É lobby, é conchavo, é propina e jeton / Variações do mesmo tema sem sair do tom”.
Esse trecho da letra da canção “Luis Inácio (300 picaretas)” de autoria de Herbert Vianna do Paralamas do Sucesso e composta no ano de 1995, se fosse relançada nos dias de hoje, depois da aprovação pela Câmara dos Deputados em 30/05/2023 do projeto de lei do marco temporal para a demarcação de terras indígenas, estaria bem atualizada.
Esse golpe nos direitos indígenas e no povo brasileiro, limitando a demarcação dos povos originários, visando interesses excusos, abre a porteira para a passagem da boiada em vários setores da nossa frágil sociedade uma vez que a demarcação dos territórios indígenas somente pode ser reconhecida até a data da promulgação da Constituição Federal em 05/10/1988.
“Para os índios Guarani, a terra sem males não é um sonho distante, mas uma realidade conquistada a cada amanhecer. A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) realiza todo ano, no período da quaresma, a Campanha da Fraternidade. O lema da campanha em 2002 - Por uma terra sem males -, em comemoração à Semana dos Povos Indígenas, foi e continuará sendo um convite para refletirmos sobre o amor desses povos para com a terra. [...]” [1]
Precisamos ficar a atentos para que essa “terra sem males”, com essas aprovações na Câmara dos Deputados, não se torne um sonho cada vez mais distante e destruindo um dos nossos bens mais preciosos que é a água, superficial e subterrânea, existente no território brasileiro porque, como vemos, tem gente nessa casa legislativa interessada em deixar passar a boiada nas águas.
Vale ressaltar “[...] que toda água a ser retirada, superficial ou subterrânea, com exceção de volumes pequenos, necessita de uma Outorga de Direito de Uso de Recursos Hídricos, concedida pelo Poder Público, mediante o atendimento de condições que assegurem o interesse da população no uso das águas. Além disso, ressalta-se que o seu uso não deve causar impacto de qualquer natureza como, por exemplo, a contaminação dos solos e das águas por elementos, compostos ou organismos que possam prejudicar a saúde do homem ou de animais. O impacto pela contaminação, tanto no meio urbano ou rural, dever ser uma das grandes preocupações do Poder Público e dos usuários públicos ou privados.
A água é um direito da população e o governo tem que garantir que nenhum cidadão fique à margem desse bem público. Ela deve ser fraternalmente compartilhada e não utilizada como mercadoria. Qualquer Projeto de Lei que ameace os interesses da população no uso das águas, incluindo as águas subterrâneas do Aquífero Guarani, merece uma atenção e um acompanhamento especial da sociedade civil organizada, para que seja barrada no Congresso Nacional uma possível iniciativa nesse sentido.” [2]
“Nunca é demais lembrar que a remediação dos solos e das águas é complexa e pode custar caro, como por exemplo, as extensas áreas contaminadas por mercúrio pela atividade predatória, ilegal e criminosa, como vem ocorrendo na Amazônia e invadindo território Yanomani. Então, como devemos proceder diante dessa agressão ao meio ambiente? Espera-se que esses invasores da Amazônia que há tempos vêm desmatando, queimando, grilando, garimpando e contaminando seus solos e águas sejam devidamente identificados, responsabilizados e punidos de acordo com a lei.” [3]
E o estrago já foi feito. “Um estudo inédito identificou que peixes consumidos pela população em seis estados da Amazônia brasileira têm contaminação por mercúrio com concentração do metal 21,3% acima do permitido”, como noticiou o portal G1 em 30/05/2023. No estudo foram incluídos dados dos estados do Acre, Amapá, Amazonas, Pará, Rondônia e Roraima. [4]
No encerramento de uma recente entrevista para a revista Mais 60 do Sesc, Ailton Krenak, lider indígena, ambientalista, escritor e jornalista, citou um pequeno poema, com a seguinte consideração:
“Cantando, dançando, passando sobre o fogo / Seguimos nos rastros dos nossos ancestrais / No contínuo da tradição
Cantando, dançando, passando sobre o fogo, quer dizer, passar sobre o fogo é a experiência radical de estar vivo. É quando a gente é testado. Quando tem os embates da vida. Quando nós somos desafiados a ser, a cada tempo, aquilo que o tempo em que estamos vivendo nos exige.” [5]
Estamos sendo testados por essa aprovação e com outras, possivelmente, engatilhadas na Câmara do Deputados. Até quando vamos aguentar?
“Revolto-me, logo existo.” (Albert Camus)
Fontes
[1] O Guarani das águas e dos índios
https://cienciahoje.org.br/wp-content/uploads/2003/02/190.pdf
[2] A boiada nas águas
https://www.ihu.unisinos.br/categorias/615767-a-boiada-nas-aguas
[3] Mercúrio que mata
https://aterraeredonda.com.br/mercurio-que-mata/
[4] Peixes consumidos pela população em 6 estados da Amazônia têm contaminação por mercúrio, indica estudo
https://g1.globo.com/rr/roraima/noticia/2023/05/30/peixes-consumidos-pela-populacao-em-6-estados-da-amazonia-tem-contaminacao-por-mercurio-indica-estudo.ghtml
[5] Entrevista com Ailton Krenak
https://www.sescsp.org.br/ed-84-entrevista-com-ailton-krenak/
*Heraldo Campos é geólogo (Instituto de Geociências e Ciências Exatas da UNESP, 1976), mestre em Geologia Geral e de Aplicação e doutor em Ciências (Instituto de Geociências da USP, 1987 e 1993) e pós-doutor em hidrogeologia (Universidad Politécnica de Cataluña e Escola de Engenharia de São Carlos da USP, 2000 e 2010)
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