O agro é pop? É sustentável?

O “Agro” precisa mudar radicalmente para ser considerado sustentável. Pop, dificilmente será. No máximo, uma atividade importante da economia brasileira

(Foto: Reuters/Enrique Marcarian)


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Diariamente recebemos mensagens e propagandas enaltecendo a atividade agropecuária brasileira, especialmente a que é mais conhecida como “Agronegócio”, ou simplesmente “Agro”, que é focado em algumas commodities, que são muito relevantes na balança comercial brasileira, com destaque para soja, mas também, carne bovina, milho, cana-de-açúcar, café e algodão. É diferente da Agricultura Familiar, voltada basicamente para o mercado interno, e responsável pela produção de mais de 70% dos alimentos que vai à mesa dos brasileiros. 

É incrível como o Brasil ainda pratica comércio exterior de matérias primas nos moldes dos tempos de Brasil-Colônia. Exportamos grãos e carne sem nenhuma ou pouca agregação de valor, deixando para que isso seja feito nos países importadores, gerando empregos lá, que poderiam estar aqui. Além disso, o que é mais grave, é que a produção destas commodities está intimamente ligada à destruição dos biomas brasileiros e à intensa emissão de gases de efeito estufa. 

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O “Agro”, do ponto de vista tecnológico, desenvolveu-se de forma extraordinária. É digno de nota os avanços em termos de maquinário, informatização, logística, transgenia, etc. Mas, ao mesmo tempo que essa parte do “Agro” brasileiro pode ser comparada a de qualquer país “desenvolvido”, outras faces do “Agro” não são dignas de elogio. 

A começar pela geração de emprego. Segundo o IBGE, o “Agro” gera menos do que 30% dos empregos no meio rural. A Agricultura Familiar incentiva a economia solidária e gera mais de 70% dos empregos no campo e este número sobe para 90% em municípios de pequeno porte. 

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Além disso, de acordo com o Censo Agropecuário 2017, em termos de número de estabelecimentos agrícolas, a maior parte continua sendo da agricultura familiar, com 77% e pouco mais de 20% na mão do “Agro”. Quando se analisa a extensão das propriedades, a situação se inverte, ou seja, a maioria das terras, 77%, está nas mãos do “Agro”, e apenas pouco mais de 20% está na mão dos agricultores familiares. É muita terra na mão de pouca gente. 

Considerando apenas estes dados, conclui-se que o “Agro” não é “Pop” e sim a Agricultura Familiar, que produz muito mais alimento para os brasileiros, gera muito mais empregos e ocupa uma área muito menor em um número muito maior de propriedades. 

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Mas não é só isso. Quando discutimos sobre a sustentabilidade do “Agro”, percebe-se que o problema é muito mais sério do que imaginamos. Considerando apenas os insumos básicos, água, terra e mão-de-obra, verifica-se que o “Agro” brasileiro é beneficiado com valores bem em conta. 

A água ainda é tratada no Brasil como algo infinito e “sem” valor. É comum grandes produtores do “Agro” se apropriarem da “abundância” de água, muitas vezes prejudicando agricultores familiares, comunidades indígenas, quilombolas e populações tradicionais. Precisamos evoluir muito em termos de cobrança e democratização pelo uso da água. São poucas as bacias hidrográficas que possuem comitês efetivamente funcionando. Nas áreas onde estão os grandes monocultivos, os comitês não existem 2 ou são frágeis, dando margem para quem tem mais “força” a se impor sobre os demais, gerando muitos conflitos no meio rural brasileiro. O Projeto MapBiomas chegou a resultados muito preocupantes para o Brasil, em que houve uma perda de 15,7% da superfície de água no conjunto dos biomas em um período de 30 anos (1991-2020). 

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A terra, como já foi dito, em função do baixo preço e da desordem fundiária, inclusive grilagem, o que gera conflitos no campo, proporciona o estabelecimento de grandes latifúndios, levando a uma situação em que o Brasil seja um dos países com a maior concentração de terras na mão de poucas pessoas. 

A mão-de-obra barata e, muitas vezes, sem as garantias de obediência às leis trabalhistas, impulsiona o “Agro” brasileiro tornando-o ainda mais competitivo.

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Temos que destacar, também, o fato de que outros insumos de grande relevância na atividade agropecuária estão sob o controle de grandes empresas multinacionais, mais precisamente, os setores de sementes, agrotóxicos, adubos e maquinários. Estas empresas operam em uma lógica puramente mercadológica global e pouco se importam com os reais interesses do Brasil. Possuem suas sedes em outros países, onde são aplicados os lucros obtidos, melhorando as vidas de seus povos, em detrimento da vida da grande maioria dos brasileiros e dos recursos naturais do nosso País. 

Em termos de recursos naturais, temos que destacar a grande destruição dos biomas brasileiros acarretada pelo “Agro”. Segundo dados do MapBiomas, entre 1985 e 2021, o Brasil perdeu 13,1% de vegetação nativa, entre florestas, savanas e outras formações não florestais. Esse território foi tomado principalmente pela agropecuária, que expandiu a área ocupada pela atividade de 21% para 31% do país, acarretando um aumento impressionante da atividade agropecuária de 228%. 

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Além disso, a grande emissão de gases de efeito estufa e o uso intenso de agrotóxicos, incluindo muitos já banidos nos países ditos “desenvolvidos” e muitas vezes utilizados sem o devido cuidado, está contaminando de forma grave o ambiente dos diferentes biomas, especialmente os recursos hídricos e a saúde humana. 

Estas informações nos levam a deduzir que o “Agro”, de fato, nunca foi “Pop” e, muito menos sustentável. A destruição dos biomas e seus povos originários e tradicionais não têm preço. O “Agro” precisa mudar radicalmente para ser considerado sustentável. Pop, dificilmente será. No máximo, uma atividade importante da economia brasileira. 

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Mas, o que pode ser feito para o “Agro” tornar-se sustentável? Há muitas propostas sérias e factíveis defendidas por diferentes grupos que trabalham com a agropecuária e com o meio ambiente, muitas das quais já adotadas e, inclusive, amparadas na legislação e em políticas públicas. Mas isso é assunto para outros artigos.

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