Onda Verde na Colômbia: feministas avaliam que ainda há caminho a percorrer para garantir o direito ao aborto
Partidos de direita e grupos conservadores iniciaram uma campanha de desinformação
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Brasil de Fato - A Colômbia tornou-se o quinto país da América Latina a legalizar o aborto. Com cinco votos favoráveis e quatro contrários, a Corte Constitucional do país determinou que a interrupção da gravidez é permitida até a 24ª semana de gestação.
Apesar da vitória, movimentos feministas avaliam que ainda há um caminho a percorrer para garantir que a interrupção voluntária da gravidez seja um direito garantido às mulheres.
"A Corte pediu ao Congresso e ao governo e às autoridades sanitárias criar uma política integral para as mulheres, que deve ter, entre outras coisas, métodos anticonceptivos, educação sexual e o acesso aos serviços de aborto", afirma Ana Cristina González, médica e fundadora da Mesa para Vida e Saúde da Mulher, uma das 90 organizações que compõem o movimento Causa Justa, que interpôs o pedido de legalização do aborto.
Desde 2006, já havia sido assegurado o direito a abortar sem limite de idade de gestação nos casos de estupro, riscos para a vida da gestante ou má formação fetal, portanto o sistema público de saúde colombiano já conta com estruturas de atenção à mulher. No entanto, falta formação aos profissionais de saúde e orientação às mulheres.
"A política pública deve prever educação sexual, acesso a métodos anticonceptivos. Outro pilar é o próprio atendimento para o aborto. Tem que ser um serviço de qualidade, tem que favorecer um trato digno às mulheres e criar conselhos. A mulher deve sair desse espaço com informação sobre como prevenir", defende a médica colombiana.
De acordo com o Ministério Público da Colômbia, cerca de 29% das mulheres penalizadas por realizar aborto já haviam relatado casos de violência sexual.
"Também é fundamental o acompanhamento jurídico. Além da assessoria ou orientação que alguém possa dar a uma mulher, é importante que ela seja acompanhada por um profissional, que faça cumprir todas as normativas que existem", complementa Yinni Valencia Tuesa.
Para Ana Cristina González, uma das autoras da demanda judicial analisada pela Corte Constitucional, a sentença favorável só foi possível porque o movimento Causa Justa apresentou dados contundentes sobre o aborto clandestino no país.
Desde 2008, foram registrados anualmente cerca de 400 abortos clandestinos na Colômbia, sendo que 24% dos casos que terminaram em sentenças punitivas foram contra adolescentes de 14 a 17 anos, segundo levantamento do movimento Causa Justa.
O Código Penal colombiano previa pena de até 4,5 anos de detenção para quem realizar aborto clandestino. As regiões com mais condenações são Caldas, Boyacá, Santander, Norte de Santander, Tolima e Bogotá.
Além disso, 56% dos processos judiciais sobre aborto iniciaram com denúncias feitas por profissionais da saúde, violando códigos éticos que preveem o sigilo profissional.
"Antes já havíamos tentado mais de 36 iniciativas no Congresso e não havia sido possível. Não houve um debate de fundo. Agora devemos esperar se com o novo Congresso se estabelece esse debate e, ainda mais depois de junho e julho, quando acontecem as eleições presidenciais veremos qual postura terá o novo governante que ocupe o cargo", comenta a advogada feminista Yinni Valencia Tuesa.
No dia 13 de março, a Colômbia irá realizar eleições legislativas e no dia 29 de maio, acontece o 1º turno das presidenciais e, caso haja indefinição, o 2º turno será no dia 19 de junho.
O atual presidente Iván Duque, do partido conservador Centro Demorático, criticou a sentença judicial.
"Sempre fui uma pessoa 'pró-vida', acredito que a vida começa na concepção e respeitei as três condições. Mas esta decisão não altera somente este princípio, mas me parece delicado que estejamos facilitando que o aborto se converta numa prática quase anticonceptiva, recorrente e regular", declarou Duque.
Partidos de direita e grupos conservadores iniciaram uma campanha de desinformação sobre o prazo de 24 semanas por ser superior ao de outros países latino-americanos e supostamente ser superior ao tempo de formação do sistema nervoso do feto - um debate sem consenso científico.
"Nós defendemos um debate aberto, público, democrático, sobre o aborto nos nossos termos. Nós queremos que as pessoas compreendam que considerar o aborto um delito é injusto, ineficaz, contraproducente, e eu diria que hoje ele é quase obsoleto", defende González.
Em países como Holanda, Reino Unido e no estado da Flórida, nos Estados Unidos, a interrupção também é permitida até a 24ª semana. Já em países como Canadá e Coreia do Sul não há prazo definido.
De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), cerca de 19 milhões de abortos clandestinos são realizados anualmente e esta seria a causa de 13% das mortes femininas.
"E a pergunta é essa: por que o crime? Porque a gente não regula fora do âmbito criminal. Você pode regular, colocar limites, mas não precisa do crime como uma ameaça às mulheres", questiona a médica Ana Cristina González.
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